Imagem Blog Olha o mundo, filho! Ana Claudia Crispim achou que Cinquenta Tons de Cinza definiria a segunda metade da sua vida, mas hoje tem na cabeceira um exemplar de Criando Meninos – o que não quer dizer que tenha desistido de encontrar um Christian Grey. Aqui, ela escreve cartas sobre os seus lugares favoritos do mundo para o pequeno Nando.
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Um tour etílico no Centro Histórico de São Paulo conduzido por um morador

A proposta era entrar em cinco bares e tomar cinco drinks (vai vendo). Não ficamos só nisso: teve coxinhas apimentadas e café da manhã no day after

Por Ana Claudia Crispim
Atualizado em 6 mar 2022, 08h00 - Publicado em 1 mar 2022, 15h40

Filho, vou te contar. Dia desses te deixei com teu pai e resolvi curtir a noite. Sim, filho, as mães, sejam elas casadas ou, como no meu caso hoje, solteiras, também saem, bebem, se divertem e vez ou outra até perdem a linha. E sem os filhos. Em 2022 ainda somos julgadas por isso. Espero que aí no futuro as coisas sejam diferentes.

Meu programa: ser guiada como se fosse uma turista num roteiro etílico na minha, na sua São Paulo. O meu host foi um grande amigo, o Rodrigo Azzolin, curitibano meio ranzinza, motoqueiro, ex-arquiteto, marketeiro, ridiculamente apaixonado por drinks e viagens, um cara que trocou a zona oeste de São Paulo, onde morou por anos, por uma temporada sem data pra acabar pelo Centro.

A proposta era andar por cinco bares e tomar no mínimo cinco drinks. Topei.

Saímos numa noite quente a pé pela Avenida São João, aquela cantada por Caetano Veloso só que não na esquina com a Ipiranga e, sim, com o Largo do Arouche. Lá fomos nós ao encontro de bebidinhas e comidinhas em lugares clássicos e alternativos da noite do centrão. Detalhe: ainda tinha a Covid-19 e, ainda que vacinados, usávamos máscaras e por isso evitamos lugares lotados. Queria saber o desfecho disso aí no futuro.

– Filho, se você for menor de idade ou tiver algum problema com álcool, pare aqui e vamos conversar. Ou então siga e vamos conversar anyway.

Bartender usando máscara respiratória prepara bebidas no balcão de bar iluminado em contraste com o ambiente escuro
Térreo Bar, início da noite num climinha bom! (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

Começamos pelo Térreo Bar, no Largo do Arouche, que tem mesas numa área externa. Por estar vazio, decidimos pegar um lugar no balcão do salão intimista, com iluminação indireta, estrutura metálica e piso de asfalto. A pergunta que guiou as escolhas da noite veio do meu guia: doce, amargo ou cítrico? Cítrico, minha resposta. E fomos nas escolhas dele, o que se repetiu durante a noite. Ele foi de Neném da Várzea, um drink refrescante (Bourbon, Fernet, limão, gengibre e angostura), e eu de New York Sour (bourbon, limão siciliano, xarope e vinho Malbec). 

Duplas de fotos. Na primeira uma bebida branca embaixo e manchada de vermelho por cima. O outro copa mostra um líquido cor de laranja.
Os dois primeiros copos fotogênicos da noite (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

– Começava ali uma mistura etílica com 0% de compromisso com o day after, algo muito adolescente para dois jovens senhores nascidos na década de 1970. Não aconselho. Mentira, às vezes pode.

Torre de concreto, acondiciona bebidas no centro do balcão do Regô bar.
Regô, underground fabricado? Sim. Bonito? Também. (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

A segunda parada foi no Regô, na rua Rego Freitas, o confort bar do meu concierge, um lugar modernão com paredes de concreto aparente, esquadrias de metal e um balcão em forma de U cercando uma torre de bebidas. Não estava superlotado, mas foi o lugar com mais gente que entramos. Por eu ser uma “coxinhólatra” raiz, procurei abstrair da tensão de haver uma semi-aglomeração e me atraquei na deliciosa porção de mini coxinhas apimentadas. Na sequência, segui a sugestão do meu companheiro de viagem: pão com ovo de gema mole sobre cama de pesto e um sanduíche de salmão. O Luís, um dos sócios, fez para o Rodrigo uma bebida à base de rum e um tempero que nunca saberemos se era semente de dill ou coentro, parece que era um tal de Listo. Eu fui de uma releitura de pisco sour, o white lady (gin, triple sec, limão siciliano e xarope).

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Duplas de fotos: Sanduíches de ovo frito decorados com cebolinha picada e duas bebidas, sendo a que está em primeiro plano parecida com o Pisco Sour
Ovo molinho e o pisco sour sem pisco, só sour (Ana Crispim/Arquivo pessoal)
Pão coberto com fatia se salmão crúu.
Qualquer coisa coberta com salmão: vai ter no céu (Ana Crispim/Arquivo pessoal)
Dupla de fotos: Coxinha mordida em primeiro plano, teto do bar ao fundo. A segunda foto mostra uma fileira de coxinhas num prato longo, branco
Coxinhólatras saberão apreciar estas imagens. As fotos não estão grande coisas, mas as coxinhas apimentadas estão aprovadíssimas! (Ana Claudia/Arquivo pessoal)

– A comida deu uma falsa ilusão de “tá tudo bem, agora que comemos podemos beber até bater a meta da noite”. Errados. Erradíssimos!

Cavaquinista no palco do Jazz B
Jazz B, shows intimistas (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

Pulamos para o Jazz B, drinks ok, embora a frequência chegue ali mais sedenta pela boa música das bandas de jazz, blues e apresentações de artistas solo, como naquela noite em que um cavaquista deu um belo show. Não se sabe o porquê, mas meu parceiro pediu dois drinks, mesmo o primeiro não tendo impressionado. Embarcou nos clássicos Negroni (gin, Campari, vermute e laranja) e Cosmopolitan (vodka, limão tahiti, suco de cranberry e licor de laranja). Eu, fraca pra bebida, enfiei o pé na jaca e pedi um Aperol Spritz (aperol, prosecco, água com gás).

– Começava ali um descida ladeira abaixo e nos dedicamos a fazer uma sessão de selfies, registrando passo a passo o álcool em diversas versões passeando pelas nossas veias.

Duplas de fotos: bebidas vermelhas sobre mesa de madeira rústica
Acho justo escolher as bebidas seguindo uma paleta de cor… (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

Terminando o show, seguimos pro Fel, que fica no famosíssimo Copan. Lugar pequeno, charmoso, com um clima meio melancólico. A espera era grande. Os caras estavam rígidos com regras de pandemia, ponto pra eles. Desistimos, ficou pra próxima. Pra quem quiser conhecer, a trilha sonora é de músicas de outras décadas e a carta tem drinks clássicos, sem muita modinha.

Continuamos nossa excursão a pé.

Teatro Municipal, iluminado na noite paulistana.
Teatro Municipal, nostalgia na noite paulistana (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

Lá pelas tantas tocamos para o badalado Bar dos Arcos. O lugar fica no subsolo do Teatro Municipal, bem no coração do Centro paulistano, uma lindeza nostálgica sem fim. Eu cheguei a ouvir o jingle do Mappin que ficava bem em frente.

Sempre tem fila. Já era madrugada e deve ser por isso que ficamos pouco tempo esperando no bar do Salão Dourado, que fica no térreo. Meu roteirista não deixou por menos na espera, tomou um Boulevardier, irmão do Negroni (Bourbon, vermute, campari e laranja). Eu me abstive e dei só uma bicadinha na tentativa de me manter sóbria enquanto via a madrugada paulistana emoldurada pela janela do salão, uma viagem!

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Duplas de fotos: Janela do salão dourado do teatro municipal, emoldura cena nostálgica do centro. Na segunda foto, um copo com bebida amarela, Boulevardier
Uma espera agradável com moldura e o Boulevardier, irmão do Negroni (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

Descemos ao subsolo com arcos em tijolos e fundações de pedra. Um lugar lindamente decorado com mesas e balcões iluminados, poltronas vintage, cantinhos inusitados e luminosos hipsters.

Em primeiro plano, como ponto de fuga: mesa de vidro iluminada. Pessoas ao fundo da imagem e arcos de tijolos no teto sobre as mesas.
Os arcos, as mesas… Lugarzão (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

Já não estava lotado, o que nos deu o luxo de escolher um lugar no balcão e colar numa bartender, a Gabriela, que cuidou dos nossos últimos drinks da noite, nossa e dela, praticamente fechamos a casa. Eu fui de Mary Fisher (rum branco, suco de abacaxi, xarope de cereja e licor de cereja ao marrasquino) e ele não faz a maior ideia do que tomou, pelo menos temos uma foto pra provar que era bonito.

Dupla de fotos: bebidas em tom âmbar sobre mesa iluminada e jarra de água com a frase: "Água sempre pura é produzida...em respeito ao meio ambiente".
Os drinks mais caros do rolê. A água era de graça, acho (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

No balanço da noite, achei que precisava bater a meta (a do meu amigo de bar já estava estourada) pedindo um clássico que nunca tinha tomado: Dry martini. Parecia uma ótima ideia, não era.

– A estas alturas, minha maquiagem estava ficando derretida, eu parecia um panda e já tínhamos virado aqueles bêbados fofos, que se abraçam, dizem que se consideram pacas e falam sem filtro.

Copo de bebida em primeiro plano com casal em segundo plano. Ao fundo, ambiente do bardos arcos.
Breacos e posers com energia para fotografar na luz e nos ambientes instagramáveis do Bar dos Arcos ()

Fiz meu pedido solenemente, num tom James Bond levemente alcoolizado: “Moça, quero um Dry martini, mexido e não batido!”. Tomei e pedi mais uma azeitona. Esta segunda azeitona, sei não… O mundo girou. Pagamos a conta (indecente) e fomos andando, rindo e ouvindo um imaginário O bêbado a equilibrista pelas ruas vazias.

Eu capotei no sofá do meu host. O dia seguinte veio e cobrou seu preço. Justo. Mas ainda tivemos a dignidade de terminar nosso programa de óculos escuros e “agraciados” pelo mau humor matinal do meu anfitrião. O lugar foi A Botanista, a um pulo da Praça da República, uma mistura de loja de plantas, café e restaurante, uma delicia. Não teve álcool, só cafeína.

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Latte macchiato na casinha que parece de vó
A Botanista: latte macchiato no copinho com cara de vó no lugar com vibe idem. Cadê você, dona Maria? (Ana Crispim/Arquivo pessoal)
Mistura de café, lojinha e floricultura.
Fofura em forma de café, lojinha e floricultura (Ana Crispim/Arquivo pessoal)
Capuccino de respeito e aquele pão com requeijão
Capuccino de respeito e aquele pão com requeijão “crrrôcânntê” por fora e cremoso por dentro (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

Filho. Eu indico fortemente que você, acima de tudo, quebre padrões – e que se deixe levar por um morador do lugar, seja numa cidade pelo mundo ou num bairro de São Paulo, que por si só tem várias cidades dentro de uma. É uma bela experiência de viagem.

E tenha bons amigos. Se puder, viaje com eles. E não beba demais, deixe para ocasiões especiais. Te amo, pequenino.

Registros de uma noite de bar de uma amizade nascida num ambiente corporativo startupeiro com puffs e videogames, recreio dos jovens nos anos 2000. Neste dia constatamos: puffs são para jovens sem dor nas costas, não era nosso caso.
Recordações da noite de bar em bar, da amizade nascida num ambiente corporativo startupeiro com direito a pufes e videogames (recreio dos jovens nos anos 2000). Ah, e ambos estamos de acordo que reuniões em pufes são para jovens sem dor nas costas, o que não é o nosso caso. (Ana Crispim/Arquivo pessoal)

[Leia mais sobre viagens y otras cositas da vida de uma mãe 360º no meu Instagram @rivotrip.oficial]

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