Grécia para experts: ilhas sem muvuca
Conheci alguns dos lugares mais lindos e menos turísticos da Grécia por causa de um desses males que vêm para o bem. Era uma pacata tarde de setembro na remota ilha de Antipaxos, onde o único rastro de civilização é uma taverna no canto esquerdo da praia, onde ancoram as lanchas que trazem alguns gatos pingados. Enrolada em uma canga estampada com a bandeira do Brasil (tudo o que eu tinha para me cobrir naquele momento), eu tentava, entre mímicas, onomatopéias e lágrimas, explicar para a dona da biboca que tinha sido suficientemente estúpida para perder o barco que me levaria de volta a Paxos (e, consequentemente, a lancha que me levaria a Igoumenitsa onde pegaria o ônibus a Atenas, a última pecinha do dominó). E suplicava se ela podia fazer algo por mim. Obviamente em vão. Foi quando ouvi uma voz do além… “Você é brasileira? Precisa de ajuda? Eu falo grego!”. A partir deste encontro milagroso, meu novo intérprete iniciou uma mobilização que resultou, finalmente, em dois lugares em um outro barco para que meu namorado e eu, sem um tostão, conseguíssemos chegar pelo menos até Paxos. As passagens a Igoumenitsa e Atenas foram perdidas, para desespero de nossos orçamentos de mochileiros. Mas foi graças a esse mico que passamos a tarde enchendo a cara no porto de Paxos com esta santa criatura chamada Décio De Brong Mattar (que ainda por cima pagou a conta!) o maior entendido de Grécia do Brasil, autor do Guia Grécia. Aos 53 anos, este oftalmologista de São Paulo já foi 30 vezes à Grécia e conhece mais de 100 ilhas, além de boa parte do continente. Cerveja vai, cerveja vem, Décio nos deu dicas preciosas e reformulou nosso roteiro de viagem. Segui os seus conselhos cegamente, e graças a ele, fui parar em três paraísos: Koufunissia, Folegandros e Milos, que apesar de ficar no arquipélago das Cíclades, pertinho de Santorini e Mykonos, ainda não foram descobertas pelo turismo de massa.
Paxos (a ilha onde encontrei o Décio): É dureza dizer qual é o tom de azul mais bonito das ilhas gregas. Mas arrisco dizer que o de Paxos é hors concours. Suas praias são revestidas por pedras brancas como mármore, que compensam a falta de conforto com uma água azul piscina que está mais para Caribe do que para mar Jônico. Quase não dá para acreditar que essa jóia de apenas 2500 habitantes está a uma hora de barco rápido desde Corfu, a cidade mais turística da região. Seu coração é a vila de Gaïos, um porto ultra charmoso, com casinhas coloridas da época em que a ilha foi dominada pelos venezianos, e bares badalados (pero no mucho), onde ricaços gregos e italianos costumam atracar os seus iates para curtir o verão com calma e elegância. Saindo de lá, a ilhota é um mar de olivais (dizem que o azeite local é o melhor do país) que separam uma praia quase deserta da outra. Quem enjoar do barulhinho gostoso do mar fazendo as pedras rolarem pode pegar um barquinho até Antipaxos, a sua irmã ainda mais secreta que tem duas praias de areia branca e fofinha. A hospedagem, porém, é escassa e cara. Mas, reservando com muita antecedência, dá pra garantir um bangalozinho no Paxos Beach Hotel, de frente para o mar e pertinho de Gaïos. Fora de temporada, recomendo tentar a sorte com os senhores que alugam quartos. Neste caso, esteja preparado para brincar de mímica, já que o inglês, ou qualquer outro idioma inteligível, é pura utopia.
Koufonissia: Essa ilhota (na foto) tem apenas 250 gatos pingados como habitantes. E praticamente não há estrangeiros por lá. Os poucos turistas são jovens e gregos. Dá pra conhecer todas as suas praias a pé (e mesmo porque não há outra maneira). A partir do porto, segue-se para a praia de Fínikas, de onde sai uma trilha para as outras. O caminho é maravilhoso, com piscinas naturais entre as pedras de água absolutamente cristalina. Entre uma e outra você passa por praianhas minúsculas de pedrinhas redondas. E no final do percurso, chega-se a uma praia que, para mim, é uma das mais bonitas da Grécia: Pori, uma baía fechada de areias prateadas. No final da tarde, um ótimo programa é pegar um barco até Kato Koufonissia, uma ilhota totalmente desabitada ali perto, para comer em sua única taverna. Ela está meio caindo aos pedaços, mas a comida é boa e o visual compensa. À noite, todo mundo se encontra no único bar da vila, que fica na primeira rua à direita para quem vem do porto. A balada vai até de madrugada. E depois todo mundo costuma se atirar no mar. O hotel Koufonissia tem uma piscina gigantesca (de água salgada) e quartos super confortáveis (quando fiquei lá, em 2002, o quarto de casal custava 15 euros na baixa temporada… hoje em dia está custando 80! Snif… snif…)Como chegar: ferry de Naxos, Paros, Piraeus (Atenas) e outras ilhas menores.
Milo: Depois que a Vênus do Louvre foi encontrada ali e levada para a França, parece que a humanidade nunca mais quis saber de Milo. Por sua vez, os seus habitantes não estão nem aí para desenvolver o seu potencial turístico. A ilha vive de suas mineradoras, que exploram o seu solo riquíssimo. Enquanto isso, a maioria das praias, estupendas, continuam desertas. Milos ainda conserva cabras pastando, gatos nas portas das casas e praias vulcânicas deslumbrantes. Sarakiniko parece um pedaço de Marte, de pedra branquíssima, com vários túneis com buracos no teto. Papagrafas tem um pouco mais de areia e Naxaina também é linda. Muitas pousadas só abrem no verão, assim como os pouquíssimos restaurantes. Fora de época uma das únicas opções é o restaurante da dona Avratoula, em Plaka, capital da ilha. O site www.milos-island.gr tem dicas de hospedagem.
Como chegar: Ferry de santoniri, Ios, Piraeus (Atenas) e vôos de Atenas pela Olimpic Airways.
Folegandros: A capital da ilha, Hora, é uma preciosidade. Suas pracinhas arborizadas, casinhas brancas com janelas coloridas impecáveis e ruas de pedra quase não parecem de verdade. A ilha também tem fama de gourmet e, de foto, se come muito bem em qualquer um dos restaurantes. A ilha é extremamente árida e montanhosa. E o ser humano teve que ser muito macho pra se alojar por ali. Sabe Zeus porque, mas a ilha é um dos poucos lugares da Grécia onde não tem jeitinho que faça com que as locadoras aluguem moto para quem não tem carteira de motorista específica pra moto (ou seja, que atuam de acordo com a lei, solenemente ignorada em 99% do país. Por isso, se você não for motoqueiro regularizado, prepara suas batatas da perna para caminha e subir ladeiras de cuspir o pulmão. Fiquei, e recomendo, o hotel Polikandia, pertinho do centro. Como chegar: ferry de Paros, Milo, Santorini, Naxos, Piraeus (Atenas) e outras ilhotas.