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As excentricidades de Los Angeles dentro e fora do eixo turístico

Espalhada e esquizofrênica ou multifacetada e vibrante? A maior cidade da Califórnia é exatamente isso: o que você quiser que ela seja

Por Fernando Souza
Atualizado em 23 jul 2021, 14h58 - Publicado em 14 jul 2021, 13h37
Dowtown de Los Angeles
Berço da indústria cinematográfica, Los Angeles é a terra prometida de ecléticas revoadas de sonhadores e aventureiros, que aterrissam na metrópole para tentar a sorte Crédito: (choness/Getty Images)
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Los Angeles se apresenta primeiro em grandes cebolões rodoviários, na confluência das nervosas freeways, depois nas placas para bairros famosos, como Hollywood, e, por fim, em suas palmeiras longilíneas, inconfundíveis. De perto a leitura é mais difícil. Hospedado no descolado Hotel Ace, montado com estética neo-hipster no antigo prédio da United Artists, na Broadway de LA, eu podia ver a dicotomia em cada quarteirão de Downtown. Num deles, você cruza com sujeitos mal-encarados e sem-tetos como se estivesse no videogame suburbano GTA. Em outro, janta num restaurante hypado como o Red Bird, frequentado por modelos e figurões, sentindo-se um espelho cool e sexy dos demais convivas. A seguir, em busca de um cabo quebra-galho para o celular, vai parar num perímetro xing ling mais feio que o pior do paulistano Brás – a região da 11th Street entre Los Angeles e a San Julian. De volta à Broadway, encontra um food court em voga, o Grand Central Market, ou dá de cara com um painel incrível do artista português Vhils, que descasca paredões para desenhar rostos perfeitos. Se existe uma Los Angeles diferente por quadra, imagine o que esperar da cidade inteira. Tanto que, em minha terceira passagem por lá, não repeti duas atrações superlativas: o Getty Museum, complexo de arte recheado de obras-primas, e o jogo dos Lakers no Staples Center, sempre um acontecimento esportivo pelo mise-en-scène do ginásio.

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Refiz a visita ao Warner Studio. O tour percorre as cidades cenográficas e até adentra um dos sets – no dia em que estive lá, o auditório de Ellen DeGeneres. O itinerário inclui o Museu dos Batmóveis usados nos filmes e é finalizado no cenário do Central Perk, o café do seriado Friends, onde todo mundo se senta no sofá para tirar fotos. É ao lado desse espaço que se encontra o Stage 48, uma boa exposição sobre o processo de produção de filmes e séries, da aprovação dos scripts à escolha do figurino. Ao final, você pode interagir com cenas clássicas do cinema sob um fundo de chroma-key, desde que pague um extra.

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Ainda mais educativo, o Museu de História Natural é um programaço para crianças, mas dispensável para os adultos que já conhecem seu congênere nova-iorquino. Em três dias de Los Angeles, não consegui encaixar na agenda o parque da Universal, que tem uma elogiada visita aos estúdios e vários simuladores 3D/4D, nem andar de bike pelos casarões de Beverly Hills, como fizera da outra vez, até a Rodeo Drive, a rua das grifes. 

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Mas não abri mão de revisitar a Hollywood Boulevard – a rua da Calçada da Fama, do Dolby Theatre e do Teatro Chinês. Verdade seja dita (e eu voltei para me certificar), um mico. Não me faltou boa vontade com os imitadores de Marilyn Monroe e afins, mas a balança pende tanto para o prosaico que não dá. Sob um sol inclemente, a calçada circense muvucada de turistas me fez procurar abrigo no mais kitsch dos endereços, o museu de cera Madame Tussauds, do qual saí melhor do que entrei. Como em nenhum outro lugar do mundo, aquele templo do gosto duvidoso faz sentido em Hollywood, onde novas celebridades brotam do dia para a noite. Das atrações consagradas da cidade, ainda fui ao Museu do Grammy, que exibe vasta memorabilia do showbiz americano, como os looks megalomaníacos de Michael Jackson. Na mostra da cantora Taylor Swift, achei divertido poder brincar num mixer que aumentava ou zerava qualquer canal de gravação – inclusive a voz dela. Vizinho ao museu fica o L.A. Live, um moderno complexo com casa de shows, restaurantes e uma praça que, nos imensos telões, lembra a Times Square, mas que vive vazia, exceto durante o funcionamento do rinque de patinação e da linda árvore de Natal.

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Meio SoHo, meio Barra Funda

Fora do eixo turístico existe uma LA tão ou mais interessante. Na cena cultural em Downtown, o museu The Broad é um arrojado prédio revestido de favos brancos que reúne trabalhos de Jasper Johns, Warhol, Lichtenstein e outras estrelas da pop art. Entre as tendências insiders, porém, a bússola aponta para o Arts District, e não exclusivamente por causa das artes. Nos últimos anos, em meio aos galpões e depósitos cada vez menos fabris do bairro, surgiram ateliês, restaurantes, bares e lojas que reposicionaram – e gentrificaram – o pedaço. Ainda não é um SoHo, mas uma pesquisa prévia já identifica vários endereços que valem a incursão, como a Angel City Brewery, uma cervejaria artesanal com amplo bar hipsterizado. Nos restaurantes, sempre cheios, sobressai o estilo tubulação aparente com luz indireta e menu casual, a exemplo do Bestia e do Factory Kitchen.

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Santa Monica e Venice

Antes de deixar LA, fiz um bate e volta até Santa Monica, a cidade litorânea vizinha a Los Angeles. Não era minha primeira vez por lá, e confesso que nem o calçadão comercial da 3rd Street Promenade, nem a praia, ornada com píer, roda-gigante, uma larga faixa de areia e pouca beleza, haviam me seduzido. A vizinha Venice, então, com seu jeito rapper de ser, pareceu-me um reduto do estilo “thug life”. Mas, talvez influenciado pelo poético pôr do sol, dessa vez eu revi os meus conceitos. Santa Monica está para Los Angeles o que Coney Island representa para os nova-iorquinos: um oásis de lazer à beira-mar, com várias possibilidades ao ar livre, para os locais se libertarem das roupas e das rédeas da metrópole. Em Venice, se você quiser conhecer uma rua legal, atravesse a muvuca e vá até a Abbot Kinney Boulevard, uma avenida com butiques, lojas vintage e outras bossas. Se nada disso funcionar, tente o pôr do sol.

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Catarse em Anaheim

Estátua de Walt Disney junto com o Mickey, no Walt Disney Resort
A Disney e seu poder de realizar sonhos que nem sabíamos que tínhamos (AaronP/Bauer-Griffin/Getty Images)

Foi com um atraso de 35 anos que eu pus os pés numa Disney pela primeira vez. Na infância, assistia sempre aos desenhos do Mickey entre propagandas da Stella Barros, adoçadas pela imagem da “Vovó” Stella. Terceiro de quatro filhos de uma família sem grana, o máximo que podia sonhar nas férias era passar uns dias na Praia Grande (SP), em casa emprestada. Fazia 36°C em Anaheim, meia hora ao sul de Los Angeles, quando essas lembranças saltaram da memória. O parque transbordava de gente, e, mal as adolescentes passavam da entrada, já saíam das lojas com o laço-borboleta da Minnie na cabeça. Na rua principal, o castelo-símbolo da Cinderela, bem menor do que aparenta na TV, me dizia que talvez eu não fosse a pessoa certa para estar ali.

Eu me encontrava no parque original de Walt Disney, a Disneyland (ou Disneylândia), aberto em 1955, mas não deixei de fazer um tour pelo California Adventure, que fica em frente e também é parte do complexo Disney. O Adventure complementa a Disneyland, bem infantil, com algumas atrações mais radicais, como a montanha-russa de Os Incríveis. Passei toda a tarde entre filas, brinquedos infantis e centenas de carrinhos de bebê, mas não me sentia incomodado. Rodeado de pessoas entretidas, eu absorvia um astral que, se não me contagiava, servia de escudo para os males menores de uma Disney no verão. Às 20h50, o povo se acotovelou para ver a parada noturna, um espetáculo com carros cheios de luzes, LCDs e neons pra Joãosinho Trinta nenhum botar defeito.

Terminado o desfile, os visitantes ocuparam a rua para a queima de fogos. Com a iluminação desligada, canhões de luz passaram a funcionar atrás do castelo, cujas paredes exibiam projeções de personagens em sincronia com uma história narrada no sistema de som. No momento em que os fogos cruzaram o alto do castelo, a música clássica do estúdio (“Tã-nã-nã-nã-nã-nã…”) tocou nos alto-falantes, como na vinheta do cinema e da TV. Dessa vez, ao lembrar da criança que não podia nem pensar em estar ali, me veio um nó na garganta e meus olhos marejaram. A mágica. Ter chegado tarde demais à Disney não me impediu de realizar um sonho que eu não sabia um dia ter sonhado.

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Bate e Fica

Anaheim pode render não um, mas dois dias de passeio se você estiver viajando com crianças. Embora seja possível conhecer a Disneyland e o California Adventure em um único dia, o visitante terá de correr bastante para explorá-los a tempo – e, mesmo assim, perderá o show noturno (o filé!) de um deles, já que os espetáculos ocorrem simultaneamente. Se a decisão for passar a noite na cidade, saiba que, além de Downtown Disney, com lojas, lanchonetes e cinemas, vale a pena dar uma volta pelo gracioso Promenade do Centro, entre cafés e restaurantes e fazer uma refeição no Packing Hall, food hall que fica em um antigo armazém de Anaheim.

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