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As festas mais tradicionais na Semana Santa pelo mundo

No Brasil e no mundo, eventos relembram a via-crúcis e a ressurreição de Jesus

Por Eduardo Jun Marubayashi
Atualizado em 20 out 2023, 14h55 - Publicado em 5 mar 2012, 14h01

Ele caiu pela primeira vez. Exausto pelo suplício aplicado pelos flagelos romanos, as pernas cederam ao peso da cruz. Seus olhos provavelmente mal podiam discernir as formas, encharcados pelo sal do suor e o rubro metálico de seu sangue. A multidão ensandecida gritava, empurrando uns aos outros. Em meio à turba, Maria se aproxima e conforta seu filho: ainda faltava um bom caminho até o Calvário. Ajudado por Simão de Cirene e com seu rosto limpo por Verônica, Jesus seguiu sua dolorosa sina. Era uma sexta-feira em Jerusalém, dia da Paixão.

Para muitos cristãos, católicos e protestantes, estes foram quatro dos catorze passos que a tradição estabeleceu para recriar os últimos momentos de sua vida. Como capítulos de um violento e comovente conto, esta intricada narrativa, da condenação sob Pôncio Pilatos, o governador romano na Judeia ocupada, à sua deposição na tumba, é para muitos o mais poderoso testemunho da missão do Messias, seu martírio e glória.

A combinação de dor física e espiritual, resistência estóica e comoção coletiva é o que moveu o credo cristão e boa parte da cultura ocidental. Carregar a cruz e passar por uma via-crúcis tornaram-se expressões correntes, mas não só nos idiomas falados. Todos os anos, em vários lugares do planeta, devotos repetem esses passos, num misto de memória e respeito.

A Via Dolorosa

Igrejas com representações dos Passos são muitas e variadas. Em Portugal a veremos em azulejos, na Itália em emocionantes quadros, na Polônia em elegantes esculturas. Mas, em nenhum outro lugar do mundo o derradeiro caminho de Cristo é dotado de maior força que nas estreitas ruelas onde elas de fato ocorreram: Jerusalém. É entre bazares árabes imemoriais e calçamentos da era romana que religiosos percorrem a via crúcis, dedicando um terço a cada estação vencida.

Os peregrinos que atravessavam terras hostis, mares infestados de piratas, desertos e saqueadores, tinham na Terra Santa o sentido de uma vida. A vista das muralhas da Cidade Velha era a luz de sua fé, e repetir os últimos passos de seu senhor na Terra era a última etapa dessa devoção.

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O caminho como marcado hoje foi deliberadamente escolhido. Não há nem mesmo provas históricas de onde foram realizados o julgamento, a crucificação e o sepultamento, havendo diferentes tradições, entre elas as bizantina e franciscana. O que vale é o simbolismo e a carga emocional do curto trajeto.

Normalmente a primeira estação encontra-se junto à madrasa (escola árabe) al-Omariya, provável localização do Palácio de Pilatos e de sua condenação. A parada seguinte está do outro lado da rua, na igreja franciscana da Flagelação, onde Cristo foi torturado e recebeu a cruz. Daqui até o Golgota existem discretas paradas, enumeradas até o número catorze e quase sempre repletas de fiéis. As cinco últimas encontram-se dentro da Basílica do Santo Sepulcro, onde Jesus teria sido despojado de suas vestes, crucificado, morto, retirado da cruz e sepultado. Os escuros ambientes da igreja possuem um ar carregado, seja pelo pranto como pelo bruxulear das velas em seus corredores.

Uma experiência menos individual, dotada de profundidade cênica notável, é a via sacra realizada pelo sumo pontífice, em Roma. Aos olhos de uma multidão, o papa conduz a procissão dentro do Coliseu, pontilhado pela luz de velas e tochas. Na fria noite de início de primavera, esta é uma experiência singular.

A tradição portuguesa

No norte de Portugal, quase junto à fronteira com a Espanha, o sol de fim de tarde tinge de amarelo a fachada da Igreja de Bom Jesus do Monte, em Braga. Obra-prima do barroco lusitano, sua magnífica escadaria em zigue-zague o levará ao adro do templo neoclássico. Aqui estão todos os elementos iconográficos que inspiraram o santuário de Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas: os lances duplos de degraus, as imagens nos parapeitos e as capelas com os Passos da Paixão, uma instituição franciscana. Outrora vencida por muitos fiéis de joelhos, a prática é cada vez mais rara nos dias de hoje.

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A tradição latina estabeleceu distintas celebrações durante a Semana Santa, das procissões do fogaréu aos tapetes coloridos do Sábado de Aleluia. Poucas manifestações, porém, são dotadas de carga tão dramática como as vias-crúcis em trajetos marcados ora por pequenas capelas, ora por imagens ou ícones. Dentre as celebrações mais notórias da Paixão encontram-se as de Tiradentes e Prados (MG), Florianópolis (SC) e Paraty (RJ). Além de, é claro, as encenações em Nova Jerusalém, Pernambuco. O Sábado de Aleluia também reserva imagens reveladoras, como em Ouro Preto.

Muito mais que um feriado quando crianças (e adultos) se empaturram de chocolate, a Semana Santa é um momento de reflexão e memória.

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