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De José Ignácio a Punta del Diablo: um tour no litoral do Uruguai

Para muito além da badalada Punta del Este, a região litorânea do Uruguai reserva surpresas para quem quer calmaria

Por Rafael Tonon
Atualizado em 11 fev 2020, 15h43 - Publicado em 20 dez 2017, 17h25

Atualizado em fevereiro de 2020

É quando as temperaturas começam a subir que o litoral uruguaio ganha uma aura luminosa. Os 660 quilômetros de costa do nosso diminuto vizinho também têm seu charme nas estações mais frias. Mas as quatro das cinco maiores cidades do país que são banhadas pelo Atlântico Sul – e onde mora mais da metade da população do país – ganham um jeito especial no verão.

Até agosto, os ventos gelados espantam turistas, donos de estabelecimentos e moradores. Com os raios mais intensos do sol surgindo, temperaturas na casa dos 25°C e brisas providenciais, as águas não chegam a ficar quentinhas, mas as praias ganham outro colorido. O mar fica mais azul, os dias se estendem pela noite, os banhistas ficam até altas horas na areia.

Em Punta del Este, na exata ponta em que o Atlântico faz esquina com o Rio da Prata, uma horda de visitantes – entre muitos e muitos e muitos argentinos, brasileiros e paraguaios – invade a península, em busca de um lugar ao sol. É gente pra caramba. A cidade, que conquistou fama de ser badalada e cara, ainda é o destino preferido, até por ser a mais preparada para atender ao enorme fluxo local na estação mais quente.

Restaurantes, mercados, comércio: tudo ali é pensado para dar conta da altíssima temporada. Mas se engana feio quem acha que o verão uruguaio se resume aos agitos de Punta del Este. Há opções muito bacanas litoral afora para quem prefere um poquito de quietude.

Refúgio hippie chic

O Parador La Huella, restaurante premiado (Divulgação/Divulgação)

A partir de Punta del Este, estão algumas das praias mais bonitas do Uruguai. A pouco mais de 30 quilômetros da península, o vilarejo de José Ignácio virou destino cool, sobretudo para turistas mais abastados. O lugar é calmo, tudo é rústico pero com toques de sofisticação. Há poucas pousadas, alguns hotéis de luxo, grandes casas, restaurantes, lojinhas.

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Antes um povoado de pescadores, a extensão de praia não é muito convidativa a banhos de mar por causa das muitas rochas. Mas, com o Farol de José Ignácio ao fundo criando uma linda paisagem de cartão-postal, tem um charme danado. O farol, com 26 metros de altura, foi construído, em 1877, pra impedir naufrágios nas águas agitadas. Uma subida na torre dá a dimensão de quão ermo é o vilarejo – os últimos censos indicam que o número de moradores não passa de 500.

Lugar pequeno, mas cheio de atrativos que valem a viagem. Um dos melhores restaurantes do Uruguai, por exemplo, fica ali. O Parador La Huella que costuma aparecer na lista dos 50 melhores da América Latina, segundo a revista inglesa Restaurant, é uma construção pé na areia toda de madeira, onde os destaques são os frutos do mar feitos impecavelmente sobre a brasa.

É a tal rusticidade com sofisticação que está em tudo por ali. Da cozinha, saem polvos, lulas à la plancha, peixes inteiros e vegetais cozidos no calor do fogo. Bem acompanhados de clericot e garrafas geladas de vinho branco e rosé (locais, por supuesto). O serviço é eficiente, e o preço, bom para a qualidade.

Os campos de O’33 (Divulgação/Divulgação)

Depois de um almoço farto, hora de dar uma caminhada pelo centrinho, com seu charmoso comércio, e até atravessar para o outro lado, no sentido da Calle Los Horneros, em que há poucos pescadores e quase nenhum movimento. A contemplação é sempre um ótimo digestivo. Também há passeios a cavalo, já que o vilarejo é cercado por áreas planas, lagoas e jardins. Nos próprios hotéis ou nos haras próximos, como o Godiva, dá para alugar cavalos.

Se a ideia for seguir uma rota gastronômica, há uma finca na Ruta 9 em que é possível fazer uma degustação guiada de azeites, além de uma visita às oliveiras, que encontraram terreno fértil no Uruguai, hoje um dos maiores e melhores produtores do óleo na América do Sul. Fabricados na região, os blends da O’33 levam varietais que se adaptaram ao solo e ao clima de José Ignácio, como a italiana Frantoio e a espanhola Arbequina.

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Passeios por fazendas

Moinhos de Vento de Maldonado (Rudimencial/iStock)

De carro, quase obrigatório para conhecer bem a região, é possível fazer desvios, se afastar rapidamente da praia, e mergulhar em uma paisagem diferente. O interior do Uruguai é rural, com pastagens e estradinhas de terra com moinhos de vento modernos. É por eles que se chega a Juana V, propriedade de um casal de franceses que decidiu fazer de Maldonado sua morada, comprou a antiga fazenda próxima à Laguna del Sauce e, hoje, oferece almoços e jantares exclusivos a grupos e casais que visitam a região.

A cozinheira e charcutièrie Florence Lamarre prepara tudo. Das sensacionais linguiças artesanais (a merguez, de cordeiro, é inesquecível!) até o leve crepe de doce de leite. “Cozinhamos com o que temos no dia. Os alimentos vêm da nossa fazenda, então não posso prever exatamente o que será o menu”, diz ela. Mas temos sempre carnes, pescado e opções de vegetais.

Há outras fazendas marítimas na região a que se pode fazer visitas. Na área de Manantiales, a Narbona Punta del Este pertence a um conhecido produtor de vinhos e doces de leite que tem também um vinhedo, restaurante e hotel em Carmelo, perto de Colônia de Sacramento. Ali, as antigas picapes para entrega de leite dão as boas-vindas aos visitantes, que podem comprar iogurtes, queijos e até temperos. Há ainda uma cave com vinhos próprios, entre tintos (da local Tannat), brancos e rosés. Para passeios, cavalos, campo de golfe e bicicletas.

Praias para todos

Vista da cidade de La Paloma (Marcelo Campi/Flickr)

Quanto mais ao norte, mais calmaria. La Paloma, a principal cidade do departamento de Rocha, tem jeito de balneário dos anos 1980. Comércios familiares, pousadas simples, topografia plana boa de percorrer a pé… A principal praia, La Balconada, é a mais frequentada e leva a fama de ter o pôr do sol mais bonito do litoral colorado. Como no Arpoador carioca, os visitantes aplaudem quando o sol se esconde atrás do horizonte. Não longe dali, a região do farol é onde começou o vilarejo: tem as moradias mais antigas ao longo da Bahía Chica, de frente para Ilha La Tuna.

Na avenida principal Nicolás Solari, no Centro da cidade, é onde La Paloma pulsa. Estão ali cassino, restaurantes, bares, sorveterias e lojas de artesanato. A Confitería Mi Paloma é uma ótima parada para comprar os famosos bizcochos locais.

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E um passeio ótimo por ali é pela Laguna de Rocha, espelho-d’água de 70 quilômetros quadrados separado do mar por uma faixa de areia com uma incrível diversidade de aves (flamingos, garças, gaivotas, entre muitas outras), que aproveita os ambientes de água doce e do mar para se alimentar – não à toa a área foi declarada Reserva da Biosfera, pela Unesco.

Barquinhos, em Punta del Diablo (Ana Raquel S. Hernandes/Flickr)

Mais ao norte ainda, a pouco mais de 45 minutos da fronteira com o Brasil, outra punta conquista os viajantes dispostos a desbravar o litoral uruguaio. A Punta del Diablo é uma vila de pescadores que virou ponto turístico relevante. Tem restaurantes animados, comércio pulsante, pubs, boliches e baladas famosas, como a Bitácora, que reúne milhares de pessoas. É o lado B da sua irmã quase homônima, uma punta mais uruguaia, jovem, alternativa e desencanada.

A punta de chinelos, como bem definiu um amigo. Durante o dia, as praias são tranquilas, com uruguaios e seus mates, alguns deles se aventurando nas ondas. Na Playa del Rivero e na Playa de los Pescadores, barquinhos ajudam a compor o clima. À noite, o agito aparece, mas só para os mais boêmios.

Para os que não buscam noitadas, há restaurantes à beira-mar, como os da Playa de la Viuda, onde se pode comer bem (os frutos do mar e os pescados à la plancha e os famosos bolinhos de alga locais) e tomar bons tragos (da nossa caipirinha à caipiananás, feita com abacaxi).

Em Cabo Polônio, tem comida boa, casas rústicas e farol famoso (iAudioguide/Flickr)

Mas, se foi a ideia do “sossego” estampado lá no título desta reportagem que te trouxe até o final deste texto, é melhor parar no meio do caminho entre Punta del Diablo e La Paloma: ali está Cabo Polônio, vilarejo dentro de um parque nacional em que só veículos autorizados circulam. Para chegar, é preciso sacolejar por meia hora nos caminhões que cruzam os arenales.

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Não há água corrente nem luz elétrica e as ruas são todas de areia. É exatamente esse lado rústico que atrai turistas do mundo inteiro – há australianos, visitantes de toda a América e muitos europeus. O clima de lugar intocado aumenta com os leões-marinhos deitados nas rochas e os enormes bancos de areia.

No Cabo Polônio, corre uma máxima que diz que é difícil entrar, mas mais ainda querer sair – principalmente os que chegaram em busca de uma autêntica e tão rara quietude.

Onde ficar

Vista da charmosa Estancia Vik (divulgação/Divulgação)

Punta del Este é a cidade com estrutura maior, base para alguns bate e volta para outras praias. Há hotéis com boas tarifas, como o San Diego, bem na península. Em José Ignácio, a Estancia Vik fica num casarão de arquitetura espanhola, com paredes de adobe, clima rústico sofisticado e obras de arte. Em La Paloma, o UY Proa Sur Hotel vive no Centro, onde é possível fazer tudo a pé. Em Punta del Diablo, a Hosteria del Pescador tem clima de campo e quartos para duas a seis pessoas.

Onde comer

A cozinha do El Garzón, do chef Francis Mallmann (Divulgação/Divulgação)

Embora os melhores restaurantes estejam em Punta del Este (caso do La Bourgogne e do Cuatro Mares), há opções de boa comida em qualquer vilarejo – os uruguaios são muito ligados ao hedonismo glutão, mas sem muita firula. Existem casas que valem os deslocamentos. Em Garzón, o chef argentino Francis Mallmann montou sua cozinha no El Garzón, baseado nos preparos que advêm do fogo – há ainda um hotel no local.

O salão com jeito de casa de fazenda é a moldura perfeita para o trabalho de um dos melhores cozinheiros da América do Sul. De suas brasas e chamas, saem tanto os cortes de carne dos animais criados nas planícies do país (entre cordeiros e bois) como também preparos de vegetais que surpreendem pelo sabor.

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O que fazer

No verão, há várias programações na Fundação Pablo Atchugarra, como apresentações de dança e de música (Divulgação/Divulgação)

No departamento de Maldonado, a Fundação Pablo Atchugarry reúne obras de diversos artistas, como o escultor que dá nome ao local (com peças feitas em mármore), em mais de 15 hectares de área para visitação. Em qualquer parte do litoral que se esteja, vale a visita a esse museu a céu aberto. No verão, há sempre programações, como apresentações de dança e de música. Outro passeio imperdível é pelo Parque Nacional de Santa Teresa, que fica no departamento de Rocha, acessível pela Ruta 11 e uma das áreas verdes mais preservadas do país.

Além de matas, há quatro praias para serem visitadas, mas o principal atrativo é a Fortaleza de Santa Teresa – construída em silharia de pedras pelos portugueses, em 1762, contra um possível ataque espanhol. É uma construção que impressiona pelas dimensões. Assim como o Jardim Botânico, que está dentro do parque: com rosedal, sombráculo e piscina de água fluvial, reserva espécies de todos os continentes, entre peixes, plantas e rosas – somente de flores, são mais de 300 tipos.

Quando ir

Em setembro, a temperatura aumenta. A alta temporada é no verão, quando as cidades chegam a quadruplicar seu fluxo. A procura faz os preços aumentarem, então feche hospedagem com antecedência. No fim de janeiro e após o Carnaval, as praias acalmam.

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