Relato de um mergulho SEM JAULA com mais de 50 tubarões (entre eles 20 temidos tubarões-touro)

Uma preocupação de cada vez. Em meio a uma correnteza insana, pular do barco e agarrar a corda guia era a prioridade. E depois conseguir descer sem ser arrastada, até chegar ao fundo ( 18 metros de profundidade), onde o mar é menos irrequieto. Eu ainda estava nesse “processo de ancoragem” quando me vi num tête-à-tête com um tubarão-limão de três metros de comprimento. Não é um animal agressivo, mas ele tende a ser curioso e, não fosse o guia cutucá-lo com um gancho, teria me dado uma bitoca de boas vindas. “Woooooow, isso vai ser mais tenso do que eu imaginava”, pensei.
E o que eu imaginava? Acho que não tinha parado para pensar. Toda a propaganda em torno do mergulho em Beqa Lagoon, ao sul da ilha de Viti Levu, nos arredores da capital de Fiji, Suva, deixa bem claro o que rola: “o mergulho mais extremo com tubarões”.
Isso é o que eu quero dizer com “fiquei tonta de tanto trânsito de peixe”
Na parte de cima da foto, os mais escuros são os giant trevallys, que enlouquecem quando as iscas são liberadas e peitam os tubarões

Estacionamento de rêmoras (aqueles peixes que “grudam” nos tubarões), esperando os chefes terminarem de almoçar. Não é muito surreal?
O mergulho com tubarões em Beqa é bem diferente de uma imersão normal. Ao invés de nadar, o grupo precisa “ancorar” no chão e ficar bem pianinho, tentando chamar o menos possível a atenção dos animais. Quem toma a dianteira é a insana equipe do dive center AquaTreck, que dispõe de alguns toneis recheados de pedaços de atum para atrair os bichos, e vai alimentando o “cardume” pouco a pouco. Em alguns momentos, eles são obrigados a dar um chega pra lá nos mais gulosos, com cutucões e tapas (eles não têm proteção nenhuma! Os “homens do gancho” protegem apenas os turistas!), como quem diz “sai pra lá, meu!”.
A presença de sete tipos de tubarões está garantida em grande quantidade (algumas traduções são literais e não sei se exatamente precisas): tubarões de pontas pretas (blacktip reef sharks), tubarões de pontas brancas (whitetip reef sharks), enormes tubarões-lixa (tawny nurse sharks), gigantescos tubarões-limão (sicklefin lemon sharks), tubarões-cinza (grey reef shark), os magníficos tubarões de pontas prateadas (silvertip sharks) e os temido tubarões-touro (bull shark). Com sorte, um majestoso, temido e glorioso tubarão-tigre (o verdadeiro rei dos mares) pode aparecer. Mas não foi o caso.
Pode parecer ridículo falar de peixes quando se tem mais de 50 tubarões ao redor, mas a verdade é que a quantidade de outras espécies que pegam carona nesse mergulho já valeria a empreitada. Em certos momentos, cheguei a ficar tonta com tanto “trânsito” na minha frente. Impressiona, também, a agressividade e o tamanho surreal dos giant trevallys (nem ideia de como se traduz, porque não existe no Brasil), que foram os que deram mais trabalho aos “homens do gancho”.
O pacote da Aqua Treck inclui duas imersões de meia hora ou um pouco mais cada uma (U$ 160). Na primeira, confesso que tive uns momentos de muito medo. E ainda tive que me estressar com um imbecil que insistia em enfiar uma Go Pro na minha cara (sendo que o brilho das Go Pro é célebre por atrair tubarões), me obrigando a deferir alguns socos subaquáticos. Na segunda imersão, bem longe do débil mental da Go Pro, consegui relaxar e gozar. O vídeo abaixo é da segunda imersão. Ele mostra o “homem do gancho” posicionado à minha esquerda e dá uma ideia da coisa. Repare, na marca do 1m59, a outra quase bitoca que levei de um tubarão-limão (e no meu berro seguido de risada nervosa).
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=6R36kSMk-7U?feature=oembed%5D
A prática de atrair tubarões com isca para efeitos recreativos é polêmica. Alguns cientistas criticam, dizendo que isso pode alterar o comportamento dos animais. Outros defendem, porque afinal de contas é uma maneira de controlar a população de animais de determinada zona, ficar de olho nos caçadores de aleta e conscientizar os turistas sobre a importância dos tubarões na cadeia alimentar. Me falta base científica para ter uma opinião formada. Mas a prática me parece mais positiva do que negativa. Afinal de contas, como diz o conservacionista Jean-Michel Cousteau (que entrevistei recentemente e, em breve, vou postar a entrevista na íntegra aqui no blog): “Ninguém quer proteger aquilo que não conhece de perto”.
Vai lá: A base da Aqua Treck fica no lindo e tranquilo Pacific Harbour, uma região cheia de mansões e hotéis caros. O achado do milênio foi um quarto lindo e barato, instalado na mansão espetacular de uma jornalista fijiana, a Cakau, casada com um arquiteto neozelandês – e o casal tem uma filha samoana e um filho suíço, ambos adotados. Das pessoas mais interessantes que conheci em Fiji e uma das casas mais bem decoradas em que já estive, recheada de obras de arte asiáticas. Clique aqui para ver o link no amado AirBnb. Aaaah, posso voltar e ficar pra sempre?
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