Côte D’Azur: dicas para viajar entre Cannes, Nice e Mônaco
As 3 cidades da França estão em um dos mais belos trajetos litorâneos da Europa
Cinco quarteirões separam a estação ferroviária de Cannes do tapete vermelho em que as estrelas fincam o salto no célebre festival de cinema. Em Nice, o intervalo entre sair da Gare e mergulhar no Mediterrâneo cai para três minutos se o sujeito contar com a ajuda do bonde elétrico. E, sob o asfalto que acolhe o GP de Mônaco, túneis subterrâneos ligam os trens a tudo o que interessa nos domínios de Stéphanie, Caroline e Carlota.
Filé mignon do litoral francês, o trecho de 180 quilômetros entre Toulon e a fronteira com a Itália – faça biquinho e diga “côte dazir” – é um do trajetos à beira-mar mais perfeitos para viajar sobre trilhos na Europa.
Mais rápidos do que os megaiates que circulam pela região, os vagões do trem regional (TER) conectam as principais cidades da Riviera Francesa em viagens frequentes e baratinhas. Além de ver a paisagem pela janela, você pode ainda tomar uma champa no almoço sem precisar dirigir um conversível até o hotel.
Entre os vinhedos da Provence e os Alpes Marítimos, a Côte d’Azur é a mais completa tradução do savoir-vivre mediterrâneo. Picasso, o gênio cubista, passou seus últimos anos na região, que também foi fonte de inspiração para pintores como Matisse e Marc Chagall, além de lar de figurinhas do quilate de Brigitte Bardot, Charles Chaplin e Jean Cocteau.
O glamour ainda vive (e madame Bardot também, escondida nos arredores de Saint-Tropez). Que o digam os iates colossais que repousam a cada porto e as mansões que levam nomes como Elton John e Bono Vox na escritura.
Por outro lado, as cidades cresceram e se modernizaram. Nice, por exemplo, é a quinta maior urbe francesa, com 350 mil habitantes, número que sobe para quase 1 milhão na zona metropolitana. Muitos deles são imigrantes africanos e asiáticos, que vão imprimindo ares cosmopolitas à Riviera. Por isso, entre turistas de nariz vermelho, você verá muita gente indo e vindo do trabalho e outras cenas da vida cotidiana acontecendo nos trens e estações.
Fonte na Place Rossetti: Nice tem jeito de cidade grande, mas ainda preserva seus cafés e fontes
Os trens regionais TER fazem as vezes de um metrozão intermunicipal, circulando entre 5h30 e 23 horas, sem lugar marcado. Ir de Cannes a Mônaco – trecho de 60 quilômetros que concentra o melhor da Côte d’Azur – custa € 9,40 e leva 1h10. De Cannes a Nice, o bilhete sai por € 6,80 e a viagem é um pulinho de meia hora.
Dificilmente você terá de esperar mais de 30 minutos entre um trem e outro, ainda que pequenos atrasos sejam corriqueiros. O esquema é tão prático para quem roda pela região que milhões de turistas aproveitam a mamata. C’est la vie.
No auge da primavera, precisei usar os cotovelos em certos momentos e viajei alguns trechos em pé (no verão a coisa certamente piora). Le muvuquê faz com que arrastar a mala pelos vagões não seja das tarefas mais agradáveis. O mais sensato, diante dos fatos, é escolher uma cidade para fincar pé, chegar lá no conforto de uma poltrona do TGV (no qual as reservas são obrigatórias, há lugar marcado e espaço para acomodar a bagagem) e aproveitar que as distâncias são curtas para fazer empreitadas de bate e volta.
Com localização estratégica, Nice é a mais lógica das bases de lançamento. Além disso, ela merece bem mais do que um dia da sua atenção. A vocação artística da cidade vem de longa data. O pintor Henri Matisse foi um de seus mais ilustres moradores, e o museu em sua homenagem, num bairro afastado do Centro, é um hit incontornável. O menu cultural inclui ainda um belo museu de arte moderna contemporânea (o Mamac, que tem obras de Francis Bacon e Keith Haring, por exemplo) e outro dedicado às belas-artes.
Beirando a praia de pedrinhas, que tem um bom trecho aberto ao público e até um pouquinho de areia em sua parte norte, o Promenade des Anglais é a maior demonstração da pompa local, num desfile de casarões impressionantes e hotéis com diárias que chegam a quatro dígitos. A avenida culmina na colina coroada pelo Château de Nice, do século 11, de onde se tem uma vista matadora para a praia e a marina.
A praia do Promenade des Anglais tem pouca areia e muita riqueza
Como golpe de misericórdia, a Place Messena é uma das mais originais do país, com piso quadriculado e esculturas do artista catalão Jaume Plensa posicionadas sobre pedestais altíssimos. A praça é o ponto de partida para explorar o lindo centrinho e caminhar pelo parque que cobre o leito do rio Paillon, passando pelo grande Teatro Nacional e pelo Museu de História Natural.
Sem gastar a sola do sapato, dá pra fazer tudo isso pedalando uma Vélo Bleu, parte do sistema público de bicicletas azuis, que custa € 1 por dia e pode ser desembaraçado em cada uma das estações com um cartão de crédito internacional.
Ao lado de Nice, Cannes tem seu Centro Antigo bonitinho, o Suquet, em torno de um castelo medieval. A praia (de areia!) tem alguns dos beach clubs mais pop da Riviera. Mas é a cada mês de maio que a cidade ferve, com o festival de cinema que encarna a vingança europeia ao Oscar.
Outros eventos, como o Lions de publicidade (em junho), também congestionam o chiquérrimo Boulevard de la Croissete, um grande shopping center de luxo a céu aberto. No resto do tempo Cannes é um tranquilo balneário à beira do Mediterrâneo, onde famílias se lambuzam de sorvete nos quiosques da praia e turistas arrastam sacolas pra lá e pra cá.
Quem tem pouco tempo pode até empacotar a visita a Cannes com uma passadinha em Antibes. Foi diante daquele marzão que Picasso extravasou A Alegria de Viver, famosa tela em que predominam o azul e o amarelo solar. A principal atração da cidade é o antigo ateliê do pintor, convertido no Picasso Museum, além de reminiscências da vila de pescadores evidentes nos barcos ancorados na orla.
Cannes, quando não tem Festival de Cinema, é quase pacata como um barco ancorado
Ir até Mônaco a partir de Nice leva só 20 minutinhos de trem. Mas é essencial fazer pelo menos uma das pernas do trajeto de busão (linhas 82 ou 112). Baratésimo, o sistema Lignes d’Azur é uma mão na roda para chegar a quase todos os lugarzinhos da Riviera que os trilhos não alcançam.
Nem o ar-condicionado capenga nem a lotação tiraram o brilho de uma das viagens de ônibus mais cinematográficas da minha vida, entre Nice e Èze, passando sobre a mítica cidadezinha de Saint-Jean-Cap-Ferrat (acessível pela linha 81).
Encarapitado numa colina, Èze é um vilarejo medieval de menos de 3 mil habitantes, com ruelas tomadas por galerias de arte, lojinhas e cafés, que rodeiam as ruínas de um castelo e uma igreja. Uma das sedes das fábricas de perfumes Galimard e Fragonard, o povoado é um dos pontos mais altos da região.
Com fôlego, vale descer até a estação de trem Èze-sur-Mer pela trilha de uma hora com o nome de Nietzsche, o filósofo alemão, que viveu ali no século 19. Saint-Paul-de-Vence, a 18 quilômetros de Nice, é outro presente que o sistema de ônibus (linha 400 a partir de Nice) entrega de bandeja. A vila foi o QG do pintor Chagall (enterrado lá) e tem um ótimo museu, o Fondation Maeght.
Èze: um lugar perfeito para filosofar
Uma ladeira de 8 quilômetros separa Èze da extravagância do segundo menor país do mundo depois do Vaticano. Mônaco é uma cascata de edifícios de luxo que escorrem para uma orla do Mediterrâneo lotada de iates gigantes.
Visitei o principado em meio aos preparativos para o GP de Fórmula 1, no mês de maio. O pepino de driblar avenidas e calçadas interditadas teve seu lado interessante. Caminhando em ziguezague entre arquibancadas, boxes e pilhas de pneus, percorri a pé o circuito mais mítico do planeta.
Depois, tomei fôlego e subi o cocuruto rochoso em que ficam o palácio do príncipe Albert II e a parte antiga de Mônaco, de onde se tem a melhor vista. Tão intergaláctica quanto a pompa do principado é a decoração do Cassino de Monte Carlo. Do lado de fora, o circo continua. Sente-se no Café de Paris e observe o vai e vem de carrões, madames, playboys, turistas e curiosos – a desfilar pelo picadeiro.
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