Feitiço do tempo
Reaberta após longa ausência, a Cidade da Criança tem brinquedos das antigas, mas ainda emociona
Eu, como você, amo as viagens. Amo as que requerem que se pegue estrada, avião, passaporte, mala, expectativas, remédio para enjoo, aquela blusa linda ainda por estrear. As que antecipam sensações, fazem sonhar com mundos novos. Mas não só elas. Amo também as viagens no tempo que lugares guardados na memória nos proporcionam. Foi essa volta ao passado que experimentei ao adentrar a Cidade da Criança, clássico parque de diversões de São Bernardo do Campo, a 20 quilômetros da capital paulista, de mãos dadas com meu filho Enzo.
Enzo tem 8 anos e é um menino alto para sua idade. Mas o olhar e as falas plenas de inocência denotam que ele ainda é “o meu garotinho”. “Puxa, mãe, tem Xícara Maluca! Tem carrinho bate-bate!” Sim, filho, tem. Reconheço nele o encantamento e o brilho nos olhos que minha mãe viu em mim ao passear na Cidade da Criança, o primeiro parque temático do Brasil, criado em outubro de 1968 a partir da cidade cenográfica da novela Redenção, exibida entre 1966 e 1968 na extinta TV Excelsior. Os cenários da novela ainda estão lá, na Cidade da TV, exposição permanente sobre a história da televisão brasileira.
Importante atração turística da região nos anos 1970 e 1980, o parque entrou em franco declínio e, deteriorado e com baixíssima visitação, ficou fechado entre 2005 e 2010. Remodelado pela empresa permissionária Expoágua, do empresário Anael Fael, dono também do Aquário de São Paulo, é agora um complexo de entretenimento que, mesmo na contramão dos parques radicais, recebe cerca de 40 mil visitantes por mês. O estado de conservação das atrações é no geral bom, mas aqui e ali se veem brinquedos em manutenção e ainda há espaços comerciais sendo montados, defeitinhos que a cordialidade e a presteza dos funcionários compensam. O parque tem 48 mil metros quadrados, é bastante arborizado e preserva uma atmosfera tranquila apesar de estar junto do Centro da cidade.
Ao entrarmos, eu e meu filho rapidinho fomos olhar de perto o DC-3, um avião de verdade que cruzava os céus brasileiros lá nos anos 1930 e ficou em operação comercial até 1969. Pausa para fotos. E então Enzo enxerga longe e exclama: “Mãe, eu quero ir no bate-bate!” Vamos. Depois vem a Minimontanha-Russa. Míni, sim. O trecho mais elevado não passa dos 4 metros de altura. E o único carrinho, com capacidade para 26 ocupantes, repete o percurso por cerca de 4 minutos. Se não causa o pavor das montanhas-russas aflitivas como a do Hopi Hari, também não deixa de dar um friozinho na barriga. No dia da visita da VT, o carrinho-centopeia (sem barras de proteção laterais) engasgava na subida e havia um barulho das correntes que o puxavam que me deixou um pouco apreensiva. Confesso que não senti muita firmeza naquilo. Mas as crianças, claro, nem ligam. Quando deslizamos pela única curva mais veloz e descemos a “montanha” acelerando, alguns gritos do tipo “Isto é muito bboooommmm!” e “Solta as mãos! Solta as mãos!” me surpreenderam. Adrenalina light.
A eterna Xícara Maluca arranca sorrisos – Foto: Divulgação
Há inúmeras atrações que agradam aos pequenos de 2 a 5 anos e outras mais interessantes para os maiorzinhos, como o Tagadá, uma espécie de prato giratório que desafia estômagos sensíveis. Existem também brinquedos adquiridos do extinto Playcenter, fechado em julho de 2012, entre eles o elevador Frog Hopper e o Fire Chief, um caminhão de bombeiros que simula movimentos de roda-gigante. Ah, e voltou a funcionar o submarino fake Humaitá, que já existia lá na minha infância. Agora dotado de elevador elétrico para cadeirantes, desce a até 3 metros de profundidade, num tanque gigantesco, em passeio de 4 minutos por um fundo do mar “cenográfico” – há ali peixes, tubarões, polvo e tartarugas marinhas de mentirinha que fazem você imergir no faz de conta sem medo de ser feliz.
Uma surpresa agradável foi a gibiteca, administrada pela prefeitura, que abre uma hora antes do parque e oferece bom acervo de revistinhas e livros infantis. O acesso é gratuito, e, mediante cadastro, moradores de São Bernardo podem levar dez itens emprestados por até duas semanas. Enzo não abriu mão de curtir um gibi naquele espaço tranquilo e bem iluminado, supervisionado por duas atendentes. Quer algo mais high-tech? Tem cinema 4D e sala de games.
A entrada no parque é gratuita, e você pode optar por comprar ingressos para cada um dos 42 brinquedos separadamente (de R$ 5 a R$ 10) ou o passaporte (R$ 35), que não inclui as atrações Submarino, Monga (sim, ela existe), Crazy House, planetário, teleférico, Trenó Aquático e circuito de arvorismo. Para a hora em que bate uma fominha, lanchonetes e quiosques oferecem gostosuras com sabor de infância a preços que não vão à estratosfera como em outros parques de diversões, com cachorro-quente a R$ 5, pipoca de R$ 2 a R$ 7, algodão-doce a R$ 4 e maçã do amor a R$ 5.
A tarde já vai findando, e pergunto a Enzo o que achou da Cidade da Criança. Ele, que aprecia também os parques “radicais”, que sua geração chama de “irados”, abre um sorriso cativante e exclama: “É muiiittttoooo legal! Tem brinquedos que giram, carrinho bate-bate. E uma roda-gigante bonita.” E por que mais? “Porque é um lugar diferente. Tem brinquedos diferentes para todas as idades. Isso é muito legal, não é, mãe?” O delator brilho nos olhos continua lá. Meu menininho foi encantado como eu tantos anos atrás. E eu tive a sorte de me sentir de novo como aquela garotinha do passado. Obrigada, filho.
Cidade da Criança Rua Tasman, 301, Jardim do Mar, São Bernardo do Campo, tel. (11) 4330-6998, cidadedacriancasbc.com.br; 3ª/dom 9h/17h; entrada gratuita; atrações R$ 5 (tíquete avulso) e passaporte R$ 35, adquirido na bilheteria ou com antecedência no site do parque); estacionamento R$ 10; Cc: M, V
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