Sexta-feira, 28 de fevereiro, 8h30. Café da manhã do hotel Four Seasons, Washington D.C. Peço wafes com famboesas, chá e suco. O maître vem perguntar de cinco em cinco minutos se está tudo bem, Mrs. Neves. Dou início a uma discreta bisbilhotagem. Dois engravatados atrás de mim parecem discutir algo sobre uma transação imobiliária, mas não dá para ouvir direito: as mesas são propositalmente dispostas longe umas das outras, “afnal, decisões importantes são tomadas aqui”, tinha me dito a gerente. Um grupo de congressmen sai da sala privada à esquerda. Viro o pescoço para olhar melhor, mas o garçom se põe no meu caminho para ver se quero mais suco, mais chá, mais wafes.
Sexta-feira, 28 de fevereiro, 20h30. Trafego pela 14th Street até dar na U Street, região que há não muito tempo era dominada por gangues. Hoje dou com um conjunto heterogêneo de restaurantes e wine bars, lojas bacaninhas e restaurantes étnicos, principalmente da Etiópia. Entro no clássico Ben’s Chilli Bowl, uma lanchonete que abriu em 1958 (21 anos antes do Four Seasons) e já serviu seus hot-dogs para Miles Davis, Bill Cosby e a família Obama. Como batatas fitas afogadas em queijo e me dou conta de que, por trás da profusão de colunas neoclássicas, existe uma Washingotn D.C. muito menos sisuda e institucional.
Museus, modo de usar
Mas, se tudo o que você sabe sobre Washington veio da série House of Cards, voltemos ao sisudo e institucional. D.C. tem uma das economias mais saudáveis do país, educação pública de alta qualidade e atrai imigrantes do mundo todo (eis a razão dos muitos restaurantes etíopes). Sua história tem algo que lembra Brasília: o Congresso americano votou em 1785 na criação de uma capital federal às margens do rio Potomac. Assim como aconteceu por aqui, para muitos pareceu improvável erguer uma metrópole no meio no nada. O fancês Pierre Charles L’Enfant está para Washington assim como Lucio Costa está para Brasília: foi ele o responsável pelo projeto urbanístico único da cidade, com largas avenidas e praças.
A cidade só vingou no comecinho do século 20, quando a National Mall, o maior sucesso do plano de L’Enfant, tomou forma: um largo trecho de área verde entre o Capitólio e o rio, hoje rodeada de memoriais e 14 museus do complexo Smithsonian. Ao longo dos anos a área vem servindo para cenas comezinhas, como piqueniques dominicais, ou para grandiosas manifestações cívicas – como a histórica Marcha sobre Washigton, na qual Martin Luther King bradou que tinha um sonho.
Ali estão o Lincoln gigantão sentado em sua cadeira, o obelisco do Monumento a Washington e um Martin Luther King esculpido em granito (à noite, a iluminação é linda). E é onde aparecem crises de indecisão para escolher quais museus visitar. Vou tentar resumir: a National Gallery of Art é indispensável – tem Da Vinci, El Greco, Goya, Manet e Monet. A National Portrait Gallery é interessante, com retratos que vão dos Tudor a J.K. Rowling (é, a do Harry Potter). No Hirshhorn, de arte moderna, fique no jardim de esculturas, em companhia de uma seleção de Rodin, Henry Moore e De Kooning. O Museum of the American History é uma egotrip americana, uma mistureba de referências pop locais (como a cozinha da chef midiática Julia Child). O Museum of the American Indian é tocante: num prédio modernoso, conta como a população de índios foi dizimada no país. No mesmo registro de conhecer os horrores da história na tentativa de evitar que se repitam está o Holocaust Museum.
Se as crianças não pararam quietas até agora, melhor seguir para o Air and Space Museum, cheio de coisinhas pra ver, ouvir, apertar, empurrar. Aviões e foguetes entopem o teto, e há um planetário e um simulador. Pule o Natural History Museum se já tiver visto o de Nova York. Se sobrar tempo, passe no Newseum (o único pago), que fala de coberturas jornalísticas e tem exposições que cobrem desde casos famosos do FBI até a Queda do Muro de Berlim. Do terraço do sexto andar a vista é ótima: a cúpula do Capitólio, do século 19, ao lado do moderno edifício da ala leste da Art Gallery, de I.M. Pei (o mesmo arquiteto das pirâmides do Louvre).
O centro de visitantes do Capitólio, inaugurado em 2009, depois de seis anos de construção, fcou uma beleza. É só chegar e pegar a sua senha para o tour pelo Senado e a House of Representatives, algo como a Câmara dos Deputados. O guia leva até a antiga sala da Corte Suprema, de 1860, conta fatos curiosos (o domo pesa mais de 4 mil toneladas!) e mostra pinturas e bustos que fazem você identifcar aquele pessoal estampado nas notas de dólar. Do Capitólio, um túnel leva até a Biblioteca do Congresso e sua incrível coleção de mais de 150 milhões de itens, entre livros, partituras, manuscritos. O prédio é lindo, com colunas e escadarias de mármore e vitrais no teto. A Casa Branca, só dá para ver de longe – ou ir ao centro de visitantes, onde tem um museu com lojinha. Dê uma olhadela e siga para o National Geographic Museum, uma instituição nacional. Ali dá para aprender sobre a fundação que fnancia exploradores ao redor do mundo – e ver uma exposição sobre os 125 anos da revista National Geographic.
D.C. também anda com paladares aguçadinhos, com chefs como José Andrés, dono de vários restaurantes na cidade. O penn Quarter tem uma porção de boas pedidas, como o Jaleo, de tapas e sangrias fabulosas, e o Menu/ MBK, mistura de empório e bistrô, recém- aberto pelo chef belga Frederik De pue. Já o Dupont Circle é uma boa tanto para comes quanto para bebes: recomendo o hank’s Oyster Bar e o Komi.
Áreas revitalizadas, que nos anos 1990 eram violentas, forescem alguns quarteirões a leste (não muitos; D.C. é bem compacta). isso inclui a 14th e a U Street, mas também o bairro de Shaw, colado nelas, que tem passado por uma renovação. Ali o melhor é ir à noite e escolher restaurantes como o eat the rich e esticar para o Dickson Wine Bar.
Georgetown é outro centro de boemia, mas com público mais arrumadinho. lojas mainstream se espalham entre as casas históricas da M Street (Abercrombie, Diesel, você sabe), e bares como o eno, que abriu há pouco. No Georgetown Waterfont park, a boa é caminhar entre as árvores de fente para o sereno rio potomac. Só para reforçar que D.C. é, no mínimo, eclética.
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