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Em pleno cerrado, o Jalapão é um paraíso na Terra

Cenário de novela e cinema, o Jalapão tem dunas alaranjadas, água cristalina e um capim que nasce dourado

Por Laura Capanema
Atualizado em 18 jan 2018, 18h22 - Publicado em 6 set 2012, 20h41
Fervedouro Jalapão Tocantins
Fervedouro (Ffpaniago/Wikimedia commons/Dedoc Abril)
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Imagine um lugar com dunas alaranjadas e árvores com aqueles galhos retorcidos típicos do cerrado. Onde você caminha por horas e só ouve o silêncio. Insira cachoeiras com poços de água verde-esmeralda e diversas nascentes de riachos límpidos. E agora pare de imaginar, pois esse lugar existe. Seu nome é Jalapão.

“Isto aqui é um sertão com muita água, muita vida e alguns mistérios”, diz a bióloga Cassiana Moreira, que trocou Curitiba por Mateiros, uma das cidades no entorno dos 34 mil quilômetros quadrados de área do Jalapão, a grande atração do estado do Tocantins. O maior desses mistérios envolve as dunas: a região é a única do país em que é possível avistar essas formações, típicas do litoral ou de desertos, no meio do cerrado. Os turistas, brincando, costumam perguntar: “Quem jogou aquele monte de areia ali?”

Ninguém. Se no meio de tanta água existe areia, pode-se dizer que as dunas de 40 metros são um oásis ao contrário no verde do cerrado. Elas são formadas pela erosão permanente da Serra do Espírito Santo (uma trilha de 8 quilômetros leva ao sensacional mirante do topo). “Aquela serra um dia vai desaparecer. E aqui temos o privilégio de ver isso acontecendo na nossa frente”, declara a geógrafa tocantinense Maria Antônia Valadares.

A paisagem do Jalapão é atravessada por uma grande quantidade de nascentes que brotam do solo arenoso, dando origem a rios e muitas quedas-d’água. A piscina cristalina do primeiro parágrafo pode ser o Fervedouro, postal do Jalapão, que tem uma nascente subterrânea e águas que irrompem do solo com muita pressão, propiciando uma sessão de hidromassagem natural. O tom esverdeado do poço se deve à areia de origem calcária que se acumula no fundo.

Para preservar os atrativos da região, alguns cuidados têm sido tomados. As famosas dunas, que são ainda mais atraentes ao entardecer, só podem ser visitadas até 17h30, a tempo de ver o pôr do sol. À noite ninguém pode ficar por ali pensando em luaus ou coisa do tipo. “Isso ajuda na preservação. Muitos dizem que esta é uma terra de ninguém, mas temos a maior quantidade de áreas protegidas do cerrado”, diz o gerente do Parque Estadual do Jalapão, João Miranda. Nem toda a área do Jalapão está no parque, mas há ainda outras unidades de conservação. Estima-se que 40% dela esteja sob proteção.

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A julgar pela quantidade de pessoas que recebe, a região parece até bastante protegida. Calcula-se que apenas 15 mil turistas tenham pisado ali até hoje. E a ocupação permanente é irrelevante: a densidade demográfica é de menos de uma pessoa por quilômetro quadrado. “Esse lugar é longe pra…”, disse-me um taxista em Palmas, a capital do Tocantins. Conversando com mais gente por lá, percebi que poucos tocantinenses têm o hábito de visitar a região. Palmas está a 198 quilômetros de Ponte Alta do Tocantins, o munícipio de pouco mais de 7 mil habitantes que fica na entrada do Jalapão. A distância não assustaria se pensássemos em asfalto e sinalização. Mas lá não há nada disso: o que existe são estradas de terra ruins até mesmo para carros 4×4. Há poucas opções de hospedagem nas cidades de Ponte Alta e Mateiros, além do camping sofisticado da Korubo Expedições, nas margens do Rio Novo. A verdade é que, para visitar o Jalapão, tem de ter disposição.

Para Paulo Massuia, secretário de Indústria e Comércio do Tocantins, pasta que compreende as atividades turísticas, o isolamento do Jalapão está próximo do fim. Ele diz que o governo que representa pretende asfaltar 400 quilômetros de estradas na região. “Nossa maior carência é rodoviária. Com o asfalto, qualquer um poderá chegar lá mais rápido, e com carro comum”, diz. Ele quer triplicar o número de visitantes, mas, pode-se dizer, “sem perder a ternura”. Para preservar as delicadas atrações do lugar, Massuia diz que o modelo a ser seguido é o de Bonito (MS), em que o acesso aos atrativos naturais é controlado – e caro. Estudos da Universidade Federal do Tocantins (UFT) vão definir a capacidade máxima de cada atração. Em algumas delas já há controle, como no Fervedouro, onde são admitidas seis pessoas por vez a cada 20 minutos.

Nasce um destino

O Jalapão, que deve seu nome a uma plantinha que brota aos montes por lá, a jalapa-do-brasil – boa para inflamações no sistema respiratório, segundo dizem –, só começou a aparecer para o turismo em 2001, e foi pelas mãos de um forasteiro. Nascido em Belém, criado em São Paulo, o ex-operador da bolsa Luciano Cohen se apresenta como um dos descobridores da região. Ele é dono da Korubo Expedições, que mantém um acampamento sofisticado à beira do Rio Novo. Por alguns anos Luciano buscou no Brasil um lugar de potencial turístico em que pudesse investir. Chegou ao Jalapão em 1996. “Na época só existia uma única pousada em Mateiros. Comprei então uma Toyota 4×4 para desbravar a região. Eu e minha mulher passamos dias e dias acampados no meio do nada. Quando vi aquelas dunas e as cachoeiras, percebi que tinha encontrado uma mina de ouro”, diz.

O negócio começou quando eles compraram parte de uma fazenda. Cohen diz ter investido R$ 450 000 e encarado prejuízos por oito anos seguidos. Seu acampamento tem 13 tendas equipadas com camas, banheiros com chuveiros aquecidos a energia solar, tudo em uma área de 15 mil metros quadrados à beira do Rio Novo. O turista que comprar o pacote tem direito a quatro pernoites no camping (e outros dois em pousadas em Palmas), a todas as refeições e ao transporte em um caminhão adaptado que leva até 25 pessoas. Aberturas no teto da carroceria do veículo permitem que os passageiros admirem a paisagem durante os loooooongos deslocamentos pelo Jalapão.

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É inusitado perceber que a opção mais interessante de hospedagem na região seja um camping. Mas aqui, como em nenhum outro lugar do Brasil, a estrutura se assemelha à dos luxuosos campings selvagens africanos. Mas isso não é para todos. Opções ao acampamento da Korubo são as pousadas humildes das cidades da região. É possível contratar, por conta própria, um guia, alugar um 4×4 ou fazer logo o combo guia e carro o que propicia liberdade na escolha dos passeios. Se você decidir pelo caminho independente, a Pousada Planalto, em Ponte Alta do Tocantins, tem quarto com frigobar e pão de queijo quentinho no café da manhã.

O capim que vale ouro

“Meu capim, meu capim dourado / que nasceu no campo sem ser semeado…”, cantam as crianças do povoado quilombola de Mumbuca, com pouco mais de 200 habitantes, a 35 quilômetros de Mateiros. Os primeiros integrantes da comunidade chegaram ao Jalapão no final do século 18, oriundos da Bahia. O objetivo era fugir da seca. Ali, no sertão das águas do Jalapão, eles tinham um clima que conheciam, mas com a vantagem de poder viver das plantações de mandioca, milho e feijão. E, veriam depois, do capim-dourado.

A planta, uma espécie de sempre-viva, brilha como ouro e brota nas veredas do cerrado. Há espécies em outros lugares do Brasil, mas nenhuma é tão dourada quanto a do Tocantins. O capim é colhido apenas uma vez por ano, no começo da primavera, antes das chuvas, que chegam lá em meados de outubro. Nas mãos das artesãs locais, a planta se transforma em lindos cestos, colares, brincos e outros artefatos.

O capim-dourado passou a fazer sucesso como artesanato no início dos anos 2000, a mesma época em que o Jalapão despontou para o turismo. Foi dona Miúda, uma liderança do povoado, que começou a colher as mudas para fazer objetos trançados. Ela morreu em 2010, mas seu legado permanece vivo entre os quilombolas, reunidos na Associação Extrativista do Povoado de Mumbuca. O artesanato do capim-dourado gera a principal receita da localidade na alta temporada, de maio a setembro.

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O Jalapão pode ser visto na novela das 9 da Rede Globo, “O Outro Lado do Paraíso”, e também pode ser visto em filmes brasileiros, como Xingu, de Cao Hamburger, a cinebiografia dos irmãos Villas-Bôas, os grandes sertanistas brasileiros, e no mais antigo Deus É Brasileiro, de Cacá Diegues, com Antonio Fagundes. Agências de Palmas já organizam um “tour cinematográfico” que passa pelas locações do sertão do Jalapão. Sertão que não precisou virar mar para estar cheio d’água.

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