Balões na Capadócia

O cenário digno da superfície de um planeta inóspito no centro geográfico da Turquia

Por Rachel Verano
Atualizado em 16 dez 2016, 09h16 - Publicado em 12 set 2011, 11h49

Cinco e meia da madrugada. O céu ainda escuro e o vento do início da primavera excitam os que ali estão, naquela planície aberta. Em silêncio, alguns turcos começam a inflar dezenas de globos coloridos com chamas poderosas. Meia hora mais tarde, nos falta o chão. A quase 2 mil metros de altura, o silêncio só é quebrado pelo vento suave que nos faz quase tocar os picos que surgem no percurso. A região da Capadócia, vista do balão, é ainda mais estranha. Uma sucessão de formações surreais que se erguem abruptamente a 40, 50 metros de altura, planícies emolduradas por rochas avermelhadas, vales ondulados que se estendem até onde a vista alcança. Um cenário digno da superfície de um planeta inóspito. Agora, ao amanhecer do dia, fica todo pontilhado de gigantescos balões.

Entre as cidades de Kayseri e Nevsehir, exatamente no centro geográfico da Turquia, as montanhas cedem espaço a planícies que, séculos e séculos atrás, foram varridas por sucessivas erupções de vulcões hoje extintos. Como resultado, a tufa uma rocha extremamente porosa, cobriu toda a região. O vento e a chuva cuidaram do resto. Enormes esculturas ao ar livre assumiram formas de animais, de chaminés, de cogumelos, de grandes gotas. Dentro delas, homens construíram casas, mosteiros e igrejas, alguns com mais de mil anos de história. Há inclusive cidades inteiras subterrâneas que podem ser visitadas, como Derinkuyu, hoje um complexo de túneis de oito andares que chegou a abrigar uma população de 10 mil pessoas nos primeiros séculos depois de Cristo, um verdadeiro formigueiro humano.

Ainda há casas – e até mesmo hotéis – esculpidas na pedra. Os meus dias de Beth Flintstone foram passados no Museum Hotel, numa suíte climatizada recortada numa encosta debruçada sobre o vale da cidadezinha de Uçhisar. Aos pés das pequeninas janelas rasgadas na montanha, eu relaxava em day beds, sofazões cobertos de almofadas, de onde tinha a vista perfeita para o pôr do sol que tingia de vermelho as ondulações improváveis daquela imensidão coberta de oliveiras.

Os primeiros registros da região da Capadócia são do século 2 a.C. Mas foram os cristãos, que estiveram por ali entre os séculos 4 e 11, os autores dos grandes monumentos locais. Eles podem ser vistos no Museu a Céu Aberto de Goreme, um parque que reúne singelas igrejas e mosteiros esculpidos no interior de grandes rochas. Há capelas dedicadas a Santa Catarina, Santa Bárbara e São Basílio (o santo local, nascido em Kayseri). Mas a mais impressionante delas é a Igreja Karanlik, ou Igreja Escura, recheada de belíssimos afrescos de temas bíblicos.

As paisagens de jeito lunar da Capadócia são tão desconcertantes que devem ter ajudado nos mitos que elevaram São Jorge, nascido ali no século 3, a ser uma celebridade de diferentes religiões – do cristianismo ao candomblé. O mártir tornou-se rapidamente um dos maiores ícones de devoção no Oriente Médio e depois em todo o mundo ocidental, entre dragões, subidas à Lua e outras passagens heroicas.

CAVA-TE, SÉSAMO!

Há 100 mil anos a paisagem da Capadócia se resumia a um mar de vulcões. Tempos depois, o solo virou tufa, uma rocha fácil de esculpir. No século 4, veio o homem e começou a escavar, construir abrigos – e morar. Não demorou muito para que ali surgissem igrejas em pleno período Bizantino (395-1453). Hoje, o Museu a Céu Aberto de Goreme guarda cerca de 30 delas, como a impressionante Igreja Karanlik com afrescos bem preservados. Veja abaixo os pontos imperdíveis do lugar

1. Igreja de Çarikli

Os afrescos reproduzem imagens dos quatro evangelistas do Novo Testamento – Mateus, Marcos, Lucas e João – e de passagens da vida de Cristo, como seu nascimento e batizado no Rio Jordão

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2. Igreja de Santa

Catarina Aqui você encontra nas paredes nichos usados como túmulos. Santa Catarina, São Basílio, São Teodoro e – claro – São Jorge estão representados

3. Igreja Karanlik

Conhecida como Igreja Escura, por praticamente nenhuma luz externa penetrá-la, é considerada a mais bonita da Capadócia por seus bem preservados afrescos bizantinos

4. Igreja de Yilanli

A cobra (yilanli), que dá nome à igreja, refere-se ao afresco em que São Jorge enfrenta a… cobra. O imperador romano Constantino está representado em um dos afrescos ao lado da mãe

5. Igreja de Santa Bárbara

No domo está Cristo, em tons ocre, sentado em um trono. Repare na imagem de São Jorge montado num cavalo enfrentando o dragão

6. Igreja de Elmali

Os afrescos representam imagens de santos, bispos e mártires. À direita do altar, uma cena da Última Ceia

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7. Igreja de São Basílio

Logo na parede da entrada há pequenos nichos que serviam como túmulos. Os afrescos representam Cristo, São Basílio e São Teodoro – os dois últimos, santos locais

8. Mosteiro de Kizlar

O mais interessante neste antigo convento, que chegou a abrigar cerca de 300 freiras, são os intrincados túneis, escadas e corredores

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