Imagine uma pessoa tomando whisky. É bem provável que tenha se formado na sua mente a figura de um homem mais velho, vestindo um terno e segurando um copo baixo com uma dose de não mais que dois dedos. Se ele for do tipo durão, a bebida está puríssima, sem um único cubo de gelo. Pois bem. O objetivo da Johnnie Walker, marca de whisky mais distribuída em todo o mundo, é acabar por completo com essa persona associada ao destilado.
A empresa celebrou os 200 anos de sua existência com a inauguração, em setembro de 2021, de um verdadeiro templo dedicado ao whisky num prédio histórico de oito andares na Princess Street, a principal rua comercial de Edimburgo. Fruto de um investimento de £ 150 milhões (o maior já feito no turismo do whisky escocês), o espaço batizado de Johnnie Walker Princes Street é ao mesmo tempo uma loja, uma atração, um centro de degustação e um bar. Mas seja qual for a experiência escolhida pelo visitante, está presente de forma muito clara a mensagem de que o whisky é uma bebida para todos os paladares.
Na minha formatura da faculdade, alguém me ofereceu um copo de whisky com água de coco. Tomei e me surpreendi. Bom isso, hein? Mas, depois desse episódio, nunca mais tinha tomado whisky na vida. Antes de entrar no Johnnie Walker Princess Street, escondi esse segredo nas profundezas do meu ser porque imaginei que os escoceses – e pessoas de qualquer outra nacionalidade, na verdade – achariam um sacrilégio misturar whisky com água de coco. E mais ainda achar que isso era gostoso. Para minha surpresa, meia hora depois lá estava eu me sentindo bacanérrima pregando a palavra do whisky com água de coco para cada pessoa que aparecia do meu lado.
Fresh, fruity, smoky, creamy, spicy or tropical?
Para quem, como eu, entende nada ou muito pouco de whisky, a Johnnie Walker preparou uma experiência imersiva que combina passeio guiado e degustação, a Journey of Flavor (£ 28 por pessoa, 90 minutos, reservar com antecedência pelo site). O ponto de partida é escolher que tipo de sabor você mais gosta: fresh (refrescante), fruity (frutado), smoky (defumado), creamy (cremoso), spicy (com especiarias) ou tropical. Eu travei logo nessa primeira pergunta. Felizmente, havia tablets espalhados por uma mesa redonda onde era possível responder um teste, como aqueles da Capricho, que identificava qual era o seu tipo de sabor preferido através de uma série de questões sobre o que você gosta de comer e beber. O meu deu fruity, o que não me surpreendeu muito considerando a empolgação com whisky e água de coco de anos atrás. Na sequência, cada visitante recebeu uma pulseira na cor correspondente ao seu resultado, e a minha, rosa-bebê, me pareceu quase um atestado de paladar infantil.
Mais para frente, descobri que a cor da pulseira determinaria a minha primeira degustação. Fui instruída a pegar um copo que tinha a base rosa-bebê, colocar uns três cubos de gelo e depois posicioná-lo numa máquina que automaticamente reconheceu a cor e despejou água com gás misturada a uma dose de Black Label. Na sequência, “temperei” a bebida com uma fatia de laranja desidratada e estava pronto o drink à base de whisky que os especialistas da casa recomendam para quem tem o paladar fruity como o meu, que, ao contrário do que eu pensei inicialmente, não tem nada de infantil.
Nessa primeira etapa, o whisky vem automaticamente misturado em água com gás, o que eles chamam de highball cocktails. Mas há uma segunda degustação logo antes do fim do passeio em que é possível experimentar todas as seis combinações com a dose de whisky puro, um cubo de gelo e sua respectiva guarnição. Esses são chamados de traditional cocktails. Foi assim que descobri que, apesar de ter paladar fruity, também me agradou bastante o sabor creamy, que leva Johnnie Walker 18 anos e um raminho de trigo – mesmo sem água com gás ou água de coco para amenizar o sabor característico do destilado. As outras combinações são Green Label com pétala de rosa (fresh), Double Black com tomate seco (smoky), Red Label com folha de louro (spicy) e Gold Label com abacaxi cristalizado (tropical). Caso esteja se perguntando, não é possível provar o exclusivo Blue Label.
A teoria por trás dessas harmonizações, as etapas do processo de produção do whisky e a história da marca Johnnie Walker são explicadas ao longo do passeio, em que um guia vai conduzindo os visitantes por salas modernas com telas e projeções. Mas não espere ver barris de carvalho ou um engarrafamento acontecendo diante dos seus olhos, já que a bebida não é destilada no local. Outro alerta importante é que, por enquanto, os tours só são disponibilizados em inglês e, como há muitos momentos de interação, quem não fala a língua perde bastante da experiência. Posso adiantar que o objetivo da Journey of Flavor é mostrar um lado mais versátil do whisky, que pode ser sim misturado com gelo, com água gaseificada e, como eu fiz questão de compartilhar com meus colegas de grupo, água de coco. Dessa última, ninguém nunca tinha ouvido falar.
Whisky? Só se for cowboy!
Existe toda uma explicação científica para o fato da água liberar as diferentes facetas aromáticas do whisky. Mas não sejamos ingênuos. Ao propor que o whisky seja consumido de maneiras menos ortodoxas, a Johnnie Walker visa alcançar um público que vai muito além do homem aristocrático que estampa o seu logo. Basta observar o Instagram da marca para entender que há toda uma estratégia de rebrading acontecendo, com uma porção de imagens mostrando drinks coloridos, baladas cheias de jovens e mulheres empunhando os copos. É como o próprio slogan prega: o importante é keep walking, ou seja, continuar andando e se adaptando às mudanças do mundo.
Mas é claro que toda essa ideia de whisky com água com gás provoca arrepios na espinha dos mais puritanos, digamos assim. Para essas pessoas, que já entendem mais do assunto e sabem apreciar o destilado em sua forma mais pura, o Johnnie Walker Princess Street elaborou outras três experiências. A Whisky Explorers (£ 35 por pessoa, 45 minutos, reservar com antecedência pelo site) é uma degustação de uma curadoria especial de whiskys de diferentes partes da Escócia, cada um com uma maturação mínima de 12 anos. Isso inclui single malts de Islay, Highlands e Speyside, além de um blend raro que só é disponibilizado ali.
Ainda mais específica, a History Adventure (£ 50 por pessoa, 90 minutos, reservar com antecedência pelo site) permite que você vasculhe junto com uma historiadora os arquivos e artefatos mais antigos da Johnnie Walker. Nesse caso, não há degustação, mas você é recebido com um dos highball cocktails que melhor se adequa ao seu paladar. A última e mais exclusiva é a Whisky Maker’s Cellar (£ 95 por pessoa, 90 minutos, reservar com antecedência pelo site): tudo acontece em uma adega subterrânea, onde um dos mestres da Johnnie Walker retira as doses de whisky diretos do barril para a degustação e cria um blend na hora, ao gosto dos participantes.
Slainte mhor ou tim-tim, em escocês
Também é possível experimentar drinks e doses puras nos dois bares que ocupam o último andar do Johnnie Walker Princess Street. O 820 foca nos coquetéis e possui um menu com pratos típicos da gastronomia escocesa, apesar do seu grande diferencial ser mesmo o terraço com vista para o Castelo de Edimburgo. Já o Explorers’ Bothy é simplesmente o bar mais bonito que eu já vi na minha vida, direcionado a servir uma seleção dos melhores whiskys de todo o país, incluindo centenas que não são da Johnnie Walker e alguns que já não são mais produzidos e estão em suas últimas garrafas.
No andar térreo, a loja reitera a ideia de personalização. Além de escolher dentre os 150 tipos de whisky que contemplam o acervo da marca, o visitante pode selecionar o modelo de garrafa em que deseja transportar a bebida. Mais do que isso: é possível gravar o vidro com as suas iniciais ou mandar imprimir um rótulo com o seu nome, por exemplo. Porém, na tentativa de associar o whisky como uma bebida para todos, a Johnnie Walker ainda esbarra num empecilho: os preços. Uma garrafa de Black Label estava saindo por £35 (ou R$ 215). Haja água de coco para fazer a garrafa render!
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