Mochila Pride

A jornalista Ludmilla Balduino leva na mochila uma vontade de percorrer o mundo ocupando as ruas, conhecendo o diferente, conversando com as pessoas e trocando boas ideias
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Nordeste surreal — a história do cabra da peste e sua espingarda no busão

No post anterior, escrevi sobre como se virar usando transporte público pelo Nordeste do Brasil. E prometi que falaria sobre um episódio que ocorreu durante a viagem de Canoa Quebrada para Natal. Aquele dia foi tão doido que ele merece um post inteiro. Prepare-se para ler sobre a história do cabra da peste que entrou no ônibus portando […]

Por Ludmilla Balduino
Atualizado em 27 fev 2017, 15h35 - Publicado em 28 jul 2014, 20h07

No post anterior, escrevi sobre como se virar usando transporte público pelo Nordeste do Brasil. E prometi que falaria sobre um episódio que ocorreu durante a viagem de Canoa Quebrada para Natal. Aquele dia foi tão doido que ele merece um post inteiro. Prepare-se para ler sobre a história do cabra da peste que entrou no ônibus portando uma espingarda prateada!

Pirocópteros gigantes de energia eólica na beira da estrada sinalizam: você está saindo de Canoa Quebrada (foto: Ludmilla Balduino)

A primeira parte da viagem foi assim: tirando fotos bonitinhas para postar no Instagram (foto: Ludmilla Balduino)

Lá estava eu dentro do ônibus, sã e salva, depois de esperar em uma rodoviária mal-acabada, suja e cheia de bêbados em Aracati (onde fica Canoa Quebrada, no Ceará).

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Após algumas horas de viagem, o motorista fez uma parada no meio do caminho, em Mossoró (a terra do sal e do petróleo) para buscar mais passageiros. E foi aí que entrou um cabra usando um coldre de espingarda nas costas. Dava para ver o cabo da espingarda para fora do estojo, todo prateado.

Ônibus interestaduais costumam ser silenciosos. As pessoas geralmente não se conhecem, e é raro começar uma conversa com a pessoa desconhecida que vai ficar sentada ao seu lado por umas boas horas. Na hora que o cabra armado entrou, o silêncio, que já era comum, ficou ainda mais profundo. Era aquele típico silêncio de apreensão coletiva. O mesmo silêncio que ocorre, por exemplo, quando o avião arremete segundos antes de pousar na pista no aeroporto (isso já aconteceu comigo, também).

É claro que ninguém questionou. Talvez por medo de ele sacar a arma, cada um ficou no seu quadrado, ou melhor, na sua poltrona. Nenhum pio.

O ônibus deixou a rodoviária de Mossoró e, depois de uns 10 minutos, parou de novo em um posto de gasolina, no meio de uma estrada empoeirada. O motorista avisou que teria de esperar uma passageira. Meia hora de espera, aparece um carro da Polícia Rodoviária Federal. O motorista também tinha visto a espingarda do cabra e chamou a polícia!

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Arre égua! E era uma espingarda mesmo! Detalhe: toda prateada (foto: Ludmilla Balduino)

Eu estava na janela e consegui ver toda a cena: após vários minutos de muita conversa, o cabra revela que é um artista de rua! A espingarda estava toda avariada – era, na verdade, um dos acessórios da fantasia de Lampião Prateado que ele usava para ganhar uns trocados nas praças nordestinas. O rapaz até mostrou umas fotos dele vestido a caráter para os policiais acreditarem. Tinha até recorte de jornal – o Lampião Prateado já foi manchete!

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E o cabra tenta se explicar: mostra documentos, mostra fotos…

Assunto esclarecido, os policiais cumprimentaram o artista de rua pelo seu trabalho e foram embora. Não sem antes apreender a arma fake. Enquanto isso, vários passageiros saíram do ônibus para beber uma cervejinha no posto e assistir à cena. Todo mundo, silenciosamente, respirou aliviado quando o moço subiu novamente no veículo e gritou pro motorista: “toca pra Natal que a gente tá atrasado!”

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Só ficou o coldre. (foto: Ludmilla Balduino)

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