Viajar de Ryanair: tortura ou mão na roda?
Para algumas pessoas, viajar com a companhia aérea mais barata do mundo é uma “aventura exótica”. Para outras, reclamar dos “absurdos da Ryanair” (e continuar fiel a ela) é um vício. Como não voava há tempos pela empresa, vinha evitando tocar no assunto. Afinal de contas, poderia estar desatualizada. Pois bem, no último mês, viajei três vezes pela low-cost irlandesa: voltei de Bratislava a Girona-Barcelona, e fui e voltei de Vilnius, na Lituânia. Tortura ou mão na roda? Depende do destino, de quanto se economiza com isso, de seguir à risca as normas xiitas da companhia e, acima de tudo, do seu perfil.
Por que deveria me submeter a voar Ryanair?
O caso da passagem de Vilnius é o meu melhor exemplo. A companhia aérea mais barata, fora a nossa “amiga”, tinha bilhetes disponíveis por € 300 euros ida e volta, com uma escala. Pela Ryanair, saiu por € 125 (já com uma mala incluída, que aumentou em € 30 o preço da passagem), e o voo era direto. Multiplicando por dois (fui junto com a minha queridíssima mãe), economizamos € 350: quase o valor de cinco dias numa baita suíte do fofíssimo B&B Mano Liza, pela qual pagamos € 380, com café da manhã. Se valeu a pena? Muito.
Mas e isso de voar para aeroportos que são longíssimos das grandes cidades? Continua valendo a pena?
Aqui temos o grande porém. No caso de Vilnius e Bratislava, a Ryanair tem base nos aeroportos principais – em Barcelona, também, só que para poucos destinos. Ainda que eu tenha embarcado no aeroporto de Girona, a 1h15 de Barcelona, pelo menos passei por esse perrengue de deslocamento longo apenas em um dos trechos de cada viagem. No caso de ter que fazer duas viagens de ônibus e mais um voo só para chegar até um destino (como seria o caso de ir de Girona até Estocolmo-Skavsta, Londres-Luton ou Milão-Bergamo), vale pensar duas (ou até mais) vezes. Na minha modesta opinião, só vale mesmo se a diferença de preço for muito gritante – e a questão é que muitas vezes é.
Afinal de contas, quanto costuma demorar a viagem até esses misteriosos aeroportos alternativos?
Em média, entre uma hora e uma hora e meia (se você está acostumado com Guarulhos, vai reclamar?). No caso de Girona, a viagem de ônibus saindo da Estación del Nord de Barcelona demora cerca de 1h15. No entanto, muitas vezes é preciso sair bem mais cedo porque os horários não são exatamente convenientes para todos os voos. Mas, como diria o meu amigo Daniel, “se você não tem dinheiro, pelo menos tem que ter tempo”.
Mas ir até esses misteriosos aeroportos não acaba saindo caro e botando abaixo a economia?
Depende do caso. Ir até o aeroporto de Girona de ônibus (bem confortável, saindo da Estácion del Nord, aonde é possível chegar de metrô ou ônibus urbano) custa € 12. Ir até o aeroporto principal de Barcelona custa € 5,30. Exatos € 6,7 de diferença. Definitivamente ninguém vai morrer por causa disso. Em vários destinos essa é a média de preço. Uma das exceções é Londres: ir de Luton até o centro custa € 16 de trem e € 18 de ônibus (vale lembrar, no entanto, que TODAS as low-costs voam para aeroportos alternativos de Londres). Portanto, repito: vale a pena, dependendo de quanto você economizou voando Ryanair ao invés de outra empresa melhorzinha.
E o voo em si? É tão ruim assim?
A diferença está nos detalhes – e são vários deles, mesmo em relação a outras low-cost. Essas pequenas coisas costumam irritar a algumas pessoas.
Além de bancos estreitos, poltronas que não reclinam e serviço de bordo pago e caro, algo comum entre quase todas as low-cost, na Ryanair…
… o avião está lotado de publicidade, é um verdadeiro outdoor voador.
… não existe aquele bolsinho no banco da frente para guardar revistas, para que a limpeza possa ser feita mais rapidamente (e por menos gente, provavelmente).
… as aeromoças vendem uma espécie de bilhete de loteria.
… tanto em Girona como em Vilnius tivemos que caminhar por uns 300 metros até o avião. Em Girona estava chovendo torrencialmente.
Quais são as pegadinhas que deixam as pessoas tão furiosas?
Ao comprar um bilhete de Ryanair, você tem que clicar em N casinhas de “concordo com isso”, “concordo com aquilo”. Basta ler todas essas condições com paciência, e seguir todas as regras à risca, que você passa imune a uma boa lista de pegadinhas — no entanto, muita gente sucumbe:
– Você está obrigado a fazer check-in pela internet e imprimir o seu cartão de embarque. Se não fizer essa lição de casa, paga uma multa de € 40 (!). Agora, venhamos e convenhamos: dá tanto trabalho assim imprimir um maldito papel em casa? Fazer check in on-line, aliás, é uma ótima pedida mesmo nas companhias aéreas regulares, porque agiliza muito o processo. Além disso, a companhia envia um último aviso por email dias antes do embarque. Só a mais distraída das criaturas pode passar batido.
– A tolerância em relação ao peso da mala é zero e faturar uma bagagem pela qual você não pagou ao reservar a passagem sai caro. Mais uma vez, basta prestar atenção, pagar com antecedência e pesar tudo antes de sair de casa. Aqui, um detalhe surreal: em Bratislava a funcionária do check-in não me deixou pesar a mala na balança do balcão antes de fazer o procedimento. Tive que pagar € 0,50 para pesá-la em uma balança ao lado do guichê. Um pouco demais, não?
– Você só pode embarcar com um volume em mãos, seja ele uma mala pequena (que deve medir exatamente o estipulado pela companhia e pesar até 10kg), a sua bolsa ou uma sacola com compras no Duty Free. Não tem choro.
– Não há lugar marcado. Mas você pode pagar uma pequena taxa para ter prioridade de embarque. Dessa forma, entra primeiro no avião e escolhe o assento, simples assim. Por que tantas pessoas se chocam com isso? Muitas vezes, em um voo lotado de um companhia top de linha, o seu lugar é escolhido aleatoriamente na hora do check in e acaba sendo péssimo, não? Comigo SEMPRE acontece.
– O mais irritante: para agilizar o embarque, eles fazem todo o procedimento, você chega a passar do portão de embarque e depois fica esperando no corredor, ufff.
O que, afinal de contas, eu acho de voar Ryanair?
Sim, eles esfregam na sua cara que você pagou barato. Sim, você perde mais tempo com deslocamentos. Sim, alguns detalhes são mesmo irritantes. Sim, eles são intolerantes e se aproveitam de qualquer distração dos passageiros para faturar. Mas se todas essas pequenas coisas fazem a passagem custar três vezes menos do que a mais barata de todas as outras low-cost (e às vezes um décimo das regulares), tô dentro! Defendo a Ryanair com unhas e dentes porque eles não enganam ninguém: ao comprar a passagem você é ostensivamente informado sobre todo o procedimento, em letras garrafais. Se você passou batido, desculpe, mas é problema seu. Por outro lado, entendo perfeitamente que a companhia seja contra-indicada para pessoas mais velhas ou menos experientes em viagens internacionais (principalmente por isso de ter mil normas e pegadinhas) e aquelas que simplesmente não precisam economizar e entraram nessa “aventura exótica” meio desavisadas. Vale dizer que acho que a minha queridíssima mãe não voltaria a repetir a experiência…
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