Assim como muitos artista geniais, Frida Kahlo não teve o reconhecimento que mereceu em vida. Apesar de badalada em alguns círculos intelectuais, a mulher de sobrancelhas marcantes que hoje encarna um dos bastiões da cultura mexicana só saiu da sombra do marido, o muralista Diego Rivera, anos após a sua morte, em 1954. Mesmo assim, foi só depois do lançamento do filme Frida, em 2002, que a pintora transformou-se em febre internacional. Em 2007, uma retrospectiva de sua obra no Palacio de Bellas Artes recebeu 440 mil visitantes. Hoje, o ícone mais pop da arte mexicana estampa 8 de cada 10 suvenires vendidos no país.
Caí de amores por Frida quando visitei uma completíssima exposição no Palazzo della Permanente, em Milão, em 2003. Devorei algumas de suas biografias (a mais completa delas Frida – Una biografia de Frida Kahlo, de Hayden Herrera). Por isso, conhecer La casa azul de la Calle Londres (título do primeiro capítulo do livro, aliás) — onde a pintora nasceu, passou grande parte de sua vida e morreu – era o programa que esperava com mais ansiedade.
Aos domingos, quando todos os museus do país são grátis para mexicanos, entrar no Museu Frida Kahlo é um inferno. Fui, vi a fila na porta e dei meia volta. Então voltei na quarta-feira à tarde para degustá-lo com calma. Grande parte de seus quadros mais importantes não estão lá. Mas quando à sua alma, não há dúvidas. Ela está nos detalhes da (lindíssima) cozinha, no quarto, em algumas roupas, nos pinceis… Frases suas estampam as paredes. A máscara mortuária repousa sobre a pequena cama onde ela passava grande parte do tempo nos longos períodos em que padecia de dores insuportáveis na coluna. O sofrimento de Frida e seu amor incondicional à vida e por Diego estão ali.
Saindo da casa azul, o passeio pelo bairro de Coyoacán é uma delícia (o museu León Trotsky, na casa onde o russo refugiou-se de Stalin nos anos 1930, também fica no bairro). Na época de Frida Kahlo, o lugar era uma cidadezinha a 10 quilômetros do centro da Cidade do México que, aos poucos, foi engolida pela metrópole. As ruas arborizadas e predominantemente residenciais ainda mantêm esse certo ar de lugar distante. A três quarteirões do museu está o Mercado, ótimo para almoçar, tanto nas banquinhas de dentro como nos restaurantes do lado de fora – veja, na foto, a quesadilla incrementada com flor de abobrinha que eu tracei por lá. Garimpando, também dá para descolar alguns suvenires bacaninhas.
Três quarteirões mais e chega-se à Plaza Hidalgo, onde está a paróquia de San Juan Batista. A praça também conhecida como “zocalito”, arborizada e cercada de cafés e lojinhas.
Dez minutinhos mais de caminhada e você dará com os Viveros de Coyoacán, um enorme parque onde os chilangos correm, andam e descansam da loucura da cidade. O guia que tinha em mãos fazia a misteriosa recomendação: “é preciso ter cuidado com os esquilos”. Sim, meus caros, procede. Os esquilos do parque andam em verdadeiras gangues e não se acanham em avançar sobre sacos plásticos onde suspeitam que haja comida. Num momento de pânico, meus saquinhos com os suvenires de Frida foram arremessados ao chão e tive que sair vergonhosamente correndo.
@drisetti