Coronavírus: lições e impactos do verão em Portugal
Conversamos com Marita Barth, diretora geral do Grand House Hotel, no Algarve, sobre os aprendizados do verão em pandemia
Quando perguntei ao mensageiro do hotel que nos acompanhava ao quarto como tinha sido movimento durante o verão e ele não hesitou em contextualizar, sorriso escancarado nos olhos por trás da máscara, que estava tudo bem “depois do coronavírus”, logo percebi que a animação era a tônica do momento naquele canto especial do sul português onde o Algarve encontra a Espanha, o céu é mais azul e as águas, mais quentes.
Um dos oito hotéis que pertencem ao selo Relais & Châteaux em Portugal, o Grand House abriu as portas no ano passado na pequenina e encantadora cidade de Vila Real de Santo António e brilha como um dos melhores destinos para experiências verdadeiramente autênticas. Depois de fechar por exatos três meses, de 15 de março a 15 de junho, durante o lockdown, o palacete reabriu para encarar o calor de frente. Terminado verão (que, no Hemisfério Norte, foi de 20 de junho a 22 de setembro), conversamos com a alemã Marita Barth, sua diretora-geral, sobre o saldo da estação mais esperada do ano num dos momentos mais difíceis do turismo mundial.
Quais foram os principais impactos da pandemia no turismo?
Nós fechamos o hotel no dia 15 de março, quando o último cliente saiu. Era uma grande incerteza, ninguém sabia o que era e o que viria a ser. Não sabíamos nem por quanto tempo. No começo todos diziam que seria bom para desacelerar, para viver o momento… eu fiquei furiosa com isso! Como é que eu posso ler um livro quando tenho preocupações verdadeiras, com 42 famílias (dos funcionários) a depender do hotel? A vida não pode parar assim! Com a reabertura, posso dizer: o mercado nacional salvou o agosto aqui no Algarve. Quem antes não trabalhava com o mercado português até teve a oportunidade de ganhar um novo nicho. Os portugueses acostumados a passar férias no exterior tiveram a oportunidade de ver um Algarve que talvez nem tivessem em mente. Eu mesma ouvi muitas vezes: “eu pensava que o Algarve era completamente diferente!”. E ainda por cima esta parte da região, que é autêntica, é Portugal de verdade. Os portugueses redescobriram o Algarve – e gostaram!
Terminado o verão, qual foi o saldo da temporada?
Tivemos a possibilidade de viver um Algarve único, no calor e sem multidão. Foi uma emoção, mas ao mesmo tempo uma oscilação entre o UAU e um outro lado triste, irreal. Ver as praias no início, quando já deveriam estar bem frequentadas, quase vazias, com cinco pessoas… é “giro” (legal) para o lado pessoal, mas é muito ruim para os negócios. As pessoas que vieram passar férias aqui em julho foi o melhor mês que poderiam escolher – menos movimento, o serviço estava mais atencioso… As pessoas mais felizes, aliviadas, com vontade de receber. Foi tão giro ver as pessoas voltarem!
Mas nem tudo foram flores…
O que foi mesmo grave para todos foi a quebra no mercado inglês. Quando abriram o corredor aéreo (eliminando a necessidade de quarentena na volta), parecia um bingo: plim, plim, plim! As reservas começaram a aparecer, foi uma euforia, uma festa! Mas quando fecharam de novo (algumas semanas depois) foi o contrário – começou a haver uma chuva de cancelamentos.
Como ficou a taxa de ocupação?
Nós fechamos agosto (o principal mês do verão) com 45% de ocupação – embora esperássemos estar acima dos 70%, antes da pandemia, para nós foi bom neste momento, não estávamos à espera. As estatísticas mostram que os hotéis cinco estrelas do Algarve mantiveram este mesmo percentual. Com um detalhe: nós não baixamos os preços. Os hotéis de luxo se uniram e decidiram não baixar. Isso não é uma crise econômica neste momento no nosso nicho. Pode vir a ser, mas neste momento os turistas não estavam vindo por medo, não por causa do dinheiro. Mas fizemos algumas ofertas pontuais – como, por exemplo, ‘fique sete e pague cinco dias’, porque queríamos estimular as pessoas a ficarem mais.
Quais foram os principais aprendizados deste período?
Foi interessante, estou a analisar muito mais os hábitos dos hóspedes, eu hoje faço gráficos que nunca fiz na vida! Descobri, por exemplo, como os turistas são sensíveis às notícias! Elas impactaram diretamente as reservas. Também aprendemos muito sobre o ser humano e seus medos. Precisamos considerar a natureza humana dos negócios, ter sensibilidade a isso. Outro ponto: eu hoje sei muito mais do negócio do que antes – sei, por exemplo, exatamente quais são os meus custos quando estamos fechados. Também gostei de ver que durante a pandemia houve uma união entre os hotéis da região pela primeira vez – trocando ideias de higiene, técnicas de vendas… o setor se uniu de verdade. Isso foi um grande aprendizado.
E os planos para o futuro?
Nós não interrompemos as novidades nem com a pandemia. Em julho inauguramos o nosso serviço pop-up na praia, para o verão. Em breve abriremos uma conserveira com um restaurante e um terraço bem ao lado do hotel. Na primavera temos planos de abrir um bar de champanhe no rooftop e o nosso Grand Society Club, um clube para sócios e hóspedes com bistrô, cinema, bar, lounge de charutos… E a marca Grand House prevê a expansão pelo país! Ainda não há nada fechado, mas Porto, Sintra, Comporta… são todos destinos que estão no radar do grupo!