Pedra do Telégrafo, no Rio: quem vê foto não vê perrengue
Virou um hit carioca ser fotografado como se estivesse na beira de um abismo. E veja só: aquela nem é a Pedra do Telégrafo
O que mais chama atenção ao pesquisar sobre a Pedra do Telégrafo são os sorrisos estampados na cara das pessoas que posam para fotos aparentemente penduradas à beira de um penhasco. Aquela expressão de alegria contrastava com o semblante sério que eu recebia quando perguntava como era a trilha até lá. A resposta era sempre a mesma: “quanto mais cedo, melhor”. Pensando estar seguindo o conselho, saí de Copacabana por volta das 9h da manhã de um sábado.
A trilha da Pedra do Telégrafo fica no extremo oeste do Rio, em Barra de Guaratiba. É possível ir de ônibus, mas os horários são reduzidos, e de onde eu estava, na Zona Sul, somente duas linhas faziam o trajeto: a 867 (que parte do terminal rodoviário Campo Grande) e a 2382 (que parte do terminal Menezes Côrtes). Como havia alugado um carro, esta logística não entrou na programação e o GPS indicava que em 1h15 eu chegaria ao meu destino.
Já estava preparado para a possível fila. Através do livro “Metrópole a Beira-Mar“, Ruy Castro já tinha me ensinado que, desde a inauguração do trenzinho para o Corcovado, em 1884, e do bondinho para o Pão de Açúcar, em 1912, as pessoas sobem a centenas de metros e formam filas quilométricas só para contemplar os cenários estonteantes do Rio de Janeiro. Ainda assim, achei que sobraria tempo para pegar uma praia depois de desvendar o mistério da foto da Pedra do Telégrafo – e não poderia estar mais enganado.
O bairro
Saindo da Zona Sul, são 49 quilômetros rumo à Zona Oeste, passando pela Barra da Tijuca e pelo Recreio dos Bandeirantes. O visual do entorno começa a mudar a partir do momento em que a Avenida das Américas se torna Estrada Roberto Burle Marx. Além de ser mais estreita, apenas com uma pista para quem vem e outra para quem vai, a via é no meio de uma mata fechada e cheia de bananais.
A Barra de Guaratiba faz divisa a Restinga de Marambaia, uma área militar, de acesso restrito, administrada pelas Forças Armadas. É lá que são feitos testes de armamentos e munições e onde inclusive fica a casa de férias do atual presidente.
Outra curiosidade é que o bairro já serviu como refúgio de Roberto Burle Marx, que era avesso à badalação da Zona Sul. A sua antiga residência, o Sítio Burle Marx, foi recentemente adicionado à lista de Patrimônios Mundiais da Unesco pela importante coleção de plantas tropicais e que merece uma visita.
O sítio fica a 12 minutos do centro de Barra de Guaratiba, que foi o meu destino naquele sábado, onde parei meu carro em um estacionamento de R$ 25 a diária, para dali pegar a trilha até a Pedra do Telégrafo.
A trilha
A trilha que leva até a Pedra do Telégrafo fica dentro do Parque Estadual da Pedra Branca. A subida começa perto da Igreja das Dores e segue por dentro das ruas do bairro, com muitas escadas e corrimões. É possível ir de mototáxi (R$ 10) até o início da trilha, o que poupa tempo e fôlego, mas quem opta por ir a pé já começa a se acostumar com as subidas íngremes.
A trilha é classificada como moderada, sem a necessidade de alugar equipamentos ou contratar o serviço de guia. Apesar de ser bem sinalizado, o trajeto não é pavimentado, o que pode aumentar a dificuldade em dias chuvosos. Além de vestir roupas leves e tênis confortáveis, é importante levar uma garrafa d’água e algum lanche.
Ao longo do caminho, moradores vão orientando turistas perdidos. Um deles me deu uma resposta curiosa quando perguntei quanto tempo levaria para chegar até o topo: “50 minutos mais a fila”. Fila? Em breve eu entenderia. Retomei o passo e, após 20 minutos, de subida alcancei a primeira pedra-mirante.
Depois de mais 20 minutos de subida, outro sinal de alerta. “Se preparem para ficar na fila!”, alertou uma das pessoas que fazia o caminho de volta. De fato, quando cheguei ao topo, por volta das 11h30, havia pelo menos 70 pessoas esperando para tirar a tão desejada foto na suposta Pedra do Telégrafo. Sim, na verdade há um equívoco na denominação daquela pedra, ainda que ninguém que estava lá se importasse. A pedra que todo mundo marca no Instagram, que faz parecer que a pessoa está pendurada na beira de um penhasco, não é a do Telégrafo e, sim, a Pedra do Cavalo. Prometo contar essa história alguns parágrafos mais para baixo.
Perguntei como aquela fila estava funcionando e me explicaram que não existia um tempo pré-determinado para fazer a pose, tudo dependia do bom senso do cidadão. Dessa forma, acabava acontecendo o nonsense: cada sessão de fotos se estendia por longos minutos até que os cliques fossem finalmente aprovados pelo visitante da vez.
“Não tem filtro que arrume”, “Não é para fazer book”, exclamavam alguns na tentativa de acelerar o processo. Uma das mulheres que tinha acabado de fazer a foto me contou que tinha saído de casa às 7h da manhã com aquele intuito.
No dia em que estive lá, o tempo estimado de espera era de duas horas e havia até um fotógrafo à disposição de quem quisesse garantir o ângulo perfeito – e que cobrava R$ 15 por três cliques.
Não consegui chegar muito perto da Pedra do Cavalo, mas foi o suficiente para entender que não há risco de acidente na hora de fazer as poses clássicas que vemos no Instagram. A ponta da rocha fica bem acima de uma parte plana do solo e o enquadramento das fotos, somado à elevação do local, cria uma ilusão de ótica. Ou seja, é fácil sorrir, pois ninguém está de fato à beira de nenhum penhasco.
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A praia
Fica a critério de cada um decidir se vale a pena ou não encarar uma trilha de quase uma hora para depois passar o dobro desse tempo na fila da foto. Quem encara a espera acaba tendo um bom tempo de descanso antes de pegar o caminho de volta. Mas, ao meu ver, aquele tempo não compensava, ainda mais com o Sol rachando na cabeça.
Já estava dando as costas quando notei algumas pessoas subindo rumo à Pedra do Urubu, com um visual que compensa todo o cansaço da trilha: à esquerda a Restinga de Marambaia e à direita a Praia de Grumari e o Recreio dos Bandeirantes.
Depois de curtir o visual, desci a tempo de aproveitar a Praia da Barra de Guaratiba. Assim, as duas horas que eu passaria na fila da Pedra do Cavalo foram melhor aproveitadas comendo camarão à beira-mar.
Soube depois que nas costas do Morro de Guaratiba há outras trilhas que dão acesso a praias selvagens como a dos Búzios, do Perigoso, do Meio, do Inferno e Funda. O ponto de partida é na Rua Parlon Siqueira, no sentido oposto à Pedra do Telégrafo. De lá, são cerca de 3,5 quilômetros de caminhada em mata fechada e sem muita sinalização. Por isso, o ideal é ir pedindo informações para os moradores ou contratar um guia. Mais cômodo ainda é acessar as praias em trajetos de barco, que custam a partir de R$ 30.
A história por trás da foto da “Pedra do Telégrafo”
A Pedra do Telégrafo é o ponto mais alto do Morro de Guaratiba, local que foi usado pelos militares para observar a aproximação de navios alemães durante a Segunda Guerra Mundial. No entanto, a rocha onde todos querem tirar foto é na verdade a Pedra do Cavalo, conhecida também como Pedra da Bigorna. A 354 metros de altura, ela começou a ganhar popularidade em 1990, quando o geólogo Victor Klein fotografou uma égua branca em cima dela.
Descobri essa história através do filho de Victor, Rafael, cuja agência Trilhando Guaratiba organiza passeios tanto para a Pedra do Telégrafo quanto para as praias no entorno. Segundo ele, há sempre no mínimo 50 pessoas na fila na Pedra do Cavalo, mas o número pode chegar a muito mais que isso.
“Já vi mais de mil pessoas lá em cima. A fila começava um pouco antes de chegar ao topo e o tempo de espera era de quatro a cinco horas”, relatou. “Por isso, recomendo sempre levar água e um lanche – além de ter bastante paciência, porque hoje ela é um ponto turístico comparável ao Pão de Açúcar e ao Cristo Redentor“.
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