Imagem Blog Achados Adriana Setti escolheu uma ilha no Mediterrâneo como porto seguro, simplificou sua vida para ficar mais “portátil” e está sempre pronta para passar vários meses viajando. Aqui, ela relata suas descobertas e roubadas
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Direto de Banda Aceh, a cidade que (quase) desapareceu do mapa

Por Adriana Setti
Atualizado em 27 fev 2017, 15h44 - Publicado em 3 fev 2013, 14h35

Lumba Lumba Dive Center, em Pulau Weh: sobrevivente do tsunami de 2004

Na manhã do fatídico dia 26 de dezembro de 2004, um grupo de mergulhadores hospedados no resort de mergulho que se vê na foto acima – onde passei a última semana – saiu de lancha para fazer uma imersão. O destino era a ilhota de Rubia, nos arredores da ilha de Pulau Weh (onde fica o resort), que por sua vez está a uma hora de barco de Banda Aceh, ao norte da Sumatra, na Indonésia.

Uma vez embaixo d’água, ouviram um estrondo ensurdecedor. Imediatamente, dezenas de moreias saltaram simultaneamente de seus esconderijos entre as pedras. Os peixes pareciam desorientados, nadando em direções aleatórias em movimentos descompassados. Diante da estranheza do cenário, o grupo decidiu interromper a imersão. Na superfície, encontraram um cenário de horror.

Milagrosamente, o barco de mergulho ainda estava lá. Mas, no caminho de volta ao resort Lumba Lumba Dive, se deram conta de que todos os alojamentos das praias de Gapang e Iboih, que concentram os poucos turistas, estavam embaixo d’água. Ou melhor, imersos num redemoinho de escombros que girava em fúria, como uma grande máquina de lavar roupa. O jeito foi procurar abrigo em alto mar por algumas horas, até que a maré retrocedesse.

De volta à terra firme, em meio ao cenário de destruição total, veio o alívio: aparentemente todos em Gapang haviam sobrevivido ao maior desastre natural dos nossos tempos, graças ao relevo montanhoso da ilha, que permitiu que a população encontrasse abrigo rapidamente. Do centro de mergulho, só restou o esqueleto.

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Já em Banda Aceh, o cenário era dantesco. Os barcos de pescadores que devolviam os turistas ao continente mal conseguiam atracar, tamanha era a quantidade de escombros. Quando finalmente tocaram terra firme, os sobreviventes de Pulau Weh caminharam durante horas e horas entre milhares de corpos. Bairros inteiros haviam desaparecido.

Os números são devastadores. No total, 60 mil habitantes de Banda Aceh morreram, um quinto da população. Na província de Aceh, o total sobe para 166 mil pessoas (mais da metade dos 266 mil mortos pelo Tsunami, que atingiu treze países).

Quase dez anos depois, a cidade mais próxima ao epicentro do terremoto de 9.15 que extrapolou a escala Richter (que até então ia “só” até 9) causando o tsunami está novamente em pé. A superlativa dimensão da tragédia gerou comoção internacional. E as ONGS que fincaram pé ali, somando esforços com a população local, foram capazes de aplicar os bilhões arrecadados de maneira organizada e produtiva.

A reconstrução de Banda Aceh é considerada um modelo. E isso se nota ao passear por suas ruas limpas, ladeadas de casas casas novas, erguidas a certa distância do mar. O navio de 2600 toneladas arrastado por vários quilômetros ao interior da cidade (uma das imagens mais chocantes que girou o mundo na época) é hoje uma atração turística, enquanto suas grandes sepulturas coletivas são locais de peregrinação — as famílias não sabem ao certo onde estão os seus mortos, muitos deles não identificados, e elegem uma por proximidade geográfica para render as suas homenagens. Banda Aceh também aproveitou o desastre para solucionar as suas questões independentistas com o governo indonésio (que a tornavam território não recomendável aos turistas até o início da década passada).

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Sem esquecer o inesquecível – e sempre pendente dos tremores constante da Terra naquela região – a região de Aceh é hoje um destino em ascensão, por suas praias boas para o surfe, montanhas forradas de cafezais, lagos, tribos, florestas habitadas por orangotangos e, principalmente, a ilha de Pulau Weh, um pico de mergulho de reputação internacional, e a sua gente receptiva e amabilíssima. Tudo isso com a grande vantagem de ser um lugar muito mais fácil para viajar do que a grande maioria dos destinos off the beaten track do país. Os barcos são pontuais (e sólidos), o porto é novo e organizado, o aeroporto internacional é impecável e os taxistas são ponta firme. Grau de dificuldade zero, em plena Indonésia profunda.

Lembre-se de Aceh na sua próxima viagem.

A vendedora de comidinhas Mama Donut, em Pulau Weh: a doçura da população vale a viagem

A linda praia de Gapang, um dos cenários do tsunami de 2004

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