Se boa arquitetura fosse o principal critério para definir o melhor bairro de São Paulo, Higienópolis seria, como se dizia no passado, “pule de 10” – o favoritíssimo. Nos quarteirões de suas ruas arborizadas estão alguns dos prédios mais charmosos da capital, a maior parte erguida segundo preceitos modernistas, a partir dos anos 1930. Em quase todas as quadras do bairro, esses edifícios enchem os olhos com suas enormes varandas, fachadas cheias de detalhes, revestimentos de pastilhas, rampas graciosas. Muito diferente do que viria a ser a tônica da cidade décadas depois, cada um desses edifícios tinha seu estilo próprio.
Vacas sagradas da arquitetura modernista, como Rino Levi, João Batista Vilanova Artigas, o suíço Franz Heep e o polêmico autodidata João Artacho Jurado, são os responsáveis pela beleza do bairro. Jurado, que deixou diversas marcas ali, fez uma alquimia toda própria ao misturar elementos modernos com adornos de outros estilos – art nouveau, art déco e clássico. Para o arquiteto e professor da FAU-USP Silvio Soares Macedo, autor do livro Higienópolis e Arredores (Edusp), o trunfo da região é mostrar diferentes gerações de arquitetos. “Há exemplos neoclássicos, de art déco, modernos dos anos 1940 e 50”, diz. Já para o professor da Escola da Cidade Eduardo Rocha Ferroni, o maior atrativo são os chamados “térreos transparentes”. “Esses edifícios modernos foram projetados para estar plenamente integrados à calçada.” E, mesmo que hoje a maioria tenha sido enclausurada por grades, ainda há visibilidade.
Basta andar pelas calçadas largas do bairro para captar instantâneos dessa beleza. A Avenida Higienópolis e a rua paralela Maranhão são os eixos desse roteiro.
PARA VER NA VERTICAL
Edifício Louveira
(Rua Piauí, 1081)
Inaugurado em 1946, o edifício de dois blocos ligados por um jardim tropical e uma rampa graciosa é um ícone do arquiteto curitibano João Batista Vilanova Artigas (que também projetou o Estádio do Morumbi e o prédio da FAU-USP). Pilotis, venezianas amarelas sobre parapeitos vermelhos, uso sistemático de vidros, formas geométricas – tudo aparece de forma plástica no Louveira. O hall de entrada envidraçado não foge à regra e tem um painel pintado. E, surpresa: ao contrário dos outros prédios que foram se fechando com grades, esse mantém apenas uma baixa cerca amarela, respeitando o caráter aberto idealizado pelo arquiteto. Se bater a vontade de entrar, não se iniba. O Louveira é um dos poucos condomínios que permitem que os visitantes subam até o hall para fotografar e conhecer um pouco da arquitetura de seu térreo.
Edifício Bretagne
(Avenida Higienópolis, 938)
Há quem julgue kitsch a arquitetura do autodidata João Artacho Jurado, enquanto outros adoram as pastilhas em tons espalhafatosos de rosa, amarelo e azul – marca registrada de seus projetos. A verdade: até hoje há fila de espera para a compra de um apartamento nesse edifício cênico, considerado seu maior e mais charmoso projeto. Ao surgir, em 1958, com seus 18 andares, tornou-se o mais alto da região. Um detalhe perto de suas outras inovações. A estrutura assimétrica, em forma de “L”, faz com que os apartamentos ganhem em iluminação natural e permite o surgimento de um grande jardim na entrada. Sustentado por enormes colunas revestidas de pedra, esse foi o primeiro condomínio da cidade a ter piscina, playground, salão de chá e música. No espírito de glamour da década de 1950, o Bretagne tem uma série de pinturas, desenhos e texturas em seu interior que o torna único. É, sem dúvida, um dos cartões-postais do bairro – e da cidade.
Edifício Lausanne
(Avenida Higienópolis, 101)
Projetado pelo suíço Franz Heep, o mesmo arquiteto do Edifício Itália, lembra uma peça de Lego colorida emoldurada por pés de jasmim e palmeira. Na fachada, as venezianas de tons diferentes regulam a entrada de luz nos apartamentos de amplas janelas. No térreo, repare no revestimento de pastilhas, no painel pintado e nos elementos vazados que completam o cenário moderno.
Edifício Prudência
(Avenida Higienópolis, 235/265)
Um dos mais emblemáticos prédios da região, criado pelo arquiteto Rino Levi em parceria com Roberto Cerqueira César. Inaugurado em 1950, tem paisagismo assinado por Roberto Burle Marx, mesmo autor dos painéis de azulejos pintados do andar térreo e que podem ser vistos da rua. Ao lado deles, observe os amplos salões de vidro, no prédio sustentado por pilotis quadrados marrons.
Edifício Cinderela
(Rua Maranhão, 163)
As colunas de pastilhas rosa, os elementos vazados que desenham um mosaico de flores-de-lis e o grande painel de mármore que emoldura o nome do prédio adornam a fachada do primeiro grande edifício de Artacho Jurado no bairro, com dois blocos de dez andares e 40 apartamentos. O resto do edifício tem revestimento de pastilhas bege e grandes sacadas arrematadas por gradis azuis de apelo decorativo. Foi inaugurado em 1956.
Parque das Hortênsias
(Avenida Angélica, 1106)
Outro Jurado, marcante pelo reluzente amarelo das pastilhas nas colunas. Separado em dois blocos com apartamentos de tamanhos diferentes, tem um exuberante jardim de comunicação. O ângulo de colocação de alguns elementos da fachada dá a ilusão de inclinação, tornando o edifício um tanto surrealista.
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