Sonho de consumo: um almoço no Burruntzi, um autêntico “asador” no País Basco
A Paulets, uma das amigas que mais amo no mundo, se casou com o Javi, um homenzarrão inimitável com o coração do tamanho do mundo que mora em San Sebastián. Dessa história linda veio o pequeno Fran, meu afilhadinho amado. E assim criei um vínculo sólido e eterno com o País Basco, meu lugar preferido na Espanha depois de Barcelona, para onde escapo sempre que tenho uma brecha. Javi nasceu em Tolosa, uma simpaticíssima cidadezinha nas profundezas da província de Guipúzcoa, a 30 quilômetros de San Sebastián. Se não fosse por essa grande sacada do destino, eu provavelmente teria abotoado o paletó sem conhecer o Burruntzi.
Por fora, o lugar parece uma oficina mecânica. Por dentro, apesar do jeitão rústico e do perfil meio “caverninha” (não há janelas), o restaurante é puro aconchego. Juanjo (amigo de infância de Javi), o maestro asador, é um sujeito de poucas palavras que aprendeu o ofício de seu pai, também Juanjo, que fundou o restaurante em 1981. Os sorrisos que lhe faltam sobram a Rosa, sua mulher, que se encarrega do atendimento. Juani, viúva do velho Juanjo, está sempre por ali. Mais família impossível.
O banquete começou com anchovas impecáveis do Mar Cantábrico, afogadas em azeite de oliva. Também pedimos porções generosas de jamón e lomo (lombinho canadense, como se diz inexplicavelmente no Brasil) – a Ferrari do lomo! Em seguida, uma das estrelas da casa aterrissou em nossa mesa: cogote de merluza do mar do norte (é um tipo de pescada, só que é dez mil vezes melhor do que a que temos no Brasil). Cogote é a parte superior do peixe, aquela que envolve as entranhas, com um sabor mais poderoso do que o rabo. Assado na brasa, o peixe vem à mesa com um caldinho indescritível, além de suculentas almejas (vôngole).
Se parássemos por aí, já poderia estourar rojões e considerar a refeição como um acontecimento histórico. Mas a segunda etapa foi algo ainda mais épico. A chuleta (conhecida no resto da Espanha como chuletón, um aumentativo bem apropriado) ao estilo basco é maturada até os limites da resistência da carne, entre três semanas e 45 dias! Em seguida, entra a maestria de Juanjo, que extrai o melhor do produto, criando uma crostinha externa, que sela o interior vermelhíssimo e suculento – praticamente um tataki de chuleta. O acompanhamento é simples e matador. A melhor alface que já comi na vida (sério, o suprassumo da alface) e pimientos del piquillo com o molho cuja receita Juanjo levará para o túmulo – entra lá no meu Instagram @drisetti para vê-los fervendo no prato, que maravilha.
Sim, consegui chegar à sobremesa, com louvor. E entrei de cabeça no xaxu, uma iguaria basca feita de amêndoas que fez o meu globo ocular dar três voltas dentro da cavidade. Dois Riojas tintos da PESADA para acompanhar tudo isso e, por incrível que pareça, não saí de lá me arrastando pelo chão (estou tentando entender o fenômeno até agora). Ainda sobrou disposição para passear pela belezinha que é Tolosa, recheada de predinhos coloridos e praças cheias de vida. A julgar pelas incontáveis sedes de confrarias gastronômicas instaladas no centro da cidade, a clientela local de Juanjo é pra lá de exigente.
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