Para uma amiga querida, meus cinco endereços imperdíveis em Paris
Querida amiga,
Sei que você não tem muito tempo de viagem, que não quer gastar muito e que esta é sua primeira vez em Paris. Mesmo assim, te peço para se aquietar um pouco e deixar a cidade te levar. Talvez assim você se apaixone por lá também – e entenda melhor a fascinação da sua amiga aqui.
Para te ajudar a desencanar, nem que seja um pouquinho, dos pontos turísticos, prometi fazer uma lista dos endereços que me encantaram por lá. Nenhum é especialmente caro, a maioria na verdade é bem acessível pros padrões parisienses. Podem não ser necessariamente os melhores da cidade em suas áreas, alguns soarão até manjados para iniciados, mas foram responsáveis por momentos incríveis para mim e acho que também podem te fazer feliz. Coincidentemente são cinco, o que me motivou a publicar esta cartinha também aqui no blog – parece que no infinito da Internet tudo pode ser útil, em algum momento, para algum leitor, e é com esta esperança que escrevo cada post, de todo modo.
Começo pelo Le Zimmer, a mim apresentado pela senhorinha parisiense querida que me abrigou quando estudei lá. Ela me contou que o lugar, misto de café e brasserie, é um programa clássico antes ou depois de uma peça no Thêatre de la Ville, que fica bem em frente, do outro lado da praça do Châtelet. Isto porque, raridade em Paris, o lugar fica aberto initerruptamente das 11h30 até 1h30, o que o habilita inclusive para um jantar pós-teatro. Os preços do menu podem não ser um sonho mas a formule, disponível o dia todo por €19, é bem abordável e pode começar com um ovo poché perfeito, seguido de um prato principal. Não sei se você já comeu ovo poché antes, amiga, eu nunca tinha experimentado, porque apesar de ser um prato bem clássico vejo bem pouco aqui no Brasil. Bom, se é pra provar pela primeira vez, que seja em Paris, e que seja em um ambiente elegante como o do Zimmer. Mas pense numa elegância meio cabaré, nada clean: o cenário é composto de pesadas cortinas de veludo vermelho, o teto é cheio de afrescos rebuscados, as cadeiras são de madeira bem escura e tem franjas de tecido, meio can can. Entenderei se você não quiser comer lá, ok, mas prometa para mim que dá uma passadinha só pra conferir o décor e se sentir chiquérrima? Se for o caso, pede só um chocolate quente, ele é bem espesso, pouco doce e vem com uma tacinha do melhor chantilly da vida. Vale até como sobremesa e concorre de pertinho com meu chocolate favorito na cidade, o do Angelina.
O Angelina, aliás, é outro lugar que você precisa conferir. Porque apesar de ser bem famoso entre turistas, este salão de chá continua charmosamente aristocrático, auxiliado pela localização em um dos microbairros mais caros da cidade. Diferente do Zimmer, o salão do Angelina é chique sem ser pesado, talvez por conta da luz que entra pela claraboia, talvez pelo uso de cores mais claras e sóbrias que o vermelho carmim. A vitrine de doces, logo na entrada, é cheia de gostosuras coloridas que você verá em muitas das pâtisseries parisienses (eu espero que você passe por várias, amiga). Mas os doces custam bem caro e, se quer saber minha opinião, recomendo que você deixe para se deliciar com isso no próximo endereço que vou te recomendar. Afinal, se é para gastar quase € 10 em um doce, que seja o melhor possível. Aqui, atenha-se ao chocolat chaud à l’ancienne. Ele vem à mesa em uma jarrinha de porcelana e eu desconfio que é só para você se deliciar com a cena do líquido sendo despejado na xícara. Ele também vem com uma porção extra de chantilly, embora o creme do Zimmer seja vencedor. Há quem diga que o chocolate do Angelina é muito enjoativo, que o lugar é superestimado e que a pedida não vale € 8,20 (serve quase duas xícaras cheias!). Pois eu discordo, amiga, e acho que você vai se sentir muito elegante enquanto beberica este chocolate escutando franceses na mesa ao lado discutindo negócios ou turistas discretos debatendo o próximo destino de suas viagens de sonho. Pode me agradecer pela dica trazendo uma garrafinha da bebida que eles vendem na lojinha da saída, ok? 😉
Como eu dizia, ainda que você saia do Angelina salivando pelas sobremesas, se segure e vá gastar seus preciosos euros com as pâtisseries da Un Dimanche à Paris. A doceria mais parece uma butique dessas bem chiquetosas, encravada no miolo de Saint Germain des Près, em uma estreita rua de pedestres, charmosa até dizer chega. Nas prateleiras iluminadas, pacotinhos de gostosuras a base de chocolate, sempre com embrulhos muito elegantes. Dá vontade de levar todos pra casa, até você lembrar que não ganha em euro e que as calorias também existem no exterior. Vá direto pra vitrine de doces e deixe a atendente explicar os muitos ingredientes de cada patissêrie. Pode apostar: todos combinam muito, por mais estranhas que possam parecer algumas misturas. Como eu sou muito purista (quem vê pensa), meu doce preferido lá foi a bomba de caramelo, ou éclair au caramel. A massa é perfeitamente crocante, o recheio de caramelo tem um toque salgadinho de matar, a placa de chocolate fininha em cima do doce se quebra a cada mordida. Sacanagem escrever essa carta salivando a cada parágrafo. Mas acho que o deu pra captar o quanto essa pedida vale a pena, não deu?
A essas alturas eu imagino que você, amiga, já esteja cansada de lugares aristocráticos, elegantes, e de todo esse blábláblá. Te conheço, sei que você é hipster demais pra eles. Mas me deixa te convencer a ir em mais um clássico. Este aqui, diferente dos outros, tem uma atmosfera art déco, e é bem menos famoso porque fica num bairro pouco turístico. É o Café du Commerce, inaugurado em 1921, quando o movimento art-déco vivia seu auge. Tenho certeza que você vai se surpreender com o ambiente arejado e espaçoso que a fachada discreta esconde, especialmente com o pé-direito altíssimo de lá. Os pratos principais custam € 16 e valem cada centavo: são clássicos da culinária francesa, pratos fartos bem executados, sem muitas invencionices nem modernidades. Ah, faz uma favor pra mim? Pede a coxa de pato ao molho de laranja com gratin de batatas. Aposto que você fez cara feia pra minha sugestão porque, afinal, é pato, mas dá uma chance que é bem capaz de você descobrir que é fã desse bichinho aí. Tá no menu com o nome Cuisse de canard à l’orange, gratin Dauphinois. Eu provei também o Suprême de volaille fermière rôtie, crème forestière, opéra de patates douces, que é um frango assado bem suculento acompanhado de gratinado de batatas doces. Pode ser uma boa se você não estiver se sentindo tão aventureira.
Tenho mais uma dica de lugar pra você tentar se enveredar pela gastronomia francesa, amiga. Esse aqui é bem baratinho mesmo, que é pra você ter coragem de pedir coisas diferentes sem aquele medinho de desperdiçar uma grana alta se não gostar. O único problema do Bouillon-Chartier é que ele já foi descoberto pela turistada toda e sempre, sempre tá muito cheio. Mas quando eu digo cheio, não é que tem uma esperazinha no bar, não. Eu tô falando de uma fila literal na porta, parece até atração da Disney, com organizadores de fila e tudo. O macete é que, se você estiver viajando sozinha (e imagino que você estará, certo?), pode cortar a espera e ir direto pra porta. Arme seu melhor sorriso e avise o maître que está sozinha que ele deve te encaixar numa mesa com desconhecidos e te servir prontamente uma cestinha de pães deliciosos, como já aconteceu comigo mais de uma vez. Segure o ímpeto de devorá-los de uma vez e peça uma terrine de campagne ou um foie gras para acompanhar. Calma, eu sei que muita gente torce o nariz para esses patês gelados e gordurosos que os franceses simplesmente amam, você deve estar agora com a cara toda enrugada. Mas dê uma chance, e se você não curtir, siga a refeição tranquila com clássicos como o frango assado com fritas (Poulet fermier rôti, frites) ou o pot au feu (tradicional guisado de carne temperado com ervas). Último conselho: não ouse sair de lá sem pedir o moelleux au chocolat. Sabe o petit gâteau que tem em todo canto aqui no Brasil? Então: lá na França esse nome não significa nada e a pedida equivalente é o moelleux, que no Chartier custa só € 3 e vem acompanhado de crème anglaise ao invés do sorvete de creme de sempre. Pechincha, heim?
Não sou crítica gastronômica nem especialista em Paris (ainda), mas escrevi esta humilde carta com todos os detalhes possíveis para te ajudar a ter uma experiência incrível na cidade, como foram as minhas. Aproveito também para te desejar boa viagem em todos lugares que você pretende passar. Já sinto sua falta, vê se volta logo – e me traz umas lembrancinhas parisienses se as dicas funcionarem bem
Um beijo enorme,
Pati