De uns tempos pra cá, parece que não dá para falar do borough (como são chamadas as “partes” de Nova York, que também incluem Queens, Bronx e Staten Island) sem dizer que sua hora chegou, que “the place is happening”, que famosos estão mudando pra lá, que é onde os artistas e os hipsters estão, que virou a casa da nova boemia, de ideias criativas, e, olha só, construíram aquele baita estádio para shows e jogos bem ali (o Barclays Center, no caso). Tudo verdade. Com ressalvas.
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Primeiro que imaginar o Brooklyn inteiro como um grande reduto de artistas pintando murais e hipsters barbudos fazendo granola artesanal é pensar que São Paulo é só a Zona Oeste ou o Rio, só a Zona Sul. O borough todo tem 2,5 milhões de pessoas, e a verdade é que a maior parte dele ainda tem aquelas casinhas de tijolos antigas, um comércio prosaico e uma vibe bastante residencial. Cheio de gente que acha muito estranho ler dezenas de reportagens dizendo que seu bom e velho Brooklyn virou o lugar mais cool do planeta e que está de saco cheio de ver o aluguel e o cafezinho da esquina ficando mais caros.
Vamos bater perna
Para nós, viajantes, o que interessa é que você não pode mais deixá-lo de fora do seu itinerário. Comece pela vista do Brooklyn Bridge Park para Manhattan, mais impressionante do que do alto do Empire State. O parque tem vários setores, com playground, gramadões, pista de corrida, um carrossel de 1922 e sessões de cinema ao ar livre no verão. Dali vá bater pernas em Dumbo, uma antiga área industrial em que agora todo mundo quer morar. Caminhe na Front Street e na Water Street pra ver galerias e lojinhas. O brunch da Vinegar Hill House costuma ter fila, e vale a pena.
Não siga para Cobble Hill, Fort Greene e Park Slope despreparado: tenha um restaurante, bar ou concerto no Brooklyn Academy of Music (BAM) em mente. Ah, sim: muitos dos novos e melhores restaurantes da cidade estão no Brooklyn. O top é o três-estrelas Michelin Chef’s Table at Brooklyn Fare: é chatinho de reservar, são só 18 lugares, você senta praticamente dentro da cozinha e prova uma refeição de mais de 20 pratos (por US$ 255). Mas há muitos outros.
Dos restaurantes mais sofisticados, que também só funcionam com menu degustação, como o Aska, de pegada escandinava (desde US$ 79), e o Blanca (desde US$ 195), com um dos mais inventivos menus da cidade, até outros mais casuais e acessíveis, como o italiano Marco’s, o bistrô Reynard e o The Elm, a última moda entre os foodies.
O reduto hipster de Williamsburg
Agora vamos de uma vez a Williamsburg. Se a sua mãe não sabe o que é hipster, leve-a ali para dar uma voltinha – ela vai entender em cinco minutos. Na Bedford Avenue e suas transversais tem todo tipo de lojinha descolada onde os hipsters podem comprar suas gravatas-borboleta, suas camisas xadrez, seus coturnos e, é claro, seus vinis. E livrarias, cafés, brechós (prometo que o Beacon’s Closet agrada até a quem não gosta de brechós).
Nas banquinhas das ótimas feiras Artists & Fleas e Smorgasburg, nos fins de semana, há sabonete artesanal, roupa artesanal, comida artesanal. A Mast Brothers Chocolate, que surgiu de dois irmãos que foram buscar cacau na América do Sul para fazer chocolate artesanal, virou um hit. Hoje a loja vende até camisetas da marca. E é isso que o Brooklyn virou: uma marca. A Brooklyn Industries, de bolsas e roupas, já tem cinco lojas em Manhattan, uma em Chicago e outra em Portland. A Brooklyn Brewery, de cervejas (adivinhe, artesanais), está para abrir uma flial em Estocolmo, na Suécia (!), e o Brooklyn Bowl, uma mistura de balada com boliche, acabou de ser inaugurado em Londres.
Quem achou que Williamsburg já estava caro demais e tão cool que virou não cool foi para Bushwick, ali pertinho de Greenpoint, onde moram as meninas da série Girls. Cheguei a ir para ver um dos projetos artísticos do bairro, uma apresentação da ópera La Bohème dentro de um galpão industral feioso, com orquestra e tudo. E os novos moradores estão rezando para o lugar não virar Williamsburg, mas Bushwick já está começando a perder a cara de antes. I’m sorry, mas assim é o Brooklyn. Ou melhor, assim é Nova York.
Revista Viagem e Turismo — abril de 2014 — edição 222
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