Domingos Montagner e a arte de pegar a estrada
Em janeiro do ano passado, recebi o email de uma assessora de imprensa da Rede Globo oferecendo um dos seus atores para escrever um texto para a Viagem e Turismo. Esse ator era Domingos Montagner, que havia passado um mês na Patagônia argentina gravando a novela Sete Vidas e queria compartilhar aquela experiência. O texto, publicado na edição de fevereiro da revista, refletia não só a simplicidade do seu autor, como também falava de duas qualidades que todo viajante deveria cultivar, e que Domingos tinha de sobra: generosidade para com as pessoas que surgem no caminho e a facilidade de se sentir em casa em qualquer lugar. Evoé, Domingos!
Fabrício Brasiliense
Editor da Viagem e Turismo
TERRA NOVA
Por Domingos Montagner
Vivi 30 dias na Patagônia argentina, conheci uma exuberância da natureza sem igual, aprendi como se prepara o lendário cordeiro patagônico, deixei cadeira cativa em bares pra lá de hermosos e realizei um trabalho muito gratificante durante as gravações da nova novela das 6 da Globo, Sete Vidas.
El Calafate é uma cidade da província de Santa Cruz, e seu nome vem de um arbusto espinhoso que dá uma fruta deliciosa com a qual se faz geleias e sorvetes. Os galhos, por suas características fibrosas, eram usados pelos espanhóis para calafatear as naus, isto é, cobrir os espaços entre as madeiras do casco, termo semelhante ao que usamos em português: calafetar. A cidade era um posto de descanso dos mercadores de lã que levavam suas mercadorias ao porto.
Ao passar um mês numa cidade de pouco mais de 6 mil habitantes, acabei descobrindo, por exemplo, que uma garrafa colocada em cima de um automóvel significa que ele está à venda.
O cotidiano me deixou íntimo de certos bares, como o simpaticíssimo Cambalache, que permitiu à nossa equipe fazer “asados” em seu quintal nas horas de folga e nos rendemos ao clima de fraternidade ao ver o dono de outro bar tradicional, o Isabel, vir tomar cerveja conosco. Sem esquecer do charmoso Libro Bar, com suas inúmeras referências literárias rabiscadas pelas paredes e trilhas sonoras incomparáveis.
A simpatia com “los hermanos” se consolidou principalmente no período em que estivemos gravando num barco por dez dias consecutivos. Sem voltar para El Calafate, a equipe argentina criou um clima tão bacana de irmandade com a nossa equipe que a lembrança daqueles árduos dias de trabalho é de pura alegria.
Ver um iceberg virando é algo que realmente não dá pra esquecer. A parte submersa emerge como uma jazida preciosa de um azul inacreditável. Assim como fazer um mergulho, numa das cenas, em águas a 3°C.
Ou ainda contemplar as vacas selvagens nas encostas pastando como cabras – animais descendentes de rebanhos dos antigos moradores das terras do atual Parque dos Glaciares, onde gravamos momentos épicos em lugares como Perito Moreno, Upsala e Spegazzini.
Só me resta voltar. Agora de moto. Ruta 40, me aguarde!
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Texto publicado na edição 232 da Revista Viagem e Turismo (fevereiro de 2015)