Imagem Blog Além-mar Rachel Verano rodou o mundo, mas foi por Portugal que essa mineira caiu de amores e lá se vão, entre idas e vindas, quase dez anos. Do Algarve a Trás-os-Montes, aqui ela esquadrinha as descobertas pelo país que escolheu para chamar de seu
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Inglaterra, novo vírus, fronteiras e um voo: meu drama para deixar o país

O pânico de estar no país e ver todos os acessos fechando, minuto a minuto

Por Rachel Verano
Atualizado em 22 dez 2020, 13h10 - Publicado em 22 dez 2020, 12h58
O voo prestes a decolar: alívio máximo depois do sufoco (Rachel Verano/Arquivo pessoal)

Se teve uma coisa que esta pandemia nos ensinou foi sobre a imprevisibilidade de tudo. A nossa falta de controle. O fato de que tudo pode mudar o tempo todo, de um minuto para o outro. E então, quando eu achava que já tinha aprendido a lição por toda a minha existência, veio mais um golpe.

Precisei fazer uma viagem curta de Portugal até a Inglaterra na semana passada. O cenário parecia dos mais favoráveis. Ou dos menos desfavoráveis, melhor dizendo. Depois de um lockdown recente, o país havia anunciado medidas mais leves e menos restritivas para o período do final do ano. As pessoas comemoravam a possibilidade de um Natal menos recluso, inclusive. Em Portugal, o governo também havia declarado um fim de ano mais light diante de um quadro que estava evoluindo relativamente bem face às medidas mais restritivas adotadas nas últimas semanas. Não havia exigência nem de teste de COVID para embarcar (que eu fiz por livre e espontânea vontade, como mais uma medida de precaução). Chegando na Inglaterra, a regra era cumprir quarentena e pronto.

Na sala de embarque do aeroporto de Manchester: quase ninguém (Rachel Verano/Arquivo pessoal)

A viagem de ida foi relativamente tranquila, em termos oficiais. Check-in mais demorado que o normal e só. Mas a sensação era a de que a pandemia estava suspensa no aeroporto – filas quilométricas de embarque, pessoas coladas umas nas outras, crianças lambendo corrimãos, fazendo birra no chão, pisoteando cadeiras. Ninguém sequer mediu a temperatura. Dentro do avião, a zona de sempre. Mas isso já não é novidade. As novidades começaram na sequência do meu desembarque, num clássico caso de lei de murphy.

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Primeiro a Inglaterra acionou os alarmes diante da descoberta de uma nova mutação do vírus, com um índice de contágio 70% mais rápido. Eu mal tinha chegado, faltavam quatro dias para o meu voo de volta e o cenário ainda parecia light. Mas a partir daí as notícias começaram a chegar como bombas. A dois dias da minha volta, assisti a lista de países cancelando voos aumentar vertiginosamente a cada minuto. Quando Alemanha e França anunciaram o bloqueio de todas as fronteiras, no último domingo, entrei em pânico. Era uma questão de (pouco) tempo até o caos se instalar.

O número de voos cancelados começou a pipocar na tela como bingo. Os poucos voos existentes para o único dia antes do meu estavam custando tipo cinco vezes mais. Além de raros, não eram uma garantia, pois os cancelamentos seguiam a mil. Portugal primeiro se pronunciou dizendo que não cancelaria voos antes de uma decisão comum da União Europeia; poucas horas depois, voltou atrás e comunicou que estava fechando a fronteira para estrangeiros e que só entrariam no país portugueses e residentes com teste negativo de covid. Domingo à noite. Tudo fechado. Laboratórios só abririam no dia seguinte. Dois dias para sair o resultado, ou quase 400 euros para um teste de urgência, sem garantia de resultados no mesmo dia. Começou uma corrida maluca.

A tela de voos do dia: cancelled, cancelled cancelled. O meu voo para Lisboa: Relax (Rachel Verano/Reprodução)

Estar numa ilha e ver todas as fronteiras fechando de uma hora para a outra é no mínimo desesperador. Querer voltar pra casa e não enxergar alternativa é das piores sensações do mundo. Mais de 20 países com fronteiras fechadas para a Inglaterra – e aumentando. Tentei comprar mil voos, para logo depois de pagar receber um comunicado oficial da anulação da compra. Passei horas tentando falar no call center da minha cia aérea sem sucesso. Cheguei a cogitar voar para qualquer país no continente europeu e chegar a Portugal de carro, mas num certo momento simplesmente não havia opção. 

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A boa notícia veio poucas horas antes do meu voo, quando finalmente consegui falar no call center da cia aérea. Meu voo não havia sido cancelado – por enquanto. Até que se provasse o contrário, eu poderia embarcar e fazer o teste de COVID na chegada a Portugal.

Escrevo este texto da sala de embarque do aeroporto de Manchester, poucos minutos depois das 7h da manhã. É claro que houve tumulto no check-in, que os funcionários não tinham todas as informações necessárias (afinal elas estão mudando a cada minuto) e é óbvio que tinha passageiro desavisado querendo viajar a turismo empacando a fila. A tela dos voos do dia é um desalento de palavras em vermelho: cancelled, cancelled, cancelled. Felizmente recebi lá mesmo a minha dose de encorajamento do dia – voo FR 3952 para Lisboa, às 9:50: “Relax”. Portão 11, lá vou eu!

NOTA DE RODAPÉ
Lição definitiva: tudo muda, o tempo todo. Aplicação prática para o momento: não está na hora – MESMO – de viajar, de sair do país onde moramos, de transitar por fronteiras. Podendo, evite. A todo custo.

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