Atualizado em julho de 2019
O sol dourava as montanhas que cercam o lago de Annecy, quase na fonteira com a Suíça, quando a temperatura entrou em contagem regressiva no painel do carro (3, 2, 1, 0…). A cordilheira nevada dava razão ao GPS, aquilo só poderia ser os Alpes, apesar de a rodovia continuar rápida como uma highway. Até Moûtiers. Então, uma estradinha íngreme, sinuosa e sem proteção me tirou do relax.
Já era noite quando passei por Le Praz e, a seguir, por Courchevel 1550, Courchevel 1650 e Courchevel 1850, cada número, uma altitude. Na vila principal, a última, pinheiros com lâmpadas coloridas ressuscitavam lindamente o Natal em janeiro, decoração que, percebi depois, dura toda a estação de esqui, e não só lá.
Pousadas, casas e chalés de madeira lembravam Gramado – até eu entrar neles. Por trás de cada fachada rústica havia um hotel-butique caprichado, cuidadoso nos detalhes, com muito conforto, spa de grife, cozinha gourmet e diária acima dos R$ 3 000.
De olho no mesmo público, lojas da Dior, Prada, Louis Vuitton e Lacroix dividiam parede na Rue du Rocher, perto das gôndolas Jardin Alpin e Verdons, na maior concentração dessas etiquetas em um lugar tão pouco habitado – 6 mil pessoas no inverno, não mais que 2 mil no restante do ano, quando tudo fecha.
Muita riqueza, muito russo
Criada exatamente para ser um resort de esqui, Courchevel ganhou seu primeiro lift em 1946, cresceu nas décadas seguintes, sediou a competição de saltos das Olimpíadas de Albertville, em 1992, e se tornou a maior área esquiável do mundo ao conectar oito resorts de quatro vales, com 600 quilômetros de pistas.
Nos últimos anos, seu posicionamento AAA, com 19 hotéis de luxo e sete restaurantes estrelados pelo Michelin, caiu no gosto dos milionários russos, para quem o destino virou fashion. Segundo maior público estrangeiro do resort, eles estão por todo lugar, com muitas Sharapovas e Kournikovas desfilando looks de capa de revista.
E rasgando dinheiro. Na noite de 6 de janeiro, véspera do Natal Ortodoxo Russo, centenas de instrutores de esqui empunharam tochas para descer a montanha até a vila, um espetáculo visual criado especialmente para os abastados turistas do Kremlim.
Mais tarde, na balada La Cave, eu pagaria com dó os € 44 por uma dose de uísque (!), enquanto os filhos de Putin pediam à vonts garrafas de Dom Pérignon, Cristal e outras bebidas-que-piscam a € 700, € 1 000 o casco. Informalmente, os russos são uma espécie de “mal necessário” para Courchevel. Necessário, por motivo$ óbvio$. Mal porque, segundo o que ouvi de guias de esqui e outras pessoas que trabalham no turismo, os russos ricos são rudes e arrogantes.
Nem só de russos vive Courchevel, vide o casal real William e Kate, que está sempre lá. Os brasileiros, o décimo maior público estrangeiro, já são duas vezes mais numerosos do que há alguns anos.
Minha experiência em Courchevel
Tudo era novo para mim, que só havia visto neve em duas ocasiões, e somente por algumas horas. Com os esquis pela primeira vez nos pés, fui apresentado ao instrutor Julian, um francês gente boa cujo português é aprimorado em viagens a Itacaré, onde ele constrói uma choupana. “Snowplow!”, cansei de ouvir dele.
Snowplow é a posição de feio do esquiador iniciante. O praticante separa bem as pernas e aproxima a ponta dos esquis, em V invertido, cravando as bordas internas na neve. “Você é um craque”, ele dizia, mesmo quando eu fazia uma barbeiragem.
Motivação é a palavra-chave do aprendizado, uma das duas razões para você não arrancar aquelas botas duras, que deixam os pés doloridos nos primeiros dias. O outro motivo é o próprio esporte, a poderosa sensação de descer a montanha com controle e velocidade.
Eu fiz ainda duas refeições estreladas em Courchevel, a melhor delas no Le Chabichou, uma instituição local.
Também foi divertido o sledge (descida de trenó), apesar dos apuros. Com as pernas para fora do brinquedo, eu pisava fundo na ladeira, o que me permitia guiar e fear. Nesse movimento, muita neve entrava no carrinho, sob as minhas costas, que começaram a escorregar. Não demorou muito para que eu, mais pesado do que o trenó, deslizasse totalmente para fora dele, tornando-me o próprio sledge na neve, até parar no meio da pista.
Um molequinho passou por mim no cacete e não economizou: “Asshole!” Ah, muleque… Neve não é o nosso elemento, o nosso habitat, e era só o meu começo. Queria encontrar o guri lá embaixo, pegar uma bola de futebol e chamá-lo pra dançar. “Vem aqui, seu…!”
Ficha técnica — Courchevel, na França
• Localização
Vale de Saint-Bon, departamento de Savoie e região do Rhône-Alpes, sudeste da França. Site oficial
• Temporada
Começo de dezembro a final de abril (em média 140 dias). Confira as datas exatas de cada ano no site oficial.
• Neve acumulada (média em cm)
• Montanhas
Maior área esquiável do mundo, com 490 hectares, o chamado 3 Valleys (Les 3 Vallées) conecta oito resorts (como Méribel e Val Thorens, além de Courchevel) e, originalmente, três vales, Saint-Bon, Allues e Belleville. Em 1996, o vale de Maurienne, da estação de Orelle, também foi integrado por uma gôndola, mas sem alterar o nome original do complexo.
• Pistas, Extensão e Lifts: 96 pistas, 150 km, 58 lifts (em Courchevel)
No complexo 3 Valleys, são 318 pistas (600 quilômetros) integradas por 170 lifts. Na temporada 2013/14, o chairlift Bouc Blanc tornou-se o oitavo do resort a ganhar o sistema Magnestick Kid, em que as crianças ficam presas por ímã ao encosto, sem riscos de acidente. No pico de Saulire, o segundo cable car foi renovado e agora sobe com estilo dos 2 100 para os 2 700 metros.
• Ski pass
O preço do ski pass varia por período. Para seis dias, custa a partir de € 208 para Courchevel e € 250 para o 3 Valleys. Confira os preços aqui.
• Aluguel de equipamentos
De € 32 a € 50 por dia (esquis/prancha de snow, botas e capacete) na L’Atelier du Ski e na Jean Blanc Sports, ambas na Rue Park City.
• Aulas
€ 460 (por dia, aula individual), € 412 (por seis dias, coletiva, para até oito pessoas). Reserve na EFS, a Écoles du Ski Français.
Guia VT
O FILÉ
Playground de Beyoncés e David Beckhams, Courchevel 1850 ostenta joalherias e butiques de grifes como Valentino, Queen, Prada, Hermès Chanel, Dior e Louis Vuitton, todas na Rue du Rocher. Entre os 19 chateaux de luxo, o destaque é o L’Apogée, ski in/ski out logo acima de 1850. Lodge montanhês por fora, o interior explora materiais como lã, couro, linho e camurça.
Nas cercanias de Courchevel 1850, brilham o Le K2, integrante da The Leading Hotels; o Cheval Blanc; o La Sivolière; o Le Strato, que aluga esquis Rossignol (top) desenhados para o hotel; o moderninho Les Suites de la Potinière, que tem um pé na montanha, outro no Centro; e o Le Chabichou, instituição com a chancela Relais & Chateaux.
A gastronomia do resort também sobra. São várias estrelas Michelin, todos dentro de hotéis de Courchevel 1850: Le 1947 (o único com três estrelas da região, no Cheval Blanc), Le Chabichou, Le Kintessence (no Le K2), e Le Montgomerie (no Le K2 Altitude), todos com duas estrelas, e o Baumanière 1850 (no Le Strato) com uma estrela.
BARGANHAS
O Le Chabichou tem menu de almoço com preço razoável para um duas-estrelas. Na pista, o Les Verdons tem porções generosas e um belo visual.
Para se hospedar sem abusar, pesquise por chalés ou apês como o Residence Les Écrins (reservas nesse site). Esquiadores iniciantes devem considerar as aulas coletivas matinais: são mais baratas, e as pernas se cansam nas aulas integrais. Se você tiver criança, poderá deixá-la no Village des Enfants por menos.
CRIANÇAS
O Village des Enfants ensina esqui a crianças a partir de 1 ano em pacotes de cinco, seis ou sete dias, em turmas de até seis pequenos. As reservas devem ser feitas na ESF.
OFF SKI/APRÈS SKI
Na caminhda com snow-shoes, você explora a natureza com um guia da ESF. Do Altiport de Courchevel, aeródromo famoso pela pista de apenas 525 metros e 18° de inclinação, partem voos panorâmicos de helicóptero. Também ali sobem os balões da Ski Vol.
Brinde do resort, portadores de ski pass descem de graça de trenó até Courchevel 1550. Para depois do esqui, o L’Equipe fica no crime, na saída da pista do centrinho. Em Le Praz (1300), o La Cave des Lys reúne a galera em torno de queijos, embutidos e vinhos.
COMO CIRCULAR
Além dos lifts que interligam as vilas, há ônibus grátis (7h/1h30) a cada 30 minutos (a cada 10 entre Courchevel 1650 e 1850). Na sinuosa, Courchevel Le Praz (ou 1300) é onde vive a maioria dos moradores, Courchevel Village (1550), reduto de chalés para famílias, e Moriond (1650), charmoso pedaço com bistrôs e bares. No alto, Courchevel 1850 é o Centro, onde estão hotéis, restaurantes e grifes do badalo.
COMO CHEGAR
Da estação Gare de Lyon, em Paris, são 4h de TGV até Moûtiers, mais 40 minutos de táxi ou ônibus. De carro, são 7h desde Paris ou 2h30 de Lyon ou Genebra.
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