Turismo de aventura: tragédias reforçam necessidade de regras no setor

Regulamentação específica por atividade e fiscalização mais rígida são citadas por especialistas como caminho para minimizar riscos aos viajantes

Por Maurício Brum
30 jun 2025, 16h00
balonismo-passeio-balao
Balonismo turístico não tem regulamentação própria no Brasil; setor se guia pelas normas do balonismo desportivo (Kristen Hall/curated_passage_travel/Unsplash)
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A busca por adrenalina tem feito cada vez mais viajantes tentarem “fugir do óbvio” quando vão explorar um novo destino. Mas o crescimento do turismo de aventura também expõe muita gente a situações de risco, dentro e fora do Brasil.

Quatro casos recentes repercutiram pelas piores razões ao longo de junho – a morte da brasileira Juliana Marins após cair na encosta de um vulcão na Indonésia, a queda de um balão que vitimou oito passageiros em Praia Grande (SC), outro que levou à morte de uma mulher em Boituva (SP) e o resgate de mais de 70 pessoas em pranchas de stand up que foram levadas pelo vento para alto-mar em Copacabana – chamaram atenção para os desafios que esse tipo de viagem impõe: fiscalização inadequada, regras precárias e, muitas vezes, a falta de informação suficiente apresentada aos próprios viajantes sobre os riscos de cada atividade.

Acidentes acontecem e, por razões óbvias, nem sempre é possível evitá-los. Mas especialistas no assunto apontam que algumas medidas podem ser tomadas, tanto em termos de políticas públicas e regulatórias quanto nos cuidados individuais de cada viajante.

Imagem de drone mostra brasileira Juliana Marins após cair do penhasco
Indonésia: o equipamento de resgate adequado e a ação célere talvez tivessem salvado Juliana Marins (redes sociais/Reprodução)

Recomendações dos especialistas

“Do ponto de vista jurídico, há uma clara ausência de uma regulamentação específica para atividades de aventura, o que gera insegurança tanto para consumidores quanto para operadores”, comenta o advogado Marco Antônio Araújo Júnior, presidente da Comissão Especial de Direito do Turismo, Mídia e Entretenimento do Conselho Federal da OAB.

Segundo Araújo Júnior, práticas de turismo de aventura no país até estão sujeitas a normas gerais como aquelas ditadas pelo Código de Defesa do Consumidor e as normas técnicas da ABNT, mas ainda faltam regras claras para cada uma das atividades do tipo. Para ele, o “vácuo regulatório” acaba por comprometer “tanto a segurança dos consumidores quanto a atuação dos operadores e a efetividade da fiscalização”.

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O Ministério do Turismo deve receber entidades do setor e a próprio OAB para discutir o assunto nas próximas semanas. Para o especialista, alguns pontos são indispensáveis na pauta, em busca de garantir uma melhoria geral dessas opções de atividades. Ele elenca os principais:

  • Definição de padrões mínimos de segurança;
  • Critérios técnicos obrigatórios para operadores;
  • Exigência de seguros obrigatórios;
  • Capacitação profissional;
  • Criação de um cadastro nacional específico para operadores de turismo de aventura, integrando dados com órgãos de fiscalização e defesa do consumidor;
  • Fortalecimento dos mecanismos de fiscalização, inclusive com apoio de tecnologias;
  • Criação de campanhas de informação para os consumidores;
  • Avaliação da necessidade de proposição de um projeto de lei complementar tratando exclusivamente do turismo de aventura e risco controlado.

Em nota oficial, a Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura (ABETA) também se manifestou pelos episódios recentes. Citando as tragédias de Praia Grande e Boituva, a entidade lembrou que o setor de balonismo turístico “ainda não conta com regulamentação técnica específica” no país, seguindo apenas as regras do balonismo desportivo, elaboradas para outro contexto.

“A inexistência de regras técnicas específicas para o balonismo turístico, associada a lacunas na fiscalização e à atuação de operadores não formalizados, contribui para o aumento dos riscos”, afirmou a entidade, reforçando que o setor precisa de “capacitação, normalização técnica e fiscalização eficaz.”

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Incêndio no balão começou após voo com sinais de instabilidade
Praia Grande (SC): o piloto do balão relatou que o extintor de incêndio não funcionou (redes sociais/Reprodução)

O que você pode fazer como viajante

Nem sempre é fácil prever o que pode dar errado, especialmente quando você está em um país diferente. Diante de tragédias naturais, como a ocorrida em Capitólio em 2022 (quando uma erosão natural se juntou a uma cabeça d’água e acabou desprendendo parte de um paredão rochoso sobre lanchas com passageiros), uma recomendação é ter sempre atenção às condições climáticas do local onde você está.

Chuvas não devem preocupar só quando caem sobre o seu lugar específico, mas também em regiões vizinhas, especialmente em passeios que envolvem rios, quedas d’água ou até mesmo saídas para o mar. A precipitação nas cabeceiras pode levar a um aumento repentino dos níveis ou da violência da água que aumentam muito o perigo de qualquer atividade do tipo.

Também tenha em mente que, no Brasil, as empresas responsáveis pelo passeio são obrigadas a cuidar dos clientes, informando sobre os riscos e contando com guias profissionais que conheçam a área e saibam lidar com eventuais emergências que possam a surgir. Qualquer termo de isenção de responsabilidade apresentado aos clientes – uma prática infelizmente comum – é irregular e não tem validade legal. Se algo sair fora do previsto, a empresa pode ser acionada judicialmente.

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Equipamento inadequado

Na tragédia envolvendo Juliana Marins na Indonésia, a situação era ainda mais difícil. Inúmeros relatos nas redes após o episódio reforçaram que guias locais acabam minimizando a dificuldade do trajeto, aceitando levar turistas sem os equipamentos adequados de montanhismo ou os recursos para aguentar o frio e a falta de água ou alimentos durante a subida. Nesses casos, deve-se ter cuidado redobrado em buscar informações “por fora” das agências locais, lendo relatos de outros viajantes em grupos de discussão e de fato pesquisar profundamente antes de embarcar em qualquer atividade que envolva riscos. Se você conhece alguém que já fez o passeio antes, vale também consultar o que essa pessoa tem a dizer.

Lembre-se, ainda, de contratar seguro viagem sempre que for ao exterior – a recomendação é especialmente importante para quem pretende fazer turismo de aventura, mas vale em qualquer situação. Além de proporcionar uma segurança a mais em caso de necessidade de atendimento médico, esses seguros também costumam dar cobertura para fatalidades, facilitando a repatriação do corpo caso o pior cenário venha a acontecer.

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