Imagem Blog Além-mar Rachel Verano rodou o mundo, mas foi por Portugal que essa mineira caiu de amores e lá se vão, entre idas e vindas, quase dez anos. Do Algarve a Trás-os-Montes, aqui ela esquadrinha as descobertas pelo país que escolheu para chamar de seu
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Portugal: uma nova onda de restaurantes japoneses premiados

De repente, um boom. De repente, duas estrelas Michelin. De repente, um pouco menos de saudade de São Paulo

Por Rachel Verano
Atualizado em 1 dez 2022, 17h49 - Publicado em 30 nov 2022, 06h07

Digo sem risco de estar cometendo uma injustiça: Portugal nunca foi terra de bons restaurantes japoneses. Quando morei aqui pela primeira vez, entre 2005 e 2008, sashimis e nigiris eram artigos raríssimos. Me lembro apenas de um nome ecoar em Lisboa: Estado Líquido, que já nem me lembro se fui uma única vez ou nunca. Era chique demais para o meu bolso recém-chegado a terras europeias. Soube depois que havia outros nesta época, mas eu nunca tinha sequer ouvido falar. Corta.

Nigiri: peça da culinária japonesa com base de arroz, fatia de peixe braseado e algas por cima
Nigiri braseado do chef Paulo Morais, no Kanasawa. (Bruno Barata/Reprodução)

No dia 22 de novembro, a gala do Guia Michelin da Península Ibérica anunciou cinco novas estrelas para Portugal na edição de 2023. Cinco restaurantes estrearam na constelação da publicação. Surpresa geral: das três estrelas de Lisboa, duas foram para japas (e uma para o vegetariano do chef José Avillez, o Encanto). As outras duas foram para o Porto. De repente, dois restaurantes japoneses com estrela Michelin em Portugal. Um país onde reina a cozinha portuguesa, onde os estrangeirismos ainda são recatados e algo raros. Agora, cada vez menos.

O sushimen Paulo Morais, com uniforma branco de cozinheiro, mostra uma grande peça de atum
O português Paulo Morais em ação no seu Kanazawa, premiado com uma estrela Michelin. (Bruno Barata/Reprodução)

É inegável que os restaurantes japoneses pipocaram por todo o país nos últimos anos – especialmente em modo fast food. Também é fato que os endereços de qualidade hoje já não são nada raros. Quando conheci o agora estrelado Kanazawa, em 2018, eu morri de amores – leia aqui o texto onde o classifiquei como o melhor japonês do (meu) mundo. Numa loja quase imperceptível em Algés, o sushiman (português, coisa rara ainda hoje!) Paulo Morais preparou delicadezas espetaculares do outro lado do balcão que acomoda apenas 8 pessoas – a capacidade máxima da casa.

Chef prepara o matchá, chá japonês, macerando os ingredientes em uma cumbuca
Matchá macerado na hora no Kanazawa. (Bruno Barata/Reprodução)

O menu, harmonizado com saquês, vinhos e um matchá macerado na hora, ainda dança na minha memória com suas texturas surpreendentes, combinações idem e peixes fresquíssimos. Durante a pandemia, as noites especiais em casa eram comemoradas com take-aways do Kanasawa, e a mesa se enchia de cores, hashis e alegria entre quatro paredes. Era a chance de comer as criações do Paulo a um preço acomodável no dia a dia (os menus degustação variam de € 60, o vegetariano, a € 150 por pessoa).

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O outro japonês estrelado nessa edição do Michelin, o Kabuki Lisboa, eu conheci em janeiro deste ano, logo depois que a casa abriu nas galerias do Hotel Ritz Four Seasons, com a proposta de fusão das cozinhas japonesa e mediterrânea. Num ambiente super cool e badalado, com um balcão de seis metros de comprimento onde me sentei, vi desfilarem pecinhas espetaculares e delicadas no menu degustação. Eu costumo torcer o nariz para japas que incluem foie gras e trufas no menu, mas estava tudo tão delicado que deixei me rendi.

Drink do bar do restaurante japonês kKabuki, servido em um copo de cerâmica e coroado com uma espuma e pétalas de flor
Drink do bar, criado especialmente para a casa. (Bruno Barata/Reprodução)
Bento box com pequenas comidinhas no Kabuki
Bento com delicadezas do Kabuki. (Bruno Barata/Reprodução)
Duas peças de nigiri do Kabuki
Nigiris do menu degustação do Kabuki. (Bruno Barata/Reprodução)

Entre nigiris de ovo de codorna com patê de trufas pretas, de wagyu, toro al pastor e tartares variados, merece destaque a carta de vinhos e os incríveis coquetéis criados no bar, estrategicamente posicionado na entrada da casa (onde também é possível pedir ostras, caviar ou pickles para acompanhar).

Na semana passada eu fui ao Porto e, ao pesquisar novos restaurantes, encontrei boas referências acerca de mais um japa, o Tokkotai, por ora sem nenhuma estrela. Alegria geral quando descobri, quase às 22h, que a casa só fecharia às 2h da manhã naquele dia (é assim de quinta a sábado, quando um DJ anima o ambiente). A chegada é pelo izakaya, o bar que tem uma carta de coquetéis especiais.

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Sushimen trabalham atrás do elegante balcão de madeira do Tokkotai
Sushimen em ação no Tokkotai, no Porto. (Bruno Barata/Reprodução)
Prato de atum picante servido como cannoli, numa espécie de canudinho enrolado
Cannoli de atum picante do Tokkotai. (Bruno Barata/Reprodução)

Qual não foi a minha surpresa quando descobri que a casa é uma recriação fiel do Nakka, de São Paulo (com unidades nos Jardins e no Itaim). Os idealizadores do Tokkotai importaram – literalmente – o conceito do Nakka, inclusive trazendo 15 pessoas da casa paulistana para o Porto (de sushimen a garçons). A proposta da casa é conduzir a uma “viagem por Tóquio, São Paulo e Porto”.

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Salão do restaurante Tokkotai, com piso de madeira e jardim atrás
Um dos muitos ambientes do Tokkotai. (Bruno Barata/Reprodução)
Sobremesa feita de banana, com sorvete e chantilly no restaurante Tokkotai
Crumble de banana: happy end do Tokkotai. (Bruno Barata/Reprodução)

A cozinha, mais uma vez, tem vertente contemporânea e abre espaço para ingredientes como clorofila, trufa e foie, com louvor. Começamos com um delicioso cannoli de atum picante, terminamos com um crumble de banana. Fui embora com uma vontade louca de voltar.

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