Pelo menos uma dúzia de argentinos está com passagem comprada e data agendada agora em janeiro para receber a vacina contra a covid-19 em Miami, noticiou na sexta-feira (8) o Clarín. Segundo o jornal portenho, a Flórida não exige comprovante de residência ou de nacionalidade para fazer a imunização, apenas que a pessoa comprove ter 65 anos ou mais e não tenha recebido nenhum tipo de vacina nas duas semanas anteriores. Cidadãos argentinos, ou quem permaneceu em solo kirchnerista nos 14 dias que antecederam a viagem, só precisam do visto para entrar nos Estados Unidos [NOTA: desde o dia 26 de janeiro os Estados Unidos passaram a exigir teste negativo de covid de todos que entram no país; saiba mais]. Quem está de malas prontas precisa ficar por lá pelo menos 21 dias e assim tomar as duas doses recomendadas.
Os Estados Unidos começaram a vacinar em dezembro os profissionais de saúde da linha de frente, grupos de risco e idosos. A Flórida é um reduto de aposentados e 20% da sua população têm mais de 65 anos, o que representa 4 milhões de pessoas.
A vacina é oferecida apenas pelo governo e não está disponível em clínicas particulares. Diariamente, são disponibilizadas 500 vagas online e também por telefone, mas conseguir um agendamento é tarefa árdua. A reportagem do Clarín traz o relato da advogada argentina Ana Rosenfeld, que chegou a Miami no dia 10 de dezembro para visitar o neto, nascido lá em março do ano passado. “Foi um presente que minha filha me deu”, diz ela, referindo-se à vacina aplicada no dia 2 de janeiro. “Ela precisou de muita paciência, não foi de uma hora para outra, perseverou e insistiu até conseguir uma vaga”, disse a advogada, que viajou cerca de 500 quilômetros de Miami até uma cidade perto de Tampa, a única com horário disponível.
Turismo de imunização
O governador da Flórida, Ron DeSantis, demonstra preocupação com o turismo de imunização. “Desencorajamos as pessoas de virem apenas para se vacinar”, disse em entrevista coletiva na terça-feira (5). O jornal Nuevo Herald, da Flórida, apurou que vários hospitais e clínicas não requerem comprovação de nacionalidade ou residência, como as grandes redes Jack Health System e Baptist Health South Florida.
O CEO da Jackson Health, Carlos Migoya, defende que a questão agora é prevenir a propagação da covid e que, portanto, “ser um cidadão deste ou de outro país não é exatamente relevante quando se trata de parar a doença”. A Secretaria de Estado da Saúde da Flórida tem um posicionamento semelhante. Yesenia Villalta, chefe do escritório da região de Miami, disse que o estado não negará vacina a ninguém que apresente um passaporte e permaneça no país por tempo suficiente para receber as duas doses.
O diretor da Escola de Saúde Pública da Florida International University, Carlos Espinal, acha que estrangeiros não devem receber o imunizante nos Estados Unidos, pelo menos por enquanto. “Essa é uma questão perigosa porque, em vista do atraso nos programas na América Latina, as pessoas podem começar a se mudar para cá”, disse ele ao Nuevo Herald. “Isso pode impactar na disponibilidade de doses para quem é do grupo de risco na Flórida, principalmente nesta fase”. Moradores do estado com comorbidades já estão tendo dificuldade para conseguir agendar um horário.
A situação mencionada por Espinal é justamente a do Brasil, onde, por brigas políticas internas, até o momento não foi possível apresentar para a sociedade um programa nacional de vacinação, o que pode estimular uma onda de viagens. Basta que os países comecem a afrouxar suas restrições de entrada. E tudo indica que é só uma questão de tempo para as vacinas estarem disponíveis na rede privada, tanto aqui quanto lá fora. Seria uma corrida injusta, insana e, como é o caso crônico do Brasil, apenas para quem pode.