La Paz

Por Adrian Medeiros Atualizado em 4 jul 2019, 17h51 - Publicado em 26 out 2011, 15h30

El Alto, a cidade onde está localizado o principal aeroporto da Bolívia, não tem esse nome por acaso. Localizada a 4 mil metros de altitude, é dela que se tem a primeira visão de La Paz: um vale cercado de montanhas em que despontam milhares de casebres de cor ocre dispostos em vielas que serpenteiam morro acima.

Por ser o lugar em que vive a parcela mais pobre da população paceña, não é uma visão exatamente bonita – assim como está longe de ser alvissareiro o posto que a Bolívia ocupa como o país mais pobre da América do Sul. Nada disso, no entanto, interfere no prazer que é visitar uma das Sete Novas Cidades Maravilhosas do mundo, já eleita pela fundação New7Wonders, e, de quebra, um dos destinos mais baratos da América Latina.

O deslocamento de El Alto até os 3 650 metros onde está La Paz, a capital federal mais alta do mundo, é quase vertical e, na descida, o desconforto causado pela altitude (que pode dar enjoo e tontura aos que chegam) arrefece um pouco. Desce-se, geralmente, de táxi, num trajeto que pode levar de 30 minutos até duas horas, a depender do trânsito. Desde 2014, há um jeito mais cênico: a bordo de um teleférico, que chega à região central da cidade em meia hora.

No Centro, os imóveis são um pouco mais bem-acabados, há bonitas construções coloniais e um certo vigor comercial. É lá também que a cultura andina resiste de forma notável. Nas ruazinhas de paralelepípedo, cruza-se com as folclóricas e adornadas cholas, senhoras de origem indígena, geralmente com cabelo trançado e vestidas com coloridas saias – invariavelmente sete, uma por cima da outra.

O pequeno Centro está concentrado ao longo da Avenida 16 de Julho, que, logo depois da Universidad Mayor de San Andrés, se transforma na Avenida 6 de Agosto. A região mais movimentada de La Paz, contudo, é na Praça São Francisco, que leva esse nome devido à igreja homônima – um dos mais belos exemplos do barroco boliviano. No local funciona o Centro Cultural e Museu São Francisco. Na Calle Sagarnaga, concentram-se as principais agências de turismo, em que é possível contratar passeios pelos arredores da cidade.

Ao longo das calles Melchor Jimenez e Linares, acontece o Mercado de las Brujas, lugar indicado para comprar suvenires como cerâmicas, roupas e folhas de coca para fazer chá – um alento aos que sofrem do mal de altitude. Chamam a atenção, pendurados, fetos de lhama, usados em ritos e “brujarias”. Quem busca produtos, digamos, diferenciados deve procurar a L.A.M., loja especializada em roupas de lã de alpaca – tanto o preço quanto a qualidade são bem altos. Também no Mercado de las Brujas fica o Museu da Coca, pequena casa que conta a importância da folha na cultura boliviana.

A três quadras da Praça São Francisco fica a Plaza Murillo, marco zero da cidade, onde estão o Palácio Quemado, sede do governo, o Congresso Nacional e a Catedral Metropolitana. Fica ali também o Museu Casa Murillo, antiga casa do líder da independência boliviana – morto e enforcado na Plaza de Armas (atual Praça Murillo) -, com notável acervo de móveis, pinturas e peças de prata que datam do período colonial.

Mas, para sair desse trecho infestado de turistas e sentir melhor o clima de La Paz, vale caminhar até o peatonal – calçada fechada para automóveis – localizado em frente à Universidade de San Andrés. Ali o visitante poderá entrar no restaurante Api Happy, na Plaza del Estudiante, e provar um api – bebida típica do Altiplano Boliviano à base de milho roxo – acompanhado de uma ou várias empanadas.

Pechinche, Pechinche

Pegar um táxi em La Paz já é, por si só, uma aventura: você para o carro, anuncia seu destino e torce para que o motorista aceite a corrida – ele pode simplesmente fechar a janela e sair rodando. Se ele topar, vai dizer o preço – sim, não há taxímetro. Importante: qualquer que seja o valor, não aceite de cara, negocie – faz parte da cultura local a pechincha, seja no táxi, seja na compra de um artesanato.

A boa notícia é que o que já é barato fica ainda mais em conta: La Paz é uma das capitais mais econômicas da América do Sul.

 

Mucho Gustu

Sanduba de chola na Plaza de Las Cholas (Felipe Abreu/Viagem e Turismo)

Tudo muda na Zona Sur, onde vive a elite local: os carros são melhores, e as casas, assinadas por arquitetos. Lá fica o Gustu, projeto do chef e restaurateur dinamarquês Claus Meyer, um dos idealizadores do Noma, restaurante eleito quatro vezes como o melhor do mundo pela revista Restaurant. Claus ainda trabalha no Noma ao lado de René Redzepi, mas fez da Bolívia sua segunda casa.

Mas por que La Paz? “Vim de férias pra cá e, ao ver crianças pobres nas ruas, minha filha, que tinha 5 anos na época, perguntou por que eles não tinham o mesmo que ela. Decidi ajudar de alguma forma”, contou Meyer à VT. Iniciou-se, então, o projeto Melting Pot Bolívia, um movimento gastronômico de valorização da cultura, dos ingredientes e dos cozinheiros bolivianos.

Os chefs do Gustu, Kamilla Seidler e Michelangelo Cestari, nos levaram para conhecer um dos braços do projeto que qualifica quem trabalha com comida de rua. Provamos as empanadas tucumanas de dona Sofia, feitas com massa mais leve e geralmente frita, na Avenida Montenegro, em San Miguel, entre as calles 21 e 18. Também comum em outras culturas andinas, o choripan aqui faz sucesso, sobretudo no Mercado Lanza, onde dona Elvira ganhou fama servindo o sanduíche de linguiça com molhos variados nos pães tipo sarnita e marraqueta.

Mas não há nada mais clássico da cultura de rua paceña que o sanduíche de chola: entre as fatias de pão, uma fartura de carne de pernil suíno com cebolas condimentadas em vinagre e pimenta, molho ají amarelo, servido com porçãozinha de chicharrón, espécie de torresmo. O melhor lugar para provar o lanche é na Plaza de las Cholas, na Zona Sur.

O Gustu é uma experiência gastronômica e tanto. A truta fresca levemente defumada é estupenda. As carnes de alpaca e lhama são imperdíveis. A amarga raiz de cacto servida no menu degustação dá um toque de exotismo. Seja à la carte, seja nos menus de cinco ou sete etapas, a experiência marca. A decoração do lugar é despojada, sem afetação.

 

Neve no verão

Tiwanaku - La Paz, Bolívia
O sítio arqueológico de Tiwanaku é tombado pela Unesco (Danielle Pereira/Flickr)

Em boa parte da cidade são onipresentes os grandes montes cobertos de neve da Cordilheira dos Andes. Uma das montanhas é a Chacaltaya, um pico de 5 421 metros em que funcionava a estação de esqui mais alta do mundo e que está a 30 quilômetros de La Paz. O passeio até lá pode ser contratado em uma das muitas agências localizadas ao longo da Calle Sagarnaga e é vendido casado com uma visita ao Valle de la Luna – local que recebeu esse nome devido à paisagem árida e às formações rochosas curiosas.

A subida de 400 metros até o primeiro cume é fácil, leva cerca de meia hora e deve ser feita a pé, mas é importante ir com calma, pé ante pé, devido aos efeitos do ar rarefeito. Os que sobem ao Chacaltaya querem, invariavelmente, ver neve, mas nos últimos anos sua quantidade vem diminuindo drasticamente no topo da montanha. Entretanto, por incrível que pareça, é durante o verão, quando há mais chuva e a umidade é mais alta, que existe maior possibilidade de nevar.

Pouco mais distante, a 72 quilômetros de La Paz, mais uma joia boliviana, esta construída pelo homem: Tiwanaku. O sítio arqueológico foi erguido e habitado pelo império de mesmo nome desde, calcula-se, 1500 a.C. O auge dessa civilização aconteceu entre 300 e 1000 d.C., sendo antecessora do poderoso Império Inca – muitos dos simbolismos incas têm suas raízes em Tiwanaku. A visita pode ser livre (vans levam até o local e, ali, dá para caminhar sozinho pelo sítio) ou, mais recomendável, com guias turísticos que fazem o transporte a partir de La Paz.

 

Lago Titicaca

Ilha do Sol, Bolívia
Isla del Sol (Reprodução/Reprodução)

Copacabana fica a menos de quatro horas da capital do país. A cidade é pequena e, no Centro, ao longo da Avenida 6 de Agosto, estão localizadas as principais hospedagens (cuidado: na alta temporada, entre dezembro e fevereiro, elas costumam lotar). Da mesma Avenida 6 de Agosto, no fim dela, surge o mais famoso cartão-postal de Copacabana, o Titicaca, o maior lago navegável do mundo – são 8 300 quilômetros de extensão.

O destino de todos ali é a Isla del Sol, cujo acesso é feito pela porção norte, em que as trilhas reservam paisagens encantadoras – a mais bela delas é a que passa pela Rocha Sagrada, que, de acordo com as lendas locais, foi de onde Manco Capac, rei de Cusco, e sua mulher, Mama Ocllo, saíram para fundar a civilização inca, no século 11.

É comum o turista fazer um bate e volta até a Isla del Sol, mas é altamente recomendado passar ao menos uma noite na ilha, de preferência na casa de moradores. Se tiver com tempo, dê um pulo no Museu Arqueológico de Challapampa, na parte norte, que reúne peças com significativo valor arqueológico.

O lago é também habitat natural das trutas que são servidas nas rústicas barraquinhas à beira do lago – vale provar todas as receitas possíveis. A cidade também é palco de um curioso ritual aos domingos: os bolivianos adornam seus carros (novos e antigos, com um quê daquele charme sessentista que ocupa as ruas de Havana, em Cuba) com arranjos e pétalas de flores para serem abençoados pelo padre na frente da Igreja de Nossa Senhora de Copacabana, numa cerimônia conhecida como “bendición de movilidades”.

 

Estrada da Morte

A Estrada da Morte, em Coroico (Felipe Abreu/Viagem e Turismo)

A via historicamente conhecida como Camino a los Yungas recebeu a mórbida alcunha de “Estrada da Morte” nos anos 1990, quando o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) a apontou como a mais perigosa do mundo. Na época, cerca de 300 pessoas morriam a cada ano em acidentes de carro. Os seus 66 quilômetros ainda são um dos desafios mais radicais a qualquer ciclista, mas os tempos mudaram: até 2007, ela era a única ligação entre a capital federal e a cidade de Coroico, com tráfego nos dois sentidos. Hoje, uma estrada novinha, asfaltada, é a principal rota que sobe o precipício em direção a La Paz.

O fundamental nesse passeio é contratar uma agência. Nem pensar fazer o trajeto sozinho. Com estrutura, guias, bicicleta de boa qualidade e equipamentos de segurança, os aventureiros sobem até La Cumbre, a uma altitude de 4 700 metros, para iniciar a descida, que, nos primeiros 31 quilômetros, é em estrada pavimentada – aqui os perigos são a alta velocidade (chega-se a mais de 50 km/h) e a presença constante de caminhões.

Muitos motoristas descem o sinuoso caminho mais devagar que as bicicletas e, em alguns trechos, é preciso ultrapassá-los. É pura emoção: a adrenalina sobe a mil, o zumbido do vento assobia forte nos ouvidos e o vento gélido deixa o rosto e os dedos dormentes. Depois de um início tenso com os caminhões, dá pra relaxar e curtir o visual: a estrada desce ziguezagueando por lindas montanhas nevadas.

Lá pelas tantas, a descida fica mais íngreme e o asfalto dá lugar à pista de terra estreita – em certos trechos, a largura é de 3 metros. De um lado, paredões; do outro, pirambeiras que podem chegar a 600 metros. Se antes a paisagem era montanhosa e com picos nevados, nesse trecho é selva. O downhill tem de ser feito à esquerda, quase colado aos paredões, porque não é raro topar com algum carro subindo no sentido contrário, às vezes a mil. Entra aqui a destreza de manter a bike na estrada entre o carro e o abismo. Mas esse nem é o maior motivo de acidentes: segundo um dos guias do nosso grupo, o principal risco é o ciclista se deslumbrar com o visual e perder a atenção na estrada.

Quanto mais se desce, mais a temperatura sobe. Se, nos primeiros quilômetros do trajeto, os vários casacos nunca são suficientes para aplacar o frio, o caminho abaixo vai obrigando a tirar, uma por uma, as camadas de roupa. De cima a baixo, no total, a descida é de 35 quilômetros, e o tour encerra-se em Coroico – vivos, e agraciados com uma bela cerveja gelada do boteco providencialmente localizado no fim da trilha.

Viagem distante a um mundo de sal

Para quem está em La Paz, a esticadaça até o Salar de Uyuni – maior deserto de sal do mundo – leva no mínimo 18 horas.

Lá, o roteiro tradicional de três dias (a dica é contratar os passeios com as agências locais, presencialmente) leva ao cemitério de trens que transportavam metais preciosos para o exterior, aos gêiseres, que jorram água fervente, às lagunas, repletas de flamingos (o ponto alto é a Colorada, com sua incrível coloração vermelha)…

E, claro, aos 10 mil quilômetros quadrados brancos de sal bruto do deserto. Dá pra dar uma espiada também no Deserto de Dalí, que recebeu esse nome porque a paisagem teria influenciado um quadro surrealista do artista catalão.A boa notícia é que o que já é barato fica ainda mais em conta: La Paz é uma das capitais mais econômicas da América do Sul.

Guia VT

 

Ficar

No confortável Stannum Boutique Hotel, as janelas ocupam uma parede inteira de cada suíte, dando vista para os Andes. O Casa Grande Hotels tem 36 quartos upscale na Zona Sur, onde ficam os bairros residenciais mais modernos. Em conta, o albergue Wild Rover Hostel tem diárias mais acessíveis.

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Comer

Os pastéis do Api Happy (Plaza del Estudiante) são uma boa para pegar e levar. Refeições incrementadas são no Restaurant Gustu, com menu degustação.

Passear

Com a Turismo Bolívia Peru, dá para fazer os passeios até o Lago Titicaca, o sítio arqueológico de Tiwanako e o pico andino de Chacaltaya. Especialistas na Estrada da Morte de Coroico, a Gravity e a Madness têm saídas para esse passeio todos os dias.

Comprar

As lojinhas de suvenir do Mercado de las Brujas são uma boa para comprar lãs de alpaca. Na L.A.M. (Calle Sagarnaga, 295), as roupas são mais exclusivas.

Prepara!

 

Quando ir

La Paz é mais bacana de visitar nos fins de janeiro e de agosto, após as épocas de chuva

Dinheiro

Peso boliviano

Línguas

Espanhol, Quíchua e Aimará

Fuso

-1h (horário de Brasília)

Saúde

Exige certificado internacional de vacinação contra febre amarela

Documentos

Brasileiros não precisam de visto por 30 dias. Tanto o passaporte quanto à carteira de identidade (RG) são aceitos para entrar no país

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