China: roteiros, quando ir, passeios, hotéis e mais

Por Almir de Freitas Atualizado em 20 mar 2024, 18h24 - Publicado em 21 out 2011, 16h52

Quando o veneziano Marco Polo chegou à China pela primeira vez, em fins do século 13, comerciantes cristãos e árabes já faziam fortuna na Rota da Seda, que desde muito tempo ligava Oriente e Ocidente, apesar das diferenças de raça e religião. Mas ninguém nunca havia contado ao mundo como era realmente aquele país vasto e distante, misterioso até para seu próprio imperador, Kublai Khan, que pouco antes decidira deixar a Mongólia para se estabelecer por ali. Nomeado emissário do soberano, Marco Polo esquadrinhou os domínios chineses por 16 anos, descrevendo um mundo de costumes bárbaros, mas também de maravilhas e riquezas inimagináveis.

Hoje, a impressão que a China provoca no viajante não é tão diferente. Embora a globalização tenha o poder de uniformizar tudo em todo lugar, a China ainda conserva um enigma que só pode ser decifrado se visto de perto – se é que pode ser decifrado. É uma ditadura comunista e uma potência capitalista, e parece saber cultivar o pior e o melhor dos dois mundos. É poluída, congestionada, neurótica – mas em todo canto há alegres grupos dançando nas praças ou reunidos, animados, em torno de fumegantes barracas de comida. Há cidades acolhedoras, como Guilin e Suzhou, e megalópoles futuristas e ricas, como Xangai e Hangzhou. Seus tesouros históricos, em Pequim ou Xian, são tratados com um misto de rigor e desdém – uma contradição que se estende ao seu povo, que, malandro, pode ser muito gente fina. Nos territórios semi-autônomos Hong Kong e Macau, a história chinesa se funde com as marcas da colonização inglesa e portuguesa, respectivamente, dando uma dimensão ainda maior à já imensa diversidade da China.

Como Marco Polo, é fácil se encantar numa jornada China adentro e, como ele, experimentar um pouco a sensação, tão rara, de se sentir à vontade num mundo tão diferente.

QUANDO IR

A melhor época para visitar a China é durante a primavera (de março a maio) ou o outono (de setembro a novembro), quando as temperaturas são amenas. O inverno pode ser bastante rigoroso e é comum nevar, até mesmo em Pequim. No verão, as temperaturas batem na casa dos 30 ºC com frequência. No sul, evita viajar de abril a setembro, época de monções.

COMO CHEGAR

As principais portas de entrada para o país são os aeroportos internacionais de Pequim, Xangai e, fora da China continental, Hong Kong. Não há voos diretos do Brasil. A American Airlines e a United fazem conexão nos Estados Unidos antes de aterrissarem em Pequim. A British Airways faz escala em Londres. A Air Canada voa para Pequim com escala em Toronto. As escalas da Emirates são sempre em Dubai. Para Hong Kong voam, com escala ou conexão, companhias como a Qatar, a KLM e a Lufthansa. Para ir de Hong Kong para Macau, pegue uma balsa da TurboJet, com passagens a partir de HK$ 160 (US$ 20,50), apenas uma perna.

COMO CIRCULAR

Em grandes cidades como Pequim, Xangai e Hong Kong, a melhor maneira de circular é de metrô. Na China continental, tanto nas cidades grandes como nas médias, pode-se abusar dos táxis. Estatais, são seguros e baratos: em Xian, por exemplo, a bandeirada sai por ¥ 8,5 (US$ 1,25) mais ¥ 2 (R$ US$ 0,30) o quilômetro. Para vencer as imensas distâncias entre as cidades, a saída são os aeroportos mesmo – boa ideia é sair do Brasil com os voos da Air China já reservados. 

PASSEAR

O roteiro que se segue compreende alguns dos principais destinos turísticos do país, abrangendo cidades com costumes, línguas e atrações distintas. No meio do emaranhado urbano se acham as frenéticas luzes de neon que colorem e animam as cidades asiáticas; os restaurantes populares, enfumaçados de vapor, ruidosos de gente comendo dumpligs e noddles; garotas vestidas com afinco fashion, baby liss no cabelo, desfilando com suas botinhas rosa-choque; gente curiosa, amistosa, escondida atrás da sisudez; e grupos noturnos enchendo as praças para praticar tai chi chuan ou dançar coreografias ao som de música popular. Todas cenas que, alegremente, se multiplicam China adentro.

PEQUIM: CIDADE PROIBIDA E A GRANDE MURALHA

A primeira parada em Pequim é na Cidade Proibida, sede de governo e residência dos imperadores durante cinco séculos, desde a dinastia Ming. Agora, ostenta no portão principal a foto 3×4 gigante de Mao Tsé-tung, o “grande timoneiro” da revolução de 1949. A fachada-carteirada é o ponto convergente da Praça Tiananmen (“paz celestial”), que reúne os monumentos mais importantes da revolução – o dos Heróis do Povo e o Mausoléu de Mao. Retângulo cercado de um fosso, a Cidade Proibida é fatiada em pátios, que levam a portões majestosos e, além deles, sete grandes salões, 17 palácios e centenas de puxadinhos. A conta fica na casa dos 800 edifícios de madeira vermelho-escuro, com entalhes que desenham milhares de dragões dourados de cinco garras, símbolos imperiais. Entre tantas escadarias de mármore, leões de bronze e ladrilhos trabalhados estão, por exemplo, jardins com palacetes que no passado abrigaram as concubinas do imperador.

Pertinho, também se pode conferir a festa de comida de rua que se repete em toda China, mas aqui com foco no turista. À noite, barracas na Donghuamen Street oferecem, por ¥ 5 (US$ 0,75), espetos de escorpiões (vivos), estrelas-do-mar, bichos-da-seda, gafanhotos, grilos, larvas genéricas, centopeias, morcegos secos, filhotes de pato… Todos a caminho do óleo quente. Sim, há o que comer: lulas inteiras, camarões, lagostins, carnes de porco, vaca e carneiro e frutas, todos no espeto também. Na esquina logo ali, passando a Apple Store, está a Wangfujing Street, calçadão comercial que leva até o pórtico da Wangfujing Food Street – um complexo de vielas decorado com lâmpadas chinesas vermelhas, lotado de gente animada em torno de barracas de comida. O cheiro de óleo e molhos é forte, mas ninguém se importa.

Mais distante, sinais da riqueza advinda do crescimento econômico alucinado do país no início do século são vistos em edifícios exibidos – caso da sede da CCTV, televisão estatal, e do Estádio Ninho de Pássaro e do Cubo d’Água, construídos para as Olimpíadas de 2008. Ou ainda, do Sky Screen – telão de LED de 250 metros de extensão e 30 de largura que serve de teto para o shopping The Place. Em outra parte fica o Templo do Céu, outra realização da dinastia Ming. No centro de uma escadaria circular de mármore está o também circular Qinian Dian, edifício de três pavimentos que se projeta para o alto. Era de uso exclusivo do imperador, para orações; hoje, é cenário preferido para books de casamento. Todos os dias, as noivas estão lá, posando com os seus longos vestidos vermelhos ao lado de seus futuros e impassíveis maridos.

Ponha na lista: o Palácio de Verão, imensa área verde para onde a família imperial fugia do calor infernal da Cidade Proibida; e as tumbas de 13 imperadores Ming, no fim do maravilhoso Caminho dos Espíritos, ladeado de chorões e estátuas solenes. Valem horas de visita.

Só que a ansiedade aponta para outro lugar. Setenta quilômetros a noroeste, vencidos em uma estrada margeada por montadoras de carro e plantações de maçã, chega-se a Badaling, no Condado de Yanqing. Ali fica o trecho mais bem preservado e preparado para receber turistas em busca de uma selfie no que chamamos de “A Muralha da China” – lá, simplesmente, Grande Muralha. A infra para visitantes é de primeira, mas não vá esperando vida fácil. A estrutura aberta à visitação compreende cerca de 4 quilômetros, ao sul e a norte, pontuados por 16 guaritas. Entre elas, degraus ralos e inclinações de até 45 graus mais apropriadas para soldados e cavalos, não para turistas. Os corrimões de metal, instalados recentemente, ajudam, mas em casos dramáticos o melhor é tomar um teleférico já no sopé. Ou embarcar no monotrilho que contorna a montanha. A volta pode ser amena: há passarelas e escadarias modernas ao largo entremeadas de pracinhas e pits de piquenique.

XIAN: GUERREIROS E TERRACOTA E BAIRRO MUÇULMANO

Foi nos arredores de Xian que, no século 3 a.C., o imperador Qin Shihuang fundou o império Qin. Violento, cruel, obcecado pela imortalidade, Qin ordenou a construção do inacreditável e hoje famoso exército de guerreiros de terracota para protegê-lo dos seus muito inimigos no outro mundo. Esquecido durante 2 200 anos, foi descoberto em 1974, quando camponeses, cavando um poço em busca de água, toparam com a cabeça de um soldado de infantaria ainda com os traços de pintura que o coloriam.

O tesouro arqueológico está distribuído em três pavilhões – o principal e mais impressionante reúne os soldados rasos e cavalos em linha de combate. Ao todo, seriam 8 mil peças em tamanho natural. Até agora foram restaurados cerca de 2 mil, que foram encontrados em pedaços. A única exceção é um arqueiro, que, símbolo de sorte, está exposta com honras em uma caixa de vidro. Perto ficam as armas que acompanhavam os soldados e duas magníficas carruagens de bronze.

Mas o maior segredo ainda está para ser desvendado: a tumba do imperador Qin. Posicionada atrás do exército de infantaria, ela segue intacta, lacrada, embaixo de uma colina que lembra vagamente uma pirâmide. Oficialmente, a China espera uma tecnologia que seja capaz de abri-la sem danificar seus tesouros. Mas muitos chineses, supersticiosos como são, juram que a razão é o medo de que Qin consiga, finalmente, enganar a morte e voltar à vida se a tumba for reaberta.

Durante séculos, Xian foi o ponto de partida da Rota da Seda, disputada a canhão pelos mercadores do Oriente Médio e da Europa. Daí que a cidade tenha virado casa de uma numerosa colônia árabe miscigenada. Dentro dos (magníficos) muros da Cidade Velha fica o Bairro Muçulmano, onde se espalha um grande bazar, transbordando de gente e mercadorias. No fim desse labirinto formado de ruazinhas e estreitos corredores fica a Grande Mesquita, toda em arquitetura chinesa. No calçadão anexo, comida. Chinesas vestindo véus pilotam tachos enormes, servindo yangrou paomo (mistura de pão pita e carne de cordeiro, que pode ser servida com noodles), canela de cordeiro para comer como um neandertal, kebabs generosos, sandubas de pernil… nas lojas, uma infinidade de castanhas e nozes, frutas secas, temperos e grãos… e carrinhos com espetos de todas as carnes, dumplings e noodles com massa feita na hora… e doces árabes, cuja massa cozinheiros exibicionistas trançam e socam, com martelos enormes, em plena calçada, no meio do alarido.

No itinerário, anote ainda: Torre do Sino, Torre do Tambor (lindamente iluminados à noite) e Pagode do Ganso Selvagem, no templo onde monges budistas – com a paciência correspondente – rezam diante de cabeças e máquinas fotográficas espichadas porta adentro.

GUILIN: COLINAS DE CALCÁRIO E CAVERNA COLORIDA

Quem deixa Pequim e Xian para trás, cortando o país na direção sul, vê tudo se transformar: o clima úmido e quente, as etnias locais de traços nitidamente distintos e a vegetação tropical colocam o viajante na paisagem do Sudeste Asiático. O aeroporto de Guilin, modesto, combina com o skyline de prédios baixos por força de lei para que o mundo veja a vastidão de picos de rocha calcária cobertos de vegetação que fazem a fama da cidade mundo afora. Se você chegar à noite, pode ver suas imensas e negras silhuetas no horizonte – incluindo a famosa Colina da Tromba do Elefante, um dos símbolos da cidade.

A quaremta quilômetros do Centro chega-se a sua principal atração – a cadeia de picos de calcário cobertos de vegetação que se estende nas duas margens do Rio Li. Se o dia for bom, é possível ver as montanhas refletidas na água em que chineses de chapéus pontudos de palha, ladeados de corvos marinhos, conduzem barquinhos de bambu. Todo dia, de manhãzinha, uma frota de barcos de três andares, com deques panorâmicos, parte para um cruzeiro de quatro horas, com almoço incluído. A brincadeira aqui é achar formas nas montanhas ou na composição delas, vistas de ângulos específicos ao longo do trajeto. O passeio termina em Yangshuo, vilarejo que, na paisagem e na arquitetura, dá uma boa ideia do que seria a “China profunda”, mais autêntica – com a vantagem de ter desenvolvido uma boa infra turística de hotéis, bares e restaurantes.

A geologia calcária da região é responsável por outra atração turística master de Guilin, a Caverna da Flauta de Cana (Ludi Yan). Ali, formações rochosas espetaculares são iluminadas com as mangueiras de LED multicoloridas que se espalham pela cidade. Ampla, esculpida durante milhões de anos pelas infiltrações de água no solo de rocha calcária, a caverna de 250 metros de extensão tem mais um tanto de formas a serem decifradas nas gigantes estalactites e estalagmites derramadas no percurso. Na trip, é fácil ser enganado pelas formas esculpidas pela mão humana desde o século 8, com o talento tipicamente chinês para a falsificação.

De volta à cidade, a boa na noite tropical é aproveitar a brisa à beira do Lago Shanhu, onde estão os lindos pagodes gêmeos do Sol e da Lua, cada um com 40 metros de altura. Da doca saem barcos navegando pelos canais que interligam outros três lagos e dois rios, incluindo o Li. Uma opção é se enturmar por lá mesmo, na pracinha, lugar de shows que fazem a alegria dos chineses, que adoram dançar em grupo ao ar livre – uma cena que se repete em cada cidade da longa jornada.

HANGZHOU: LAGO OESTE E TEMPLO DA ALMA ESCONDIDA

Com cerca de 10 milhões de habitantes, Hangzhou concentra indústrias privadas de eletroeletrônicos e têxteis – é lá que que fica a sede da Alibaba, a gigante do e-commerce. Novos-ricos, à frente das pequenas e médias empresas, não faltam. Os sinais estão em toda parte: nos equipamentos urbanos, nos edifícios, nos carrões e em shoppings centers de luxo, como o imenso Hangzhou Tower, que abriga exclusivamente lojas como Gucci, Cartier, Louis Vitton, Prada, Rolex.

Nessa cidade nervosa pela perspectiva real de ficar milionário está o plácido Lago Oeste, abastecido pelo Rio Qiantang. É o coração da cidade, com 8 quilômetros quadrados entrecortados de pontes de pedras, cercados de alamedas e com vista para templos, pagodes e colinas verdes. Pela Su Causeway, dá pra atravessar as águas cheias de carpas e de flores de lótus; ou de barco, passando por três pagodes pequenos dispostos em triângulo, cada um com cinco aberturas. Em setembro, no Festival de Meio-Outono, lâmpadas dentro deles projetam a luz de “30 luas cheias”, 15 delas refletidas na superfície.

Lindo já no nome é o budista Templo da Alma Escondida, um dos maiores, mais antigos e mais ricos em imagens de Sidarta da China. No entorno dos pavilhões, espalham-se outros cerca de 300 Budas, esculpidos nas rochas, de todos os tamanhos e tipos: em pé, sentado, em posição de lótus, gordo, magro, feliz… Monumento involuntário de tempos sombrios, dá para ver que algumas imagens foram raspadas pelos guardas vermelhos de Mao nos dez anos (1966–1976) da Revolução Cultural, que se ocupou em destruir sistematicamente traços culturais do passado.

Para a lista: os lindos campos de chá-verde de Longjing, onde, dependendo da época do ano, dá para acompanhar a colheita; e o Pagode das Seis Harmonias, maravilhoso mas desarmonioso nos degraus incrivelmente íngremes.

SUZHOU: PONTES DE PEDRA E JARDINS

Na foz de Rio Qiantang desagua outra obra megalômana. Com 1 800 quilômetros de extensão, o Grande Canal é o maior e mais antigo rio artificial do mundo, ligando Pequim – lá no norte – com o Mar da China Oriental. Foi construído no século 7, desta vez com mão de obra arregimentada pela dinastia Sui, para transportar mercadorias.

Das cidades cortadas pelo canal, nenhuma se compara a Suzhou. A apenas uma hora de trem de alta velocidade de Hangzhou, tem quase metade da sua área coberta de água – o que a levou a ser chamada de “Veneza do Oriente”. Grupos de dançarinos noturnos ganham as praças que beiram o canal, e as ruazinhas que se espraiam nesse complexo urbano arcaico, cheio de pequenos restaurantes populares, criam um clima mais amistoso. Não que seja pequena: a cidade tem áreas modernas, que abrigam coisa de 5 milhões de habitantes, muitos trabalhando em gigantes como a Lenovo.

Suzhou é também uma cidade de jardins seculares – são dezenas de, intactos, patrimônios da humanidade pela Unesco. Um dos mais famosos é o Jardim do Administrador Humilde. A arquitetura clássica, que combina pavilhões, pedras, árvores, pontes e lagos, é coisa do século 16. Menorzinho, o Jardim do Pescador (ou Mestre das Redes) reúne os mesmos elementos em miniatura. E é mais antigo – remonta ao século 12.

Mais distante (depois de uma periferia meio feia) fica Huqiu, pagode de 47 metros do século 10 e que, com o tempo, ganhou uma inclinação de 3 graus. A construção fica no topo da Colina do Tigre Branco. Lá, no remotíssimo século 6 a.C., foi sepultado o rei Helu (mais famoso que ele é um dos seus generais, Sun Tzu, o primeiro best-seller da história, com seu A Arte da Guerra). Segundo a lenda, três dias após o funeral, um grande tigre branco postou-se no alto da colina para guardar a tumba do rei.

XANGAI: METRÓPOLE FUTURISTA

A cidade mais populosa do mundo, com cerca de 25 milhões de residentes e mais um par de milhões flutuantes, é um assombro. Com o céu limpo, todos as lentes convergem para Lujiazui, o distrito financeiro na área nova de Pudong. Vista do calçadão do Bund (o cais histórico à beira do Rio Huangpu), a paisagem impressiona tanto de dia quanto de noite, quando os edifícios gigantescos ganham todas as cores asiáticas – um tentando superar o outro em altura, ousadia arquitetônica e megalomania no geral. Entre elas está a Shangai Tower, uma estrutura “torcida” de 121 andares, servidos por elevadores disparados a 18 metros por segundo. Os 632 metros de altura garantem o caneco de segunda mais alta do mundo.

In loco, Lujiazui joga o turista num desenho dos Jetsons. Se os carros ainda não voam, eles podem rodar entre jardins obsessivamente cuidados, à margem de calçadas perfeitas, em ruas impossivelmente limpas. Acima deles, pedestres circulam em um extenso complexo de passarelas largas, que interligam os edifícios-celebridade, restaurantes, praças arborizadas e shoppings. Crianças e marmanjos adoram o Oceanário e a muvucada torre de TV Pérola do Oriente, cujo observatório a 259 metros, instalado num chão de vidro, desafia vertigens. Acima, ainda fica um restaurante 360 graus, giratório, e a Cápsula Espacial, outro ponto de observação, desta vez aproveitando a vibe futurista do conjunto. Um observatório ainda mais espichado é o do World Financial Center, cujo desenho lembra uma sacola comprida. Da alça da “sacola” se veem os pequeninos barcos de turismo navegando no Huangpu e, além, as camadas de tempo da história de Xangai.

Dali, é a vez de ver o skyline do Bund, centro financeiro do século 19 que prosperou na antiga área de concessão britânica. Em contraste, é um choque de estilos. A paisagem é formada por uma fileira de edifícios elegantes – entre eles o art déco Peace Hotel, referência de glamour nos anos 1930, palco de bandas de jazz e celebridades de antanho. Bem na esquina começa a Nanjing Road, calçadão colorido, frenético e superpovoado que vai dar na Praça do Povo e no Museu de Xangai.

Não muito longe fica Yu Yuan, lindo jardim Ming engolfado por um ruidoso bazar pega-turista (segurem carteiras e bolsas). No centro, elevando-se de um lago com gordas carpas, fica a Casa de Chá Huxinting, aonde se chega por uma ponte em ziguezague – estratégia para afastar os maus espíritos, que, segundo os chineses, só sabem andar em linha reta. Por ali fica a Pedra de Jade, oca, com 72 buracos: quando chove, é chafariz mágico; se aceso um maço de incensos dentro dela, é chaminé idem.

O famoso Templo do Buda de Jade fica mais ao norte. Abriga Budas dourados de várias encarnações e duas joias vindas da Birmânia: a primeira, uma pequena estátua de Sidarta, esculpida em uma única pedra de jade. Fica numa sala com plaquinhas com o nome de ricaços, que desembolsam, pelo privilégio, ¥ 50 000 yuans (US$ 7 250) anuais. Talvez por isso, este é um dos poucos lugares da China em que fotos não são permitidas. Em outra sala, a segunda joia do complexo: uma estátua de Sidarta reclinado, cabeça apoiada sobre o cotovelo. Parece estar descansando. Mas não: está morto, no momento de atingir o nirvana.

Mais longe, para os lados do antigo aeroporto internacional da cidade, fica o Zoológico, onde se pode ver pandas mastigando seus bambuzinhos.

HONG KONG: ELETRÔNICOS E PORTOS

Se o viajante vem da China continental, desembarca em outro país: é preciso passar por uma nova alfândega e uma imigração. Mudam ainda o idioma (cantonês), a moeda (dólar de Hong Kong) e as finanças do turista. À diferença das grandes cidades chinesas do continente, serviços como restaurantes, hotéis e transporte são caros por aqui. Para quem não passa sem compras, em compensação, é como adentrar o paraíso: porto livre, isento de pesados impostos de importação, Hong Kong é como um imenso free shop a céu aberto, principalmente para eletrônicos. Legítimos, não falsificados.

Agitada, lotada de gente, Hong Kong um núcleo urbano de camadas de riqueza e de história embaralhadas: torres de aço e vidro disputam exíguo espaço com edifícios residenciais gigantes. Nesse miolo, vão sobrevivendo prédios antigos, cheios de fios enroscados e quase tombando de aparelhos de ar-condicionado pendurados. Apesar de quase nada ter restado da arquitetura colonial, o passado britânico é visível em toda parte – da mão inglesa para os carros ao hábito de tomar chá preto com leite.

Um dos muitos lugares batizados em homenagem à sua majestade da época, o Victoria Peak é um dos sight views mais populares entre os turistas. Do alto dos seus mais de 500 metros de altura, aonde se chega de carro ou a bordo do íngreme Peak Tram, o pico é um oásis no aglomerado urbano, reunindo bosques, jardins bem cuidados, trilhas e represa. Oferece também a oportunidade de enquadrar, magnificamente, os arranha-céus do Central, bairro-sede de bancos e grandes empresas, e os da ponta da Península de Kwoloon, do outro lado da baía, a Victoria Harbour.

Pelos demais portos, baías e quebradas, os roteiros incluem visitas à Causeway Bay, tomada de lojas e gente, à Repulse Bay, um agradável balneário. Ali, de frente para o mar, fica o curioso templo taoísta Kwun Yam, em homenagem a Guanyin (ou Kannon), deusa da misericórdia. Em torno, como um parque de diversões supersticioso, espalham-se estátuas de deidades multicoloridas, todas prontas para atender aos pedidos dos chineses. O conjunto é completado pela pequena Ponte da Longevidade. Quem a cruza, dizem, ganha três dias de vida.

Não muito longe fica Aberdeen, antigo porto onde moram os tankas, subgrupo étnico do sul da China que tradicionalmente vive da pesca e mora nas próprias embarcações. Nessa espécie de cidade flutuante, que reúne cerca de 6 mil pessoas, ficam restaurantes como o imenso Jumbo, instalado num casco de navio. À noite, suas luzes espetaculosas iluminam o porto.

No fim do dia, a boa é rumar para Kwoloon, que abriga hotéis de luxo, restaurantes, mercados de rua e shoppings centers. Entre eles está Whampoa, um centro comercial abrigado num edifício em forma de navio. Fica no meio de uma espécie de bairro privado, o Whampoa Garden, um condomínio gigante formado por 88 torres, a maioria de uso residencial.

Para ir da Ilha de Hong Kong para Kwoloon, basta pegar o metrô ou, melhor, uma das balsas verde-vintage da Star Ferry. Ao lado do píer de Tsim Sha Tsui fica a antiga Torre do Relógio, onde começa a Avenida das Estrelas – calçada da fama para artistas do cinema local, como Wong Kar-Wai, Jet Li e Bruce Lee, que ganhou até estátua. Por ali, nas redondezas do Hong Kong Cultural Centre e do domo do Space Museum, espere até as 20h – é quando começam os 12 minutos da Symphony of Lights, em que o Bank of China, o HSBC e mais cerca de 40 edifícios modernos do outro lado da baía fazem uma coreografia de luzes coloridas. Melhor ainda quando o cenário é completado com um barco tradicional chinês – o junco –, navegando com suas velas vermelhas pelo Victoria Harbour.

E é à noite, de fato, que a atmosfera genuinamente asiática desce sobre Hong Kong. Na Temple Street, acontece o famoso mercado noturno, onde se pode pechinchar por mil bugigangas até a madrugada.

MACAU: CASSINOS E PASTÉIS DE NATA

Após uma hora de barco, 60 quilômetros a leste, a bússola cultural do viajante vira do avesso. Não muito depois de Pedro Álvares Cabral fundear a nau Capitânia em Porto Seguro, comerciantes e jesuítas portugueses chegaram a A-Ma-Gao – em cantonês, “Baía de Amá’, referência ao Templo de A-Má, deusa do céu, ali construído. Na dicção lusitana, o lugar acabou virando Macau.

Mais uma vez, é preciso apresentar o passaporte para ingressar nessa outra Região Administrativa da China. Foram 450 anos de ocupação portuguesa, que se refletem nas placas públicas bilíngues – em português e cantonês –, na gastronomia que fusiona as cozinhas lusitana e chinesa e, ao contrário de Hong Kong, numa arquitetura colonial persistente. Em alguns lugares, é como estar em Lisboa; em outros, em Paraty ou Ouro Preto.

Perto do píer fica uma das atrações mais visitadas – as ruínas de São Paulo. Da Igreja Madre de Deus, erguida no século 16, resta apenas a fachada barroca, de granito, imponente no alto de uma extensa escadaria. Anexo, fica o Museu de Macau e a Fortaleza do Monte, com seus canhões apontados para o mar que trazia piratas e invasores holandeses de olho no valioso entreposto comercial.

A próxima parada é o movimentado Largo do Senado, na Sé. O calçadão, feito de familiares pedras portuguesas brancas e pretas, abriga prédios históricos como a Santa Casa de Misericórdia e a sede dos Correios, além de lojas chiques e escritórios da administração pública. Em muitos imóveis, a típica azulejaria lusitana. Organizado, o largo contrasta com as ruas próximas, onde a bagunça vista em Hong Kong dá o ar da graça – nos prédios antigos com varandas inteiramente gradeadas, nos fios de ar-condicionado emaranhados e, aqui, em uma profusão de scooters estacionadas nos becos.

Para completar o mix cultural da paisagem, adicione uma extravagante pitada de Las Vegas. Pequena, com cerca de 600 mil habitantes, Macau tem uma economia que depende quase que inteiramente do turismo e dos seus famosos cassinos, os únicos em toda a China. Parte dos cafonérrimos complexos hoteleiros dedicados à jogatina se concentra perto da Baía da Praia Grande, onde está o tradicional Lisboa e o Grand Lisboa, projetado na forma de uma flor de lótus estilizada. É o maior prédio local, com 258 metros de altura. Mas perde nesse quesito para a Torre de Macau, cartão-postal com 338 metros, do lado oposto da baía. Ali fica o spot de bungee jump comercial mais perto do céu, a 233 metros.

Em que pese a visível herança colonial, é difícil encontrar moradores que falem português, hoje uma língua em extinção em Macau. Mas resta mais que arquitetura e ruínas para o macauense se sentir próximo da gente lusitana. Em especial, na gastronomia. Nos restaurantes, acham-se bacalhau mergulhado em azeite, arroz de pato e pratos temperados com curry picante de Goa. Existe até uma versão local da feijoada, feita com feijões-brancos ou vermelhos. Mas os chineses, locais e de fora, não resistem mesmo é aos doces. Tudo saboreado, preferencialmente, com um cafezinho, bebida que só em Macau é capaz de rivalizar com o chá na China.

ONDE FICAR

As principais redes hoteleiras, de luxo inclusive, estão em todas as grandes cidades da China continental, por preços bem camaradas se comparados a outros países. Em Pequim, dá para aproveitar os mimos do Four Seasons no distrito de Chaoyang, onde ficam boa parte das embaixadas e representações estrangeiros no país. Mais no Centro, há opções como o Renaissance e o Novotel Beijing Xin Qiaon. Em Xian, perto do Bairro Muçulmano, o Ibis Xi’an é uma pechincha, mas, com uma forcinha, dá para seguir aproveitando o conforto de hotelões como o Shangri-lá. Em lugar mais tranquilão fica o moderno Swisstouches. Em Guillin, estiloso com seu jeitão anos 40, o Lijiang Waterfall fica a dois passos da agitação do Lago Rhongu e da praça central. O Sheraton, perto do Rio Li, tem um charme mais contemporâneo. Em Hangzhou, o hotel-bola InterContinental Hangzhou dá bem pra matar a vontade de gastar. Se não, a dois quarteirões do Rio Qitang fica o Hangzhou Ramada. Na animada Suzhou, o bem localizado Holliday In Jasmine oferece visão panorâmica da cidade, e o Tonino Lamborghini Boutique Hotel, de frente para o Rio Jinji, tem jardim chinês com pagode no centro. Já em Xangai, luxo é ficar no Park Hyatt Shangai, um dos hotéis mais altos do mundo. O Radisson Blu Hotel Shanghai New World, por sua vez, também tem ótima vista da cidade de seu Sky Dome Bar. Preste atenção quando for Hong Kong, onde os preços sobem sensivelmente. Para os lados de Whampoa Garden, o Harbour Grand Kowloon tem ótimo custo-benefício. Entre as opções de luxo, o The Peninsula, perto do píer de Kwoloon e de frente para o Victoria Harbour, é lendário. Em Macau, o programa jogatina & cama pode ser feito no Grand Lisboa.

ONDE COMER

Típico da Pequim, o pato laqueado pode ser provado em restaurantes como o Hua’s ou em redes como a Quanjude. E há ainda os petiscos exóticos (mas alguns nem tanto) nas barracas da Wangfujing Food Street. Em Xian, colado à Torre do Sino, o Defachang (3 West St., Lianhu) conta com centenas de opções de dumpling. E não dá pra passar por Xian sem provar uma das iguarias vendidas no Bairro Muçulmano – no mínimo, um doce árabe. Prato típico da região de Guillin, o noodles de arroz pode ser conferido em casas como a Chong Shan MiFen Yi Ren Lu Dian (QiXingQu Yi Ren Lu 5Hao) e a modernona Pingji Rice Noodles Pub (142 Walking Street, Zhengyang Road). Em Hangzhou, rume para uma das unidades do The Grandma’s, sempre cheio. Na Shilu Street de Suzhou, restaurantes populares servem boa, farta e barata comida chinesa – coisa de US $ 10. Se não apetecer, sempre haverá um fast-food local como o Master Kong Chef’s Table. Em Xangai, um dos melhores restaurantes é o 100 Century Avenue Restaurant, no 91º andar do Park Hyatt, que mistura comida chinesa, japonesa e ocidental. No multissensorial Ultraviolet by Paul Pairet, apenas dez pessoas de cada vez podem degustar o divertido menu de 20 pratos. Hong Kong conta com o restaurante mais barato do mundo estrelado pelo Guia Michelin, o Tim Ho Wan, que serve concorridas porções em cestos de bambu, os dim sum. Baratinhos também são os noodles do muvucado Tak Fat Beef Balls (Haiphong Rd., em Kwoloon). Com dinheiro no banco, experimente o Amber, no hotel Mandarim Oriental, considerado o melhor restaurante da cidade e um dos melhores de toda Ásia por causa de sua sofisticada cozinha francesa. Em Macau, não deixe de ir à Koi Kei Bakery provar os doces portugueses – biscoitos de amêndoa e nozes, doces de caju e de coco, pés-de-moleque e os imbatíveis pastéis de nata, na região chamados egg tart.

DOCUMENTOS

Brasileiros podem tirar o visto nos consulados de São Paulo e do Rio de Janeiro para a China Continental. A autorização tem validade de três meses e é válido para uma única entrada – não é possível, por exemplo, sair de Pequim e ir para Hong Kong e voltar para Xangai, o que contaria duas entradas em razão do regime especial da antiga colônia britânica, que têm imigração e alfândega próprias. Em Hong Kong e em Macau não se exige visto de brasileiros para uma permanência de até 90 dias, mas – assim como China continental – exigem certificado internacional de vacinação contra a febre amarela.

DINHEIRO

Na China continental, a moeda oficial é o yuan (CNY), e exige atenção do turista: todas têm a face de Mao Tsé-tung ( ¥ 10 = US$ 1,46). Em Hong Kong, vale o dólar local (HKD), HK$ 10 = US$ 1,28), e, e Macau, a pataca (MOP), com cotação semelhante (MOP $ 10 = US$ 1,25), mas os dólares de Hong Kong são os mais usados.

Informações ao viajante

Línguas: Mandarim, cantonês e outros idiomas locais. O inglês é limitadamente compreendido nas maiores cidades, mesmo em Hong Kong, ex-colônia britânica.

Como ligar para o Brasil: 108-550

Embaixada oficial no Brasil:
SES, Av. das Nações, Q. 813 – Lote 51- Brasília, DF
(61) 2195-8200


https://br.china-embassy.org/por/

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