Não é uma coisa fácil encontrar o lugar da gente no mundo. Alguns se sentem em casa no coração agitado de Manhattan, outros só querem curtir seu chalé nas montanhas. Eu me encontrei na Lagoa da Conceição, em Florianópolis.
A Lagoa propriamente dita é tão grande (cerca de 15 quilômetros quadrados) que seu entorno se divide em vários bairros, às vezes distantes entre si, ou de difícil acesso. Há o Canto da Lagoa, o Porto da Lagoa, a Barra, a Costa… Tudo é Lagoa, mas, quando alguém diz que mora na Lagoa, está se referindo ao que chamamos de “centrinho”, a concentração urbana entre o morro da Lagoa e a Avenida das Rendeiras. Esse é o meu lugar.
E o que há de especial na Lagoa? Há, antes de mais nada, uma convivência singular entre o provinciano e o cosmopolita, a paróquia e o mundo. Porque a Lagoa é uma das mais antigas freguesias da Ilha de Santa Catarina. Sua bela igrejinha foi construída em 1750 e até hoje observa, do meio do morro, o movimento do bairro. E esse movimento se tornou intenso nos últimos anos. Além de ser ponto de passagem para as badaladas praias Mole, Joaquina e Campeche, a Lagoa recebeu nas últimas décadas muitos imigrantes gaúchos, paulistas e estrangeiros em geral.
Por causa dessa particularidade, o bairro preserva a cara e o astral de uma cidadezinha do interior, mas arejada por uma infinidade de tribos e culturas. Caminhando por suas ruas, você ouve tanto a fala tradicional dos “manezinhos” como as mais diversas línguas e sotaques. A poucas quadras das ruas comerciais, onde está a maior quantidade de cibercafés por metro quadrado que eu já vi, é possível deparar com vacas pastando ou então saguis, tatus e pássaros de vários tipos. Rendeiras ancestrais convivem com surfistas, restaurantes japoneses com barracas hippies, butiques elegantes com escolas de ioga. Todos os tempos e civilizações parecem se sobrepor no centrinho da Lagoa.
É dessa mistura que eu gosto, é dela que eu me alimento. Deitar-se depois do almoço à sombra de uma árvore à beira da Lagoa ou sentar-se em um café e observar o desfile das pessoas bonitas. Caminhar no domingo pela Avenida das Rendeiras e – se o tempo e a disposição permitirem – esticar até a Praia da Joaquina. Enfiar-se nas dunas e esquecer o alarido do mundo ou, ao contrário, mergulhar nas animadas noites dançantes do bairro. Tudo isso a Lagoa me dá. O melhor lugar do mundo é aqui e agora.
José Geraldo Couto, de 53 anos, é crítico de cinema, tradutor e colunista do jornal Folha de S. Paulo. Vive em Florianópolis desde 1999
Leia mais:
Mais que uma prainha bonita – Floripa, não, Florianópolis
Mais que uma prainha bonita – Por uma cidade sem carro
Mais que uma prainha bonita – Onde é melhor
Mais que uma prainha bonita – O essencial